Os detalhes foram dados pelo capitão Magno Almeida de Siqueira e pelo soldado da patrulha rural de Rosário do Sul, Santo André Freitas da Silva, durante a audiência, na tarde de segunda-feira (15), presidida pela juíza Viviane de Freitas Pereira. Os dois PMs estavam no barco que encontrou e retirou o corpo do jovem da água. O capitão e o soldado contaram que do meio para o final da tarde de 19 de agosto, estavam fazendo buscas de barco dentro da barragem com bastante dificuldade devido à vegetação aquática em grande quantidade no local. Eles contaram que perceberam um volume estranho na água em meio à vegetação e que se aproximaram do local.

Além do capitão e do soldado, pelo menos outros dois policiais também estavam na embarcação. Eles contam que usaram uma ferramenta que tem o nome técnico de poita, que é uma espécie de âncora. A poita tem uma esfera de ferro pesada com um gancho na ponta presa por uma corda.
– Nós vimos aquele volume que estava um pouco mais alto que a vegetação normal e atiramos (a poita) duas vezes. Na primeira, acertou no volume, mas não deu para ver nada. Na segunda vez que atiramos, se mexeu e vimos a orelha dele e identificamos que era o corpo dele. Daí chegamos mais perto e trabalhamos para tirar da água. Ele estava em pé. Era como se ele estivesse caminhando e caído dentro da água – disse Siqueira.
Santo da Silva relatou praticamente a mesma coisa e destacou a dificuldade de acesso ao local e de trabalho nas buscas. O soldado deu informações mais técnicas sobre como foram feitas as buscas, pois trabalha na patrulha rural e tem treinamento especializado.
– Quando encontramos o corpo, ele estava em pé e com bastante vegetação em volta. Isso dificultou bastante a localização e o trabalho de retirada da água. Era como se estivesse preso nos águapé – disse.

Outro depoimento que trouxe novidades foi da soldado Lisandra Gonçalves Dorneles que trabalhava no atendimento do telefone 190 na noite do desaparecimento do jovem. Ela era a responsável por atender aos chamados da população e enviar as viaturas para atenderem as ocorrências.
Foi ela quem recebeu a ligação de Paula Lima da Silva, moradora da casa onde Gabriel foi abordado em frente e que despachou os policiais para fazerem a abordagem. A juíza Viviane de Freitas Pereira, fez alguns questionamentos, um deles foi sobre o porquê da ocorrência da abordagem de Gabriel não ter sido registrada no sistema da polícia.
Segundo a policial, o sistema tem problemas e apresenta instabilidade dificultando o registro das ocorrências.
– Eu recebi o chamado e despachei a viatura. Não consegui colocar no sistema porque a internet estava ruim e o sistema estava instável naquele momento. Como não consegui dar a entrada, não tem como concluir. Eles, os policiais (réus), fizeram um Boletim de Atendimento (BA) da ocorrência – explicou a soldado.
Polícia Civil
Além de contar sobre o trabalho das buscas, o capitão Magno Siqueira e o soldado Jorge Nicael Oliveira Lopes fizeram denúncias sobre o trabalho da Polícia Civil. Eles falaram sobre o envolvimento de um policial civil com um criminoso e que ele seria dono de armas que foram apreendidas em uma operação da Brigada Militar. Além disso, afirmaram que o policial teria dito que faria de tudo para prejudicar o trabalho da BM.
– Ele não gosta da Brigada. Uma vez falou que faria de tudo para nos prejudicar – disseram os PMs na Justiça Militar.
O delegado José Bastos, da Polícia Civil de São Gabriel, diz que não há o que comentar sobre a denúncia dos policiais militares.
– Isso é uma coisa que não tem pertinência. Uma coisa fora do contexto. Se tem que fazer uma denúncia, tem que fazer para a Corregedoria ou para nós investigarmos – afirma Bastos.
Já o policial civil citado nos depoimentos dos brigadianos disse com exclusividade à reportagem que não fez nada demais, apenas o seu trabalho nas investigações. Ele negou ser dono das supostas armas apreendidas.
– Não posso ficar quieto e deixar falarem besteira. Sou comissário de polícia, talvez o que tenha chegado em final de carreira mais rápido no Estado. Todas as promoções foram por merecimento e nenhuma por antiguidade. Quanto às denúncias, nenhuma das armas apreendidas eram minhas – afirma o comissário, que preferiu não ser identificado.
Essa foi a terceira audiência do caso Gabriel. Os próximos depoimentos estão marcados para acontecerem nos dias 30 e 31 de janeiro, em São Gabriel, e 15 de fevereiro, em Santa Maria. Os policiais civis citados pelos policiais militares devem ser intimados para prestar depoimento.
Justiça
Para o pai de Gabriel, Anderson Cavalheiro, não importa quanto tempo vai demorar, mas o desejo é que justiça seja feita.
– Eu não consigo descrever o sentimento que a gente tem. Dá raiva, dá tudo, porque muitas coisas ali não condizem com o que foi relatado. Dizer que meu filho caminhou sobre as águas me doeu muito. Bola para a frente, que ainda tem mais coisas aí. Não tenho muito o que dizer. Está complicado – desabafou, emocionado.
A irmã Soila Marques, 27 anos, afirma que não vai descansar enquanto os policiais militares que abordaram Gabriel não forem expulsos da Brigada Militar, julgados e condenados:
– A gente quer justiça e eu sei que vai ser feita. A gente não vai se calar até eles irem para a prisão comum.
Os soldados Cleber Renato Ramos de Lima e Raul Veras Pedroso e o sargento Arleu Júnior Cardoso Jacbosen são réus na Justiça Militar pelos crimes de ocultação de cadáver e falsidade ideológica.
Um inquérito que investiga a morte do jovem corre na Justiça Estadual . Os três negam a morte do jovem Gabriel.