Caso Gabriel

Encontrado em pé, corpo de Gabriel estava submerso e preso à vegetação de açude, segundo depoimento de PMs


Três dos cinco policiais militares que prestaram depoimento na terceira audiência da Justiça Militar Estadual que investiga o desaparecimento do jovem Gabriel Marques Cavalheiro, 18 anos, trouxeram a público pelo menos duas novidades sobre o caso. Uma delas foi sobre o momento e como o corpo do jovem foi encontrado. Outra veio de uma soldado que trabalhava no telefone 190 e informou porque a ocorrência da abordagem do jovem não foi registrada no sistema da polícia. Gabriel desapareceu na noite de 12 de agosto, após ser abordado por três policiais militares no Bairro Independência. O corpo foi encontrado uma semana depois, com marcas de agressão, dentro de um açude na localidade de Lava Pé.

Os detalhes foram dados pelo capitão Magno Almeida de Siqueira e pelo soldado da patrulha rural de Rosário do Sul, Santo André Freitas da Silva, durante a audiência, na tarde de segunda-feira (15), presidida pela juíza Viviane de Freitas Pereira. Os dois PMs estavam no barco que encontrou e retirou o corpo do jovem da água. O capitão e o soldado contaram que do meio para o final da tarde de 19 de agosto, estavam fazendo buscas de barco dentro da barragem com bastante dificuldade devido à vegetação aquática em grande quantidade no local. Eles contaram que perceberam um volume estranho na água em meio à vegetação e que se aproximaram do local.

Policiais militares que participaram das buscas relataram dificuldade por conta da vegetação no açude na localidade de Lava Pé. Foto Eduardo Ramos (Diário)

Além do capitão e do soldado, pelo menos outros dois policiais também estavam na embarcação. Eles contam que usaram uma ferramenta que tem o nome técnico de poita, que é uma espécie de âncora. A poita tem uma esfera de ferro pesada com um gancho na ponta presa por uma corda.

– Nós vimos aquele volume que estava um pouco mais alto que a vegetação normal e atiramos (a poita) duas vezes. Na primeira, acertou no volume, mas não deu para ver nada. Na segunda vez que atiramos, se mexeu e vimos a orelha dele e identificamos que era o corpo dele. Daí chegamos mais perto e trabalhamos para tirar da água. Ele estava em pé. Era como se ele estivesse caminhando e caído dentro da água – disse Siqueira.

Santo da Silva relatou praticamente a mesma coisa e destacou a dificuldade de acesso ao local e de trabalho nas buscas. O soldado deu informações mais técnicas sobre como foram feitas as buscas, pois trabalha na patrulha rural e tem treinamento especializado.

– Quando encontramos o corpo, ele estava em pé e com bastante vegetação em volta. Isso dificultou bastante a localização e o trabalho de retirada da água. Era como se estivesse preso nos águapé – disse.

Corpo de Gabriel foi encontrado no dia 19 de agosto, uma semana após seu desaparecimento. Foto: Lorenzo Franchi (Divulgação)

Outro depoimento que trouxe novidades foi da soldado Lisandra Gonçalves Dorneles que trabalhava no atendimento do telefone 190 na noite do desaparecimento do jovem. Ela era a responsável por atender aos chamados da população e enviar as viaturas para atenderem as ocorrências.

Foi ela quem recebeu a ligação de Paula Lima da Silva, moradora da casa onde Gabriel foi abordado em frente e que despachou os policiais para fazerem a abordagem. A juíza Viviane de Freitas Pereira, fez alguns questionamentos, um deles foi sobre o porquê da ocorrência da abordagem de Gabriel não ter sido registrada no sistema da polícia.

Segundo a policial, o sistema tem problemas e apresenta instabilidade dificultando o registro das ocorrências.

– Eu recebi o chamado e despachei a viatura. Não consegui colocar no sistema porque a internet estava ruim e o sistema estava instável naquele momento. Como não consegui dar a entrada, não tem como concluir. Eles, os policiais (réus), fizeram um Boletim de Atendimento (BA) da ocorrência – explicou a soldado.

Polícia Civil

Além de contar sobre o trabalho das buscas, o capitão Magno Siqueira e o soldado Jorge Nicael Oliveira Lopes fizeram denúncias sobre o trabalho da Polícia Civil. Eles falaram sobre o envolvimento de um policial civil com um criminoso e que ele seria dono de armas que foram apreendidas em uma operação da Brigada Militar. Além disso, afirmaram que o policial teria dito que faria de tudo para prejudicar o trabalho da BM.

– Ele não gosta da Brigada. Uma vez falou que faria de tudo para nos prejudicar – disseram os PMs na Justiça Militar.

O delegado José Bastos, da Polícia Civil de São Gabriel, diz que não há o que comentar sobre a denúncia dos policiais militares.

– Isso é uma coisa que não tem pertinência. Uma coisa fora do contexto. Se tem que fazer uma denúncia, tem que fazer para a Corregedoria ou para nós investigarmos – afirma Bastos.

o policial civil citado nos depoimentos dos brigadianos disse com exclusividade à reportagem que não fez nada demais, apenas o seu trabalho nas investigações. Ele negou ser dono das supostas armas apreendidas.

– Não posso ficar quieto e deixar falarem besteira. Sou comissário de polícia, talvez o que tenha chegado em final de carreira mais rápido no Estado. Todas as promoções foram por merecimento e nenhuma por antiguidade. Quanto às denúncias, nenhuma das armas apreendidas eram minhas – afirma o comissário, que preferiu não ser identificado.

Essa foi a terceira audiência do caso Gabriel. Os próximos depoimentos estão marcados para acontecerem nos dias 30 e 31 de janeiro, em São Gabriel, e 15 de fevereiro, em Santa Maria. Os policiais civis citados pelos policiais militares devem ser intimados para prestar depoimento.

Justiça

Para o pai de Gabriel, Anderson Cavalheiro, não importa quanto tempo vai demorar, mas o desejo é que justiça seja feita.

– Eu não consigo descrever o sentimento que a gente tem. Dá raiva, dá tudo, porque muitas coisas ali não condizem com o que foi relatado. Dizer que meu filho caminhou sobre as águas me doeu muito. Bola para a frente, que ainda tem mais coisas aí. Não tenho muito o que dizer. Está complicado – desabafou, emocionado.

A irmã Soila Marques, 27 anos, afirma que não vai descansar enquanto os policiais militares que abordaram Gabriel não forem expulsos da Brigada Militar, julgados e condenados:

– A gente quer justiça e eu sei que vai ser feita. A gente não vai se calar até eles irem para a prisão comum.

Os soldados Cleber Renato Ramos de Lima e Raul Veras Pedroso e o sargento Arleu Júnior Cardoso Jacbosen são réus na Justiça Militar pelos crimes de ocultação de cadáver e falsidade ideológica

Um inquérito que investiga a morte do jovem corre na Justiça Estadual . Os três negam a morte do jovem Gabriel.

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Maurício Barbosa

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