crônica

Educar: navegar ou boiar

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Eu tinha três anos quando iniciei na escola. Maternal é como era chamada, na época, a primeira etapa do Jardim de Infância. E não fui uma plantinha fácil para a minha querida jardineira: a "tia" Julieta. No início, eu me recusava a estar ali. Era uma recusa não-dita, mas mostrada. Eu ficava de lado e não participava das atividades. Um registro fotográfico do baú mostra uma emburradinha agarrada em uma de suas bonecas preferidas num canto da sala, enquanto todo o grupo se divertia na rodinha.

Sim, usava-se chamar a professora de crianças de "tia". Depois é que se adotou a consciência - abençoada pelo profissionalismo - de não misturar estações. Tia é a irmã da mãe ou do pai. Está no âmbito da parentalidade. É aquela que faz parte do staff familiar e, por vezes, assume a titularidade como adjunta dos pais. Professora é a profissional que tem por responsabilidade conduzir o processo educacional naquela etapa das vidinhas. E que responsabilidade!

Aos poucos, com habilidade e carinho, a Julietinha me conquistou. Cativou mente e coração. Para sempre. As falas do vô, chateando a mãe com cobranças do tipo "essas gurias vão enjoar e não vão mais querer saber de escola", não eram profecias. Tanto eu como minhas irmãs temos imenso apreço por ler, estudar, apreender. A escola e a educação, em qualquer etapa da vida, são inquestionáveis para nós.

As dúvidas começaram a aparecer quando o papel de aprendiz - que pretendo manter comigo ao longo da vida - precisou incorporar o de educadora. Inúmeros questionamentos brotaram tão logo me vi à frente de uma sala de aula. Encontrar caminhos de estar próxima, de compreender necessidades e expectativas, de estabelecer conexões e pontes tornaram-se as principais metas.

E a complexidade aumentou quando um gurizinho entrou em cena. Eis que as estações que sinalizei logo acima, no terceiro parágrafo, já não se separam mais. Não é "tia", não é professora, é mãe. E o processo em questão precisa dar conta do todo, da integridade física, mental, emocional e social. Descobrir bons parâmetros para educar e guiar um desenvolvimento saudável é tarefa inconclusa e constantemente renovada. Em cada idade, surge um novo desafio. E a gente tenta acertar. E acerta, às vezes. Mas erra, em outras tantas. É missão hercúlea.

Em uma das tantas buscas, encontrei a analogia que me pareceu sintetizar bem a situação. Com o foco na questão da tecnologia e excessivo uso de recursos eletrônicos pelas crianças, foi lançada a pergunta: "seu filho navega ou boia na internet?". Navegar pressupõe consciência do destino, ter ciência do uso dos instrumentos que orientam a embarcação. Boiar é manter-se à tona, apenas salvar-se, muitas vezes.

É claro que, de imediato, trago o questionamento para mim. Navego ou boio na condução do meu filho? Sou bússola ou âncora? - é a indagação mais-lenha-na-fogueira que me faz a especialista que propõe alternativas para lidar com o momento de mar totalmente agitado pelo turbilhão pandemia. Como ensinar minha criança a navegar, a assumir o timão da sua vida?

Tal qual os navegadores de outrora, mantendo a caravela no mar confiante nas grandes descobertas que estarão no horizonte. Falta um mapa certeiro, mas sobra afeto e disposição para corrigir a rota tantas vezes quanto for preciso. "Navegar é preciso". Viver, amar e educar também.

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