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PLURAL: os textos de Giorgio Forgiarini e Rogério Koff

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Judiciário, credibilidade e capital moral
Giorgio Forgiarini
Advogado e professor universitário

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Certa feita, o deputado Eduardo Bolsonaro disse que bastaria um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal Federal. Esse deputado teria razão, se o mundo se movesse por sua lógica,  a da força bruta e burra. Na concepção do deputado, os idosos que compõem a Suprema Corte seriam facilmente constrangidos por poucos jovens armados. Porém, existe algo que está fora da compreensão do deputado e que impede que despautérios como esse ocorram: a força moral das instituições de Estado. Instituições de Estado existem e se mantém porque cidadãos nelas depositam capital moral. É o que também podemos chamar de "credibilidade". E o Judiciário possui significativo capital moral, ou seja, goza, sim, de credibilidade. Prova disso é o fato de que todos os dias milhares de contendas são levadas a ele, por pessoas crentes na justeza de suas determinações.

Aceitamos ser julgados pelo Judiciário e acatamos suas decisões porque possui credibilidade o suficiente para que nos sintamos seguros quanto à sua imparcialidade e sabedoria. Todavia, esse capital moral vinha sendo posto em risco nos últimos anos, o que, em parte, explicaria até a ousadia retórica do filho do presidente. Uma das razões foi, sem dúvida a absurda e flagrante imparcialidade com que conduzida a tal "Operação Lava Jato", a qual contou, inclusive, com a aquiescência de setores significativos da Magistratura e do Ministério Público.

DESATINOS E DESVARIOS

Hoje, se sabe que o Ministério Público combinava com o Judiciário o andamento da operação. Sabe-se também que alas políticas solenemente ignoradas pelas investigações foram beneficiadas pelo seu desfecho. Hoje a Polícia Federal tem como provado que delações vazadas às vésperas da eleição de 2018 eram falsas. Sabe-se também que Deltan Dallagnol usava sua condição de celebridade para cobrar fortunas por palestras Brasil afora. São reiterados os depoimentos desapontados em relação à Lava Jato, inclusive de profissionais antes vinculados à operação. Políticos de todas as matizes, inclusive bolsonaristas, hoje concordam com a parcialidade de Sérgio Moro. Uma pesquisa realizada entre 283 professores de Direito constatou que 97% consideram que Moro não agiu com "a imparcialidade exigida para um julgamento justo".

A LATA DE LIXO DA HISTÓRIA

Sérgio Moro já foi celebridade nacional. Hoje, ninguém se importa com o que faz da vida. Deltan Dallagnol, menos pretensioso, mantém a vitaliciedade de seu  cargo no MPF, no qual foi investido por ordem judicial estranhamente contrária à jurisprudência dominante, mas está definitivamente fora dos noticiários nacionais. Ao que parece, a Lava Jato caminha a passos largos para seu destino inevitável: A lata de lixo da história. Era certo que isso ocorreria, só não se sabia quando, nem como. Vá em paz, Lava Jato, mas vá pra longe. A higidez das instituições exige isso!

O elefante e seu advogado
Rogério Koff
Professor universitário

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Por que, em geral, as discussões sobre política são  ideológicas, emotivas, polarizadas, extremas e tão pouco racionais? Um dos convidados para o ciclo de palestras Fronteiras do Pensamento deste ano pode ter algumas respostas. Em seu livro The Righteous Mind (A Mente Moralista), o psicólogo norte-americano Jonathan Haidt analisa por que temos tanta dificuldade de chegar a consensos quando os temas são política, moralidade ou religião.

O modelo de Haidt é chamado de social-intuicionista.  Sua tese é de que a origem dos juízos morais ocorre primeiramente com base em intuições. O processo de racionalização surge depois, para justificar opiniões já formadas a partir de emoções originais. Ainda que estas racionalizações morais falhem ou sejam desafiadas por outros interlocutores, é raro ver pessoas mudarem suas convicções. "Intuições vêm primeiro, o raciocínio estratégico vem depois", escreve Haidt. 

A MENTE MORALISTA

Para explicar o funcionamento da mente moralista,  Haidt criou uma metáfora: um condutor guiando um enorme elefante. O condutor representa nossa consciência e razão. É a parte da mente que está desperta e é capaz de realizar cálculos estratégicos. O elefante representa as emoções e intuições mais profundas; aqueles 99% de processos mentais que não são conscientes e que governam a maior parte das crenças e comportamentos humanos. O condutor é um produto da evolução e surgiu no momento em que os seres humanos desenvolveram a linguagem abstrata. Ele realiza um trabalho útil: é uma espécie de advogado em tempo integral do elefante. 

A imagem elaborada por Haidt está em consonância com a tradição empirista do escocês David Hume  (1711-1776), para quem a razão era e só poderia ser uma escrava das paixões. O condutor não foi colocado lá para perseguir a verdade, mas para servir e justificar os movimentos do elefante. 

O ELEFANTE É QUEM MANDA

O livro de Jonathan Haidt mostra que os seres humanos são racionalizadores morais. Eles "se sentem" de certa  maneira em relação a uma questão e em seguida criam uma justificativa aparentemente racional para este sentimento. Tenho visto intelectuais e professores universitários declarando que Lula é inocente e que a operação Lava Jato foi uma fraude. Os mesmos não admitem que o PT e seus aliados montaram a maior rede de corrupção já vista no planeta. São pessoas supostamente cultas (até prova em contrário), com formação acadêmica e título de doutor.

Alguns chamam o presidente Bolsonaro de genocida, quando até meus cachorros de estimação sabem que o STF delegou a Estados e municípios autonomia para combater a pandemia. Por qual razão negam evidências e parecem raciocinar com o fígado? Provavelmente estão advogando para seus elefantes, lutando desesperadamente para defender as crenças indefensáveis de seus paquidermes.

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