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Ferida aberta

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Estava na praia e, conversando com uma amiga, ela se lembrou dos hematomas em meus braços deixados pela tragédia da Kiss, que no próximo dia 27 de janeiro completa oito anos ainda à espera de justiça. Como enfermeira da Brigada Militar, fiz parte da primeira equipe que trabalhou no incêndio que deixou 242 mortos e centenas de feridos, num dos maiores desastres da história gaúcha. Na ocasião, eu disse que essas marcas simbolizavam a dor dos pais. Acredito que muitos ficaram com os braços assim; pessoas que, como eu, trabalharam naqueles dias de pesadelo.

 Os pais, familiares, amigos das vítimas, ao receberem as notícias do que estava acontecendo, me sacudiam frente ao que ouviam e viam, como se tentando em vão acordar de um pesadelo. O nome dos hematomas nos meus braços é dor, lembrei.

Tem feridas que nunca vão cicatrizar. Sim, tem dores que não curam, apenas nos afastamos delas pela necessidade de seguir, de ir em frente, uma situação imposta pelas coisas da vida ou por um só sentimento: o amor. Talvez esta seja a melhor forma de descrever o luto dos pais que perdem filhos - ferida que nunca cura. Fica ali, quieta, em um silêncio eloquente. Vem aí mais um 27 de janeiro, com suas tristes lembranças. E um medo enorme de que não tenhamos aprendido nada, medo do esquecimento e de nada ter mudado. Isso só aumenta nossa dor.

Tenho uma grande empatia pelos pais e pelos sobreviventes em especial, e vejo a enorme necessidade de seguir em frente, mas não pode ter sido em vão. O que realmente mudou se ainda existem muitos espaços de difícil saída? Preocupamo-nos realmente com a segurança dos espaços? O que mudou realmente na legislação, o que melhorou, o que nos comprometeu enquanto cidadãos (procuramos participar mais e saber o que os nossos legislativos fazem as leis)? O que nós fizemos para mudar, quais as transformações propostas pelos nossos legisladores?

 O bom e sempre velho Brasil, de memória curta, não aprende, nem com os erros, nem com a dor. Quantas Kiss, Brumadinho...? Somos lentos, descomprometidos, egotistas, fruto da nossa má e velha política do politicamente correto (não vale a pena se incomodar, se expor).

E vamos calando, ficando quietos e, de certa forma, amargos e tristes, com pouca esperança na mudança. Não pode ter sido em vão. Algumas mudanças foram feitas, mas não todas as necessárias, então vamos lutar e implementá-las. Mudanças na legislação e no controle de processos de fiscalização. Não pode ter sido tudo em vão, não, não foi tudo em vão.


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