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PLURAL: os textos de Juliana Petermann e Eni Celidonio

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Publicidade, marcas e racismo

Juliana Petermann 
Professora universitária


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Nas últimas semanas, acompanhamos protestos contra o racismo nos EUA, desencadeados pela morte de George Floyd. No Brasil, as manifestações tiveram o acréscimo da dor e do luto pela morte de Miguel Otávio Santana da Silva, 5 anos, que morreu após cair do 9º andar de um prédio. Os protestos reivindicaram, ainda, as mortes de João Pedro Matos Pinto, 14 anos, Ágatha Félix, 8 anos, Kauê Ribeiro, 12 anos, e Kauã Víctor Nunes Rozário, 11 anos, crianças negras mortas no Brasil nos últimos meses. Nas redes sociais, as manifestações contaram com as hashtags #blackouttuesday, #BlackLivesMatter e #VidasNegrasImportam.

O racismo e a desigualdade social, problemas estruturais que matam em nosso país, são, entre outras coisas, fruto de discursos presentes na mídia, incluindo os publicitários e das marcas, que sustentam estereótipos e preconceitos. Para explicar esta relação, convidei a Hallana Vitoria, publicitária, Pós-graduanda em Design Estratégico - Branding e criadora de conteúdo no perfil @hallanav, no Instagram.

1) Quando as marcas e a publicidade são racistas?

Hallana - Quando discriminam pessoas negras, inferiorizando e ridicularizando traços, comportamentos e costumes. Por exemplo, a marca Bombril, na última semana, relançou uma esponja com o nome de "Krespinha". Ao fazer isso, a marca não homenageia as mulheres negras, pelo contrário, auxilia na manutenção de um discurso preconceituoso que desvaloriza a beleza das mulheres negras, relacionando o cabelo crespo com um produto feito para limpar a sujeira.

2) Quando as marcas e a publicidade são antirracistas?

Hallana - Quando existe a preocupação e a ação para a inclusão das pessoas negras nas equipes, inclusive em cargos de liderança e de tomada de decisão. Como consequência, temos o aumento da presença da população negra em peças publicitárias. Também, quando há implementação de cultura organizacional antirracista: o ID-BR - Instituto Identidades Brasileiras, por exemplo, atua na transformação das empresas por meio da inclusão racial igualitária.

3) Como o discurso das marcas e da publicidade pode melhorar?

Hallana - Buscando por referências que dialoguem com as pessoas negras; valorizando os corpos negros em produtos e anúncios; primando por igualdade racial nos castings e por programas de diversidade e inclusão de pessoas negras nas empresas, especialmente nos espaços de decisão. Além disso, cada pessoa deve vigiar suas ações afim de não reproduzir discursos racistas.


Quer que desenhe?

Eni Celidonio 
Professora universitária


style="width: 25%; float: right;" data-filename="retriever">Num sábado de maio de 1974, assisti a uma peça no Teatro Princesa Isabel: A teoria na prática é outra. Não tinha Internet, nem TV por assinatura, essas coisas. Ia-se muito ao teatro. Pois bem, na peça, Débora Duarte pegava no pé de Pedro Paulo Rangel - não lembro o nome das personagens, que aí já era exigir muito da minha memória - porque ele era puritano, não falava absolutamente nenhum palavrão. Lá pelas tantas, de repente, ele solta um "cocô!" e as outras personagens, em coro, começam a gritar: "Ele falou! Ele falou um meio palavrão!".

Gente... Na época, se não me engano, uns dois anos antes, em 1972, Rita Lee escreveu a canção Moleque Sacana. A letra dizia "moleque sacana, você é pequenininho/ mas já sabe transar", "Meu pai não tinha grana pra me dar/ mas através de um garotão da rua/ descolei uma viúva pra me sustentar". Conclusão: censurada, pois era contra a moral e os bons costumes.

Sim... Dona Censura não deixava passar nada. Chico Buarque, em Partido Alto, teve que trocar, entre outros termos, "titica" por "coisica", juro! Podem procurar que vocês acham. Como assim brasileiro nascer na barriga da miséria? Não mesmo! Troca isso por "batuqueiro"! Batuqueiro pode; brasileiro, não! E só por curiosidade: Chico compôs um rock. Sim, um rock, em homenagem a Amália Lucy, ou ao seu pai, General Ernesto Geisel, cujo refrão era: "você não gosta de mim, mas sua filha gosta"...

Lembro de Paulo Afonso Grisolli contando que, quando dirigiu uma peça nos anos 1970, havia um nu frontal e a censura logo mostrou sua cara: não podia, num teatro da família carioca, aparecerem pelos pubianos. Grisolli não teve dúvida: pediu que os atores fossem depilados. E ficou por isso mesmo.

Hoje, a dona Censura ficaria louca, sem saber onde procurar termos que sejam contra a moral e os bons costumes. Fala-se palavrão na TV, no rádio, na rua, na chuva e na fazenda. As músicas censuradas por conterem palavrões - tipo sacana, titica e quejandas - seriam cantigas de ninar se comparadas às letras das músicas de baile funk. Os tempos são outros. Está certo.... Eu não sou a pessoa mais qualificada para falar de palavrão porque, fala sério, não tem povo mais desbocado do que o carioca. Se ele não se lembra de um palavrão, inventa um. Mas não é o palavrão que está em jogo aqui, é o momento em que ele é falado. Gente, quem nunca deu uma topada e xingou até a quinta geração do pedregulho?

Não é pelos vinte centavos

É isso que eu queria deixar claro: o problema não é o quê, é o quando. Eu não consigo dar uma aula recheada de palavrões gratuitos, embora eu trabalhe com Literatura e não tenha como não encontrar unzinho que seja em Rubem Fonseca, por exemplo. Alguém imagina assistir a uma audiência, onde advogados e promotores fiquem se ofendendo através de palavrões? Ou uma missa? Gente, não é que a gente seja incapaz de xingar, não é que a gente seja pudico ou santo, é mais ou menos o que se diz por aí: não é pelos vinte centavos... Se for necessário, eu desenho.

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