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Esperança

Quando ela nasceu, havia uma lua branca grávida de luz enfeitando o céu e, na terra, brisas de primavera que predispunham à paz e à mansidão. Chamaram-na, em homenagem à vida que se que se afirmava com seu nascimento, Esperança.

Não foi, nem tem sido fácil sua caminhada terrena. Vezes sem conta ela bate de frente com paredes invisíveis que parecem se mover, com muros que se alargam, com pontes que ruem tão logo afirma seu passo para a travessia. Por isso, às vezes, ela claudica e, para prosseguir, busca arrimo na própria história, feita de avanços e, apenas aqui e ali, de estratégicos recuos.

Ao longo do tempo, muitos foram aqueles que pretenderam dela se assenhorear com exclusividade; muitos foram os que se declararam seus tutores; muitos, os que tentaram submetê-la à discricionariedade que escapa aos controles das leis da vida. Mas, jamais alguém obteve êxito nessas empreitadas. Ela não se deixa escravizar nem dominar pela força. E, quando parece vencida, se regenera com o primeiro raio de sol de uma manhã comum, com o sorriso encabulado de um aldeão dos confins da terra ou com o passo pequeno e vacilante de uma criança, que recém se equilibra sobre as próprias pernas.

Quando um tirano qualquer pensa tê-la apreendido, para usurpá-la do íntimo do seu povo, lá se vai ela cavalgando o vento, disfarçada no canto dos passarinhos ou mergulhada nas águas mansas do regato que desce da montanha alisando seixos pelo caminho. Às vezes, seu voo parece fugaz com o da borboleta, mas, logo adiante, ela renasce flor do campo no meio dos espinheiros. E quando caem as brumas da noite, ela se faz vaga-lume, estrela-guia, farol.

Indomável, às vezes, se deixa domesticar, aninhada nos corações mais puros. Dócil, às vezes, se transforma em fera vigilante para acicatar as almas que se acovardam. Indestrutível, se reparte infinitesimalmente para que possa estar junto de tantos quantos dela necessitem nas mais diversas latitudes. Volátil, às vezes, se condensa no canto único de um povo. Nenhuma crença lhe é estranha e na sua voz cabem as vozes de todas as gentes e as harmonias de todas as melodias. Sábia, ela sabe que não basta vencer o medo, porque este também se reconstrói e se alimenta das falácias, dos discursos fáceis, do populismo demagógico, da visão estreita de quem só enxerga o próprio umbigo e de quem se descobre rei e não percebe que, como na fábula, é rei nu.

Assim é a Esperança, essa dama nascida no primórdio dos tempos, de aparência frágil, nervos de titânio e olhos de eternidade. Quando habita nossos corações, ela nos dá força para enfrentarmos os mandriões (de todos os matizes), os vendilhões (de todos os templos), os enganadores (de todos os tempos), os estelionatários (da ética) e as nossas próprias fraquezas e inconstâncias. É em nome dela, mesmo quando sinaliza em sentido contrário, que o poeta faz versos. E é em nome dela que o cronista se repete no jornal.

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