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OPINIÃO: Alteridade e empatia

Haverá um tempo - provavelmente ainda distante - em que poderemos sentar em torno de uma mesa para conversar sobre nossas diferenças sem risco de nos chamarmos, de parte a parte, de idiotas, imbecis, canalhas, petralhas, coxinhas, esquerdopatas ou de fascistas truculentos, pelo simples fato de discordarmos das diferentes visões de mundo que temos e dos caminhos que entendemos úteis e necessários à consecução de nosso ideário, político, econômico, filosófico, religioso, etc, etc.

Nesse dia, poderemos conversar com espíritos desarmados, como fazem amigos, que, em uma mesa de bar, falam de futebol, de poesia e de livros, de mulheres (de homens) e de filmes, ou debatem, com a veemência que não agride nem machuca, a história e os rumos da sociedade ou o futuro do país e do planeta.

Como muitos dos leitores, faço parte de grupos política e filosoficamente assimétricos que se reúnem para conversar sobre a vida, com a palavra irrigada por uma cerveja ou chope gelados, um tinto honesto e até mesmo, por incrível que possa parecer, por uma inocente e pudica água mineral. No meu caso, tem o grupo do futebol, a Turma da Quinta-feira, que, em seu núcleo primário, se reúne há mais de 20 anos e açambarca as mais  variadas  visões  de mundo. E tem, de outra parte, a Turma do Café, que surgiu há 17 anos, e tem, digamos  assim,  um  viés  mais intelectualizado.

Na Turma do Café, que  há  anos  se  reúne em bar e não mais em cafés, os temas são usualmente mais densos e potencialmente suscetíveis de maiores embates políticos. Mas, mesmo aqui, o futebol, às vezes, é vetor de acalorados (mas civilizados) debates. O fundamental é que a despeito de nossas eventuais diferenças na compreensão dos fenômenos políticos e sociológicos que orientaram e orientam a construção de nosso país e do mundo, nunca deixamos que o bom humor se aparte do grupo e interfira em nossa capacidade de dialogar.

Esta turma, de forma coletiva e normalmente cooperativada, publica, em média, um livro de boa qualidade literária por ano. E nessa contagem se contabilizam romances, livros de contos, de crônicas e de poesia. Este ano, na Feira do Livro, que em sua 46ª edição, tomará conta da Praça Saldanha Marinho a partir do próximo dia 26, lançaremos mais um livro (Baixada Melancólica - contos da Depressão Central), com a participação de oito dos integrantes do grupo.

Mas o propósito deste texto não é falar de nosso livro ou da Feira que se avizinha (dela falarei no próximo dia 30), mas sim da necessidade de que desenvolvamos minimamente nossa capacidade de relacionamento interpessoal e coletivo (precisamos praticar alteridade e empatia), sem abrir mão de nossas convicções e sendo capazes de, com filtros anímicos e retóricos necessários, dialogar com as diferenças que fazem de cada um de nós o ser especialíssimo que somos. A restauração dessa capacidade é que nos permitirá, em quaisquer circunstâncias, debater - como se debate em uma mesa de bar, libertos de marras ideológicas inamovíveis e com discernimento para saber que são as diferenças que fazem a vida menos enfadonha e mais instigante -, sobre a escolha dos melhores caminhos para a chegada ao nosso sempre adiado futuro.

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