Defesas dos quatro réus do caso Kiss criticam decisão de Toffoli e prometem contestar; entenda o que pode acontecer

Os advogados Jader MarquesMario Cipriani, Jean de Menezes e Tatiana Borsa, responsáveis pelas defesas dos quatro condenados pelo incêndio da boate Kiss, falaram à CDN, nesta terça-feira (3), sobre os desdobramentos do júri, que teve a anulação revertida na segunda (2) pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli. Pegos de surpresa com a decisão, eles dizem não entender a motivação para a decisão e a consequente prisão dos réus, já que as defesas teriam uma audiência marcada no gabinete do ministro na próxima semana para tratar os recursos apresentados pelo Ministério Público Estadual e pelo Ministério Público Federal (MPF).

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Em decisão monocrática (tomada por um único ministro), Toffoli atendeu aos pedidos MP-RS e do MPF em Recurso Extraordinário e manteve a decisão do júri. Com isso, as condenações de Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Luciano Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos, com penas entre 18 e 22 anos e meio de prisão, voltam a valer e já passaram a ser cumpridas. Já o Recurso Extraordinário ingressado pela defesa de Luciano e que solicitava a manutenção da anulação do júri, por sua vez, foi negado por Toffoli.

"Estando também preclusa tal questão, o seu reconhecimento pelo STJ e pelo TJRS, a implicar a anulação da sessão do júri, viola diretamente a soberania do júri", afirmou o ministro em um trecho da sua decisão. Agora, as defesas trabalham para ingressar com recurso no STF (Agravo Regimental) pedindo que a decisão de Toffoli seja analisada pelos cinco integrantes da 2ª Turma, da qual o ministro é um dos membros.  


Veja, abaixo, o que diz cada uma:


Defesa de Mauro Hoffmann

O advogado Mario Cipriani, que representa Mauro Hoffmann, ex-sócio da boate e que foi o único que não foi preso na segunda-feira. O defensor explica que o principal motivo foi a demora do deslocamento do local onde mora até Porto Alegre. No entanto, segundo ele, Hoffman se apresentou à Justiça na Capital na madrugada de terça-feira.

– Ele chegou tarde (a Porto Alegre), eu tratei isso diretamente com o Ministério Público e comunicamos que a apresentação seria tão logo ele chegasse, e ele acabou chegando na madrugada. [...] o Mauro já está à disposição da Justiça. 

Quando questionado sobre os próximos passos, ele explica:

– Nós vamos recorrer da decisão do ministro através de um recurso chamado Agravo Regimental. Anteriormente, havia uma decisão colegiada de dois votos, dois desembargadores que votaram pela anulação do júri, depois mais quatro ministros do Superior Tribunal de Justiça votaram pela anulação do júri, sempre numa decisão colegiada, que é a essência dos tribunais. O ministro, que já tinha uma posição bastante contrária a todos os episódios relativos à boate Kiss contra as defesas, resolve de forma monocrática. E em razão disso, vamos fazer o recurso para juntar todos os ministros desta turma para um novo julgamento [...].

Cipriani alega, ainda, que a prisão dos réus seria inconstitucional.

– Se não bastasse isso, depois ter feito isso de forma monocrática, ele ainda restabeleceu uma prisão completamente inconstitucional, ainda do tempo do júri, decisão essa que tinha sido atacada por um habeas corpus que transitou em julgado em favor dos acusados. Havia sido suspensa por uma decisão do ministro Fux, decisão que ainda no decorrer daquele ano foi reconhecida como ilegal e impossível de ser aplicada em processos criminais por unanimidade, inclusive por voto do ministro Toffoli e do ministro Fux, e que agora restabelece uma prisão que não tinha mais, no nosso entender, base legal. Em razão disso, nós estamos providenciando novo recurso para devolver a liberdade, sem prejuízo do recurso que trata da anulação do júri lá em Brasília.


Defesa de Marcelo de Jesus dos Santos

Tatiana Borsa, advogada de Marcelo de Jesus dos Santos, vocalista da banda Gurizada Fandangueira, diz que o cliente estava trabalhando quando recebeu a notícia. Ele se apresentou ainda na segunda-feira e se encontra no Presídio Estadual São Vicente do Sul.  

— Ontem (segunda) mesmo foi impetrado um habeas corpus, vamos tomar as medidas cabíveis porque estamos tendo apoio de vários colegas juristas. Todo mundo viu esse absurdo que aconteceu, porque era desnecessária uma prisão da maneira que foi, ainda mais quando vai ser julgado este termo dia 11, no dia que seríamos aguardados e recebidos pelo gabinete do ministro Toffoli, que causa mais indignação ainda. Eu estava dentro da promotoria de Justiça fazendo uma oitiva de um cliente quando fomos surpreendidos com a mensagem “Marcelo foi preso". Quando fomos acessar o site do STF, onde estava o Recurso Extraordinário, não havia nenhuma notícia, não havia nenhuma movimentação processual. Então, essa defesa fala é que, independente da decisão, nós temos que ser comunicadas, assim como foi cumprido de imediato. De maneira nenhuma, os réus iriam deixar de cumprir qualquer ordem judicial, independente se fosse do nosso agrado ou não, como realmente aconteceu. Eles não são pessoas perigosas que tem que fazer tudo na surdina.

Quando questionada sobre uma possível reviravolta da decisão, ela responde:

– Sinceramente, do jeito que está, não (haver reversão). Vamos atrás, vamos agora provocar o Supremo para que sejamos ouvidos pelo Pleno da Corte e vamos trabalhar. Só que nós não vamos trabalhar na surdina como Ministério Público fez, como essa decisão ocorreu. A gente sempre é transparente porque a gente sabe da inocência de nossos clientes, a gente sabe dessa injustiça que eles estão sofrendo e é algo que a gente precisa digerir.


Defesa de Luciano Bonilha Leão 

O advogado Jean Severo, que defende Luciano Bonilha Leão, auxiliar da banda Gurizada Fandangueira, diz que foi uma prisão "totalmente inadequada", já que os réus não oferecem perigo para ninguém. Luciano vive em Santa Maria e está preso. Até esta sexta-feira (6), ele pretende entrar com um recurso para análise do STF.

– O processo não terminou, e eu digo mais, está muito longe de terminar, né? [...] Nós vamos agravar para isso ser avaliado pela turma (STF). Vamos querer saber o que os outros ministros pensam, afinal de contas, não tem matéria constitucional a ser trabalhada nesse processo. O júri estava marcado para o dia 26 de fevereiro, e de uma forma totalmente estranha, foi suspenso o julgamento. Agora, nos resta saber o que os outros ministros pensam, por que essa decisão vem de um "Frankenstein" jurídico [...] Não é uma decisão para fazer justiça.

Quando questionado sobre a liberdade dos réus, ele responde:

— Eu acredito, porque a decisão é muito rasa, não tem profundidade, não tem musculatura jurídica. Então, eu creio que os outros ministros, analisando melhor essa situação, esse agravo, os réus vão ser colocados em liberdade e nós teremos um outro júri. Eu não sei por que o Ministério Público quis fugir do júri, mas tudo certo, a gente sabe o porquê. O Luciano ia ser absolvido e todo mundo sabe.


Defesa de Elissandro Spohr, o Kiko

A defesa de Elissandro Spohr, o Kiko, representada por Jader Marques, também pontua a surpresa quanto à decisão e questiona a forma de cumprimento da mesma, que não seria de competência do STF, mas, sim, do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

— Estamos trabalhando juridicamente na verificação, não só do encaminhamento jurídico, que é tranquilo, mas também na argumentação, a partir da própria fundamentação usada pelo ministro. Ele usa um precedente do século passado para embasar essa decisão. Cabe um recurso de julgar o Agravo Regimental pela decisão monocrática do ministro lá no âmbito do STF.

Próximos passos

  • As defesas devem recorrer da decisão do ministro Dias Toffoli por meio de um recurso chamado Agravo Regimental. Este recurso é cabível contra decisões monocráticas (ou seja, feitas por apenas uma pessoa) em tribunal.
  • Por meio deste recurso, a expectativa das defesas é que os 5 ministros da 2ª Turma do STF, da qual Toffoli faz parte, analisem  a decisão tomada em Recurso Extraordinária e de forma monocrática
  • Enquanto isso, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), paralelamente, pode analisar os demais pontos contestados pelas defesas no recurso de apelação, no caso apreciar o mérito sobe, por exemplo, redução de pena, e se a decisão é conforme a prova do processo ou não
  • Como o TJ anulou o júri, em agosto de 2022, com base em nulidades, o restante dos questionamentos acabou prejudicado à época. Agora, com a validade do julgamento, o TJ poderá retomar essa análise 

Relembre

  • O júri realizado em dezembro de 2021, que durou 10 dias, condenou os quatro réus pelo incêndio;
  • Em agosto de 2022, o Tribunal de Justiça (TJ) anulou o julgamento, alegando irregularidades como a escolha dos jurados, reunião reservada entre o juiz presidente do júri e os jurados, sem a participação das defesas ou do Ministério Público e ilegalidades nos quesitos elaborados;
  • Em setembro de 2023, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a anulação do júri e o caso foi para o STF;
  • Já em maio de 2024, a Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ao Supremo Tribunal Federal o restabelecimento do resultado do júri e consequente prisão dos réus que, até então, aguardavam a definição em liberdade;


Os réus

Mauro Hoffmann
Ex-sócio da Kiss

  • Pena: condenado a 19 anos e seis meses de prisão
  • Situação: preso em Canoas

Elissandro Sphor
Ex-sócio da Kiss

  • Pena: condenado a 22 anos e seis meses de prisão
  • Situação: preso em Canoas

Marcelo de Jesus dos Santos
Vocalista da banda Gurizada Fandangueira 

  • Pena: condenado a 18 anos de prisão
  • Situação: Preso em São Vicente do Sul

Luciano Bonilha Leão
Auxiliar da banda Gurizada Fandangueira

  • Pena: condenado a 18 anos de prisão
  • Situação: Preso em Santa Maria


*Colaboraram Jaqueline Silveira e Pablo Iglesias 


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