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Volta às aulas exige generosidade e projeto comum

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Uma pesquisa realizada pela prefeitura de SP (6 a 10 de agosto) mostrou que 64% das crianças testadas positivas para o coronavírus mostraram-se assintomáticas e 16% já tiveram contato com o vírus. Foram testadas 6 mil crianças entre 4 e 14 anos de idade. Apenas esses dados da pesquisa já dão uma ideia do risco que pode significar um retorno apressado às aulas. O retorno às aulas nas escolas da educação básica vai exigir, acima de tudo, por parte de toda a comunidade envolvida, a construção de um projeto comum.

Tomo como comunidade todos os profissionais envolvidos no processo educativo, bem como os grupos familiares dos quais as crianças e adolescentes fazem parte, passando, por exemplo, pelos aparatos de transporte e de deslocamento dos estudantes. Ou seja, todos os elos de contatos que se fazem presentes nessa complexa rede que no mundo atual envolve o processo educativo escolar. Aqui começa, talvez, nossa primeira e maior dificuldade: a construção de um projeto comum.

Em nossa cultura de orientação patriarcal temos muita resistência - ou seria incompetência - em construirmos e desenvolvermos projetos comuns em todas as dimensões de nossas vidas. Somos analfabetos(as) em projetos comuns, solidários e cooperativos e, por outro lado, especialistas em projetos individuais e competitivos. Enquanto os projetos comuns e colaborativos se orientam pela promoção da solidariedade e da generosidade, os projetos competitivos se caracterizam pela busca de soluções individuais, competitivas e, consequentemente, de negação do outro. Isso é um fato, e, como dizia o educador Antonio Cândido (1918-2017): contra fato não há argumento.

Um primeiro ponto que precisa ser considerado na volta às aulas é que esse retorno precisa ser unificado entre as escolas públicas e as escolas privadas. Afinal, todas as crianças são crianças. Tão simples isso que chega a parecer redundante. Mas não é. Vamos a um exemplo. É muito comum nos preocuparmos com as crianças de nossas relações familiares, de amizades, etc. Tanto isso é verdade que nos chocamos, sofremos, nos solidarizamos quando alguma criança de nossas relações sofre alguma violência, passa por alguma doença ou, tristemente, vem a falecer. Não há nada de errado nisso. Errado é não nos chocarmos, não nos solidarizarmos, quando o sofrimento é de uma criança que não conheço, que não faz parte de meu círculo de relações. Por isso é preciso repetir: todas as crianças são crianças!

O momento adequado de voltar às aulas será uma decisão muito difícil para toda a comunidade envolvida. A maneira de diminuirmos essa dificuldade passa, em meu entendimento, pela busca, o quanto antes, da construção de um projeto comum de retorno. Um projeto que seja orientado, prioritariamente, pela cooperação, pela colaboração e pela generosidade. Ou isto acontece ou estaremos, mais uma vez, aumentando o grau de exclusão do já enorme contingente de crianças, de adolescentes, enfim, de cidadãos desse injusto país. Ou aprendemos a fazer o exercício de construção de um projeto comum para a educação brasileira ou, então, que aceitemos, que nos resignemos em ser uma das elites mais perversas, insensíveis e estúpidas do planeta.

Essa pandemia do novo coronavírus não tem nada que ver com nossa história de exclusão social. No entanto, ela poderá mostrar, como já vem mostrando, que tipo de sociedade construímos até aqui. Pode nos levar, também, a parar e refletir sobre o que queremos preservar e o que queremos mudar em nossa forma de ser e de estar nesse tão maltratado planeta e nesse tão injusto país chamado Brasil. Um país imenso territorialmente, com uma população de mais de 200 milhões de pessoas, mas refém de uma das elites mais insensíveis que se conhece no mundo. Tão insensível que não consegue entender que todas as crianças são crianças.

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