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Sobre velhas metáforas

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Domingo (escrevo na madrugada de segunda), por volta de 11h, minha janela foi invadida por estranha claridade. Quase acostumado às trevas e ao breu deste final de outono, assustei-me. Só então me toquei, a estranha luminosidade não provinha de uma astronave alienígena ou de um poderoso farol. Era apenas um débil raio do nosso velho e bom astro-rei. Bom, pelas razões que todos sabemos, e velho porque formado há 4,57 bilhões de anos. Não duvidem de mim, isto está na Wikipédia!

Já escrevi e disse, que, em aparente contradição, amo a noite e sou fissurado por luz. Quase como Goethe, de quem eu queria apenas 10% do talento, cuja última frase teria sido: "Licht, mehr licth" (Luz, mais luz). Por isso, falei em estar "quase acostumado" com as brumas da quase invernia. Acho que não me acostumaria a viver no gris permanente, que é como imagino devam ser o umbral dos espíritas e o purgatório dos católicos. Claro, nenhum dos dois é para sempre. Ambos, respeitadas as diferenças de, digamos, concepção filosófica, são apenas etapas, estágios a serem vividos antes de alçar-se voos para esferas mais luminosas. Ainda assim, a hipótese de viver mergulhado no breu me assusta.

Ainda bem que, à tarde, o dia se iluminou um pouco mais e havia anúncio de que teremos um pedaço de segunda-feira ensolarado. E, depois, chuva de novo! Céu cinzento e humores tisnados outra vez! Enquanto isso, há irmãozinhos nossos sendo expulsos da vida terrena pela incúria de quem deveria zelar pela sua saúde e segurança. É como se suas histórias fossem levadas pelas enxurradas, que destroem as pontes para o futuro. E barreiras vão caindo, e buracos brotando ferozes nas vidas de quem fica. Honestamente, não sei se isso difere muito do umbral e do purgatório, onde expiaremos nossas culpas, julgados pelas nossas próprias consciências.

Não deve ser, pois temos Brasília, o Palácio da Alvorada e os festivos risos presidenciais. Brasília, a ilha da fantasia, pelo menos em parte é feita de festa e luzes. De alegria e sorrisos. E, claro, de choro também, como pode perceber o espectador mais atento. Quem sabe, aqui, onde estamos, é o umbral, o purgatório, e lá, onde reside o Poder, esfera de luz, paraíso? Tudo em planos que não se superpõem e que se comunicam diretamente? Não, muito fácil e - gostemos ou não -tudo é Brasil. Mas, quem disse que o Brasil não é uma metáfora da vida nos vários planos?

Acho que o vinho que tomei não me fez bem, está tudo meio confuso. Ou é o que leio no Facebook? Ou os bate-papos nos grupos do WhatsApp? Quem sabe, a voz limpa de Elis cantando Louvação, de Gil e Torquato Neto, e enchendo o ar frio de poesia e alento? Não sei! O que importa é que minha alma, provavelmente por Elis e pelos amigos, está aquecida pela esperança de que sempre haja sol e luz em nossas vidas. Inclusive, metaforicamente.

Este texto é adaptação de uma crônica de 2014, publica no Jornal A Razão, sobre a Copa do Mundo no Brasil. Nosso país, apesar da incivilidade reinante, ou talvez por ela, continua se prestando às metáforas.

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