colunista do impresso

Equívocos e esperanças

style="width: 100%;" data-filename="retriever">

Hoje, a sensação que tenho é a de que me equivocarei de tal forma, que não haverá margem para qualquer tipo de dúvida quanto a isso. Explico-me: em meio à pandemia da Covid 19, à vista das ações e reações das pessoas, desde as mais próximas até as mais altas autoridades mundiais (com as exceções naturais), tive a clara sensação de que, vencida esta complicada etapa de tentativa de controle e de tratamento da doença e restabelecidas as condições de mínima normalidade, teríamos todos uma espécie de renascimento e que, deste renascimento, surgiria resplandente de fraternidade um renovado planeta Terra, regenerado física e espiritualmente e assentado em uma nova ordem mundial.

Sim, essa era a impressão que eu tinha. Mas, pensando bem, talvez nem fosse uma sensação baseada nos fatos, na racionalidade, talvez fosse apenas a esperança brotada em meu espírito sonhador de que o mundo estava percebendo que muito do consumismo exasperante que nos domina não tem qualquer sentido ou justificativa lógica; que a maior parte do lixo que produzimos, poluidor dos oceanos e da atmosfera, não tem qualquer relevância para nossa subsistência como espécie; que o acúmulo desmesurado de riquezas nada significa diante inevitabilidade da morte; que a fome e a miséria não podem servir de escada para construção de projetos cada vez mais excludentes e concentradores de renda e de riquezas.

Acreditei que todos estivessem percebendo que o ódio político, filho bastardo e aleijão do embate de ideias e das relações dialéticas, dos quais se pode buscar o entendimento para construir soluções para problemas coletivos, nada é capaz de gerar além de mais ódio e irracionalidade. A propósito, em nosso país, verificamos a total exasperação desse comportamento imbecilizante  (ódio), pois conseguimos atribuir caráter ideológico a ações de saúde recomendadas por cientistas e adotadas em todo o mundo, independentemente do matiz politico de quem governa. Nós, todavia, que temos um governante cujo comportamento - por ações ou omissões - não fosse deletério, não passaria do ridículo e do burlesco, tínhamos que atribuir cunho ideológico ao vírus e às formas de controle adotadas mundialmente.

Só não ouso afirmar que tudo está definitivamente perdido, porque sou otimista inveterado e me animo com os exemplos de solidariedade que se multiplicam e fazem contraponto aos arroubos demagógicos de uns e outros, inclusive, a tantos que gostariam de ver aprofundados os fossos sociais que nos dividem, nos separam e nos categorizam em função do vil metal que (não) acumulamos, do nosso grau de instrução, da cor de nossa pele ou de nossa identidade de gênero. A capacidade de sermos solidários agora é que poderá fazer a diferença entre continuarmos sendo e agindo exatamente como sempre fomos e agimos ou criarmos bases sólidas para que amanhã, realmente, possamos todos viver em ambiente propicio à cordialidade e ao entendimento e, portanto, em condições de acreditar que a fraternidade e a paz são possíveis.
Ainda há tempo para refletir sobre isso. Se houver essa reflexão, terei imenso prazer em reconhecer-me equivocado quanto ao equívoco em que pensei ter incorrido.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Imagens que marcam Anterior

Imagens que marcam

A vida pela janela Próximo

A vida pela janela

Colunistas do Impresso