opinião

Dignidade para todos

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A noção de dignidade como um valor inerente ao ser humano tem sido (re) construída ao longo do tempo e seus contornos são dados de acordo com os valores sociais e morais de cada época. No entanto, quando falamos em proteção jurídica aos animais não-humanos, esse delineamento parece não evoluir de forma proporcional às transformações. As insurgências acerca dos maus-tratos e da exploração desmedida dos animais surgiram há décadas. Quando Peter Singer escreveu, em 1975, a obra Libertação Animal, o que ele pregava, em verdade, não era que os animais deveriam ser libertados da dominação humana, embora o título do livro possa nos remeter a essa ideia. A proposta era o desenvolvimento de regras mínimas de proteção às formas absurdas, óbvias e desnecessárias de sofrimento animal que se traduzissem em efetiva proteção e respeito aos seres não-humanos. Ele defendia o estabelecimento de condições mínimas de bem-estar animal. 

Passados mais de 40 anos da precursora obra, quando as proposição filosóficas evoluíram do então conceito de bem-estar de Singer para outros mais contemporâneos, fundados na ética deontológica (com base na teoria moral), passando pela teoria da libertação (direito de não ser considerado uma propriedade) e, mais recentemente, na defesa de uma ideia tegracionista, fundamentada nas noções de cidadania e soberania para os não-humanos, ainda discutimos acerca da (im) possibilidade da manutenção de veículos de tração animal em nossa cidade. Parece que estamos nos transportando para a década de 1970, quando só o que era possível discutir se eram as obrigações humanas para com o bem-estar animal, embora não se permitisse, naquela época, negar que eles estavam aqui para serem considerados nossas propriedades - assim como uma mesa ou um sofá, com o mero propósito de nos servirem. 

Me parece tão óbvia a necessidade de abolirmos os veículos de tração animal que sequer consigo imaginar que haja quem defenda o contrário. Não estou negando os impactos sociais que as mudanças proporcionariam, mas estou afirmando que é o mínimo que nós, seres tidos como "inteligentes", deveríamos fazer em prol daqueles que escravizamos e exploramos. Se haverá consequências - e elas existirão - cabe ao poder público minimizá-las e a toda a sociedade arcar com esses custos, afinal somos os responsáveis pela coisificação dos animais. 

Enquanto o projeto que tramita junto ao Congresso Nacional e que os reconhece como seres sencientes (que sentem dor, emoção etc.) e, portanto, confirma a sua semelhança com os seres humanos não adquire força de lei, podemos - na verdade devemos - adotar medidas pontuais no sentido de corrigir minimamente as distorções que criamos ao longo da nossa história. É evidente que impedir que veículos sejam movidos por tração animal ou mesmo deixar de considerar os não-humanos como coisas é um pequeno passo no caminho de concedê-los uma efetiva dignidade, mas pior do que dar passos pequenos é ficar estagnado. 

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