cultura

Amor, perdoa meu ódio!

data-filename="retriever" style="width: 100%;">

E não é que o mês de dezembro chegou? Para alguns, uma prova de sobrevivência. Para outros, mais um ano ao longo dos milhares da história do mundo. E, para certas filosofias religiosas, época de celebrações natalinas e de Ano Novo! 

Para mim... bem, para quem conhece meu estilo de escrita, sabe que considero as datas comemorativas valorosas no sentido afetivo e simbólico. Porém, procuro viver todos os dias enquanto ciclos, mantendo o fluxo, a energia, o movimento. 

Leia mais colunas de cultura

Em se tratando de continuidade, eu não poderia deixar de falar sobre arte. E a sua capacidade de continuar. Aliás, ouvi de alguém, ainda esta semana, que se a arte não fosse importante e transformadora, ela não teria persistido até agora.  

Sobretudo o teatro, uma das artes mais anteriores da história, que hoje pulsa tanto quanto à época dos antigos gregos. E, já que estamos no Brasil, eu não poderia deixar de citar um dos maiores dramaturgos da história do país: o pernambucano que escolheu o Rio de Janeiro para viver, Nelson Rodrigues (1912-1980). Para algumas pessoas, alguém de pensamento bastante conservador. Para outras, um polêmico, quiçá um homem perigoso. E, para outras ainda, alguém que, como poucos, teve a perspicácia de falar sobre a classe média. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Fotos: Anderson Martins

Mas, já que também escrevo de Santa Maria, eu igualmente não poderia esquecer de um rosariense que fez deste município a sua casa, e é um dos fundadores da Companhia Retalhos de Teatro - a caminho de seus 25 anos de existência em 2020: o ator, diretor e educador teatral Helquer Paez. Que dirige o espetáculo teatral Os Sete Gatinhos, peça escrita por Nelson Rodrigues, com diversas apresentações dentro e fora da cidade. 

Qual a relação possível entre Nelson Rodrigues, a Companhia Retalhos de Teatro, Helquer Paez, Os Sete Gatinhos e os dias de hoje? O teatro torna presente e universaliza conflitos, dilemas, questionamentos e a incoerência humana desde antes da Grécia Antiga. Sejam eles dos tempos de Sófocles, passando por Shakespeare, Brecht, Rodrigues, até chegar a Paez, em seus 30 anos de vida teatral. Tão perto, tão longe. Tão longe, tão perto. 

Os Sete Gatinhos é um texto que tem mais de 60 anos e já foi montado por diversos artistas. Mas, ainda assim, em 2019, sob a direção de Helquer Paez, continua a afetar as pessoas. Nos palcos de Santa Maria, Santiago, Santa Rosa, Erechim, Porto Alegre. Uma montagem feita aqui no município e, ao mesmo tempo, uma dramaturgia sobre uma família de classe média baixa do subúrbio carioca às vésperas dos anos 1960.  

Ontem. Hoje. E amanhã. Os Sete Gatinhos não passa despercebido por onde é apresentado. Não é à toa que é um espetáculo bastante querido para o diretor Helquer Paez, que há anos resiste em realizar arte aqui, em Santa Maria. Mas a pergunta ainda persiste: por que Nelson Rodrigues, a Companhia Retalhos de Teatro e Os Sete Gatinhos? Por que hoje? 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">

Porque Nelson Rodrigues continua atual, para além de suas apropriações da pornochanchada do cinema brasileiro. Sobretudo, ao abordar uma das instituições mais íntimas e complexas do Brasil e do mundo: a família. Nelson Rodrigues e Helquer Paez encaram e escancaram as relações problemáticas que submergem de uma família dita de bem. Aquilo que as aparências ocultam, mas não é possível sustentar para sempre. Os sacrifícios que são feitos em nome de interesses obscuros. Aquilo que não se revela na epiderme, mas que se torna tão visível quanto uma tatuagem, hospedada logo abaixo, na derme. 

Por isso a arte resiste. Por isso Nelson, a Retalhos e Helquer. Pois as máscaras caem. O que constrói as realidades é desnudado. A arte não dorme. E o teatro é nevrálgico quando se trata do vestir e despir de véus, tudo a seu tempo.  

E, assim, o teatro continua. E continuará, na abertura e fechamento de ciclos e de cortinas. Mesmo quando, apesar de todos os pesares, ter de refletir, em nome da humanidade, o que a personagem Aurora, de Os Sete Gatinhos, fala para seu amante, Bibelô, antes de atacá-lo: "Amor, perdoa meu ódio". 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Séries e filmes brasileiros que ganharam versões pelo mundo Anterior

Séries e filmes brasileiros que ganharam versões pelo mundo

O que esperar das plataformas de audiolivros no Brasil Próximo

O que esperar das plataformas de audiolivros no Brasil