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PLURAL: os textos de Neila Baldi e Noemy Bastos Aramburú

(Rir)sistir
Neila Baldi 
Professora universitária

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Na última terça-feira, a luz da ribalta se apagou para um dos tantos artistas que este país produziu. Naquela terça trágica, em que crianças foram assassinadas por um jovem numa escola, a Covid levou mais um artista. Entre anônimos e famosos, são mais de 415 mil brasileiros e brasileiras.

Paulo Gustavo, a Dona Hermínia de Minha mãe é uma peça, nos lembrou, antes de morrer, da importância da Arte em nossas vidas. No especial de final de ano, na TV, disse: "Primeiro vamos combinar que este ano serviu para mostrar que a gente não vive sem a graça, sem humor. O humor ele salva, ele transforma, alivia, cura, traz esperança pra vida da gente. Essa pandemia também deixou bem clara a importância total da arte nas nossas vidas. Vocês viram, né? Esse ano foi difícil? Foi. E foram as artes dramáticas, a música, o cinema, a dança, enfim, a cultura em geral, que nos ajudaram a seguir em frente, tornando tudo um pouquinho mais leve."

Quantos e quantas artistas se desdobraram para continuar produzindo Arte? Quantos e quantas ainda produzem Arte, mas precisam buscar sustento em outras atividades? Aldir Blanc, que morreu de Covid, virou lei de auxílio, mas o dinheiro não chegou a todo mundo, nem no tempo da necessidade. Paulo Gustavo não precisou da Lei Aldir Blanc mas, com todos os recursos que tinha, usando 'pulmão artificial', não resistiu à Covid.

RESISTÊNCIA

"Eu fico muito orgulhoso de ser artista e mais ainda da comédia ser tão forte em mim, eu faço palhaçada, você ri, eu fico com o coração preenchido aqui, eu me sinto assim, realizado de estar conseguindo te fazer feliz. Rir é um ato de resistência", disse Paulo Gustavo no especial da TV. Fazer Arte é resistir. Fazer Arte no Brasil atual é um ato de resistência e rebeldia: porque querem nos asfixiar.

Naquele especial, ainda falou: "A gente agora está precisando usar essa máscara chata pra proteger o rosto desse vírus e, infelizmente, essa máscara esconde algo muito precioso para nós, brasileiros, o sorriso. Ele está tapado, tem que ficar tapado, mas ele existe, ele não vai deixar de existir. A gente não vai deixar de sorrir, não vai deixar de ter esperança." 

Vamos resistir e esperançar. Porque nos mantermos vivos e vivas e produzindo Arte é combater o genocídio brasileiro. Para Caetano Veloso: "É significativo que a notícia de que o perdemos chegue no dia em que se abre a CPI da Covid no Senado Nacional." No dia em que o país começa a apurar os responsáveis por nossa tragédia, o riso se cala. E o choro desaba.

Paulo Gustavo e tantos brasileiros e brasileiras estão morrendo de um vírus para o qual já existe vacina. Só que não para eles e elas. Porque o senhor da casa de vidro negou a compra.

A efemeridade da vida

Noemy Bastos Aramburú
Advogada, administradora judicial, palestrante e doutora

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O dicionário semanticamente define efêmero como algo passageiro, temporário, transitório. E, para o homem comum, o que significa efêmero? Depende. 

Se fizéssemos uma enquete no ano de 2019, no calçadão, perguntando "o que é efêmero para você?", acredito que teríamos as seguintes respostas: para o idoso - a juventude, para uma mulher romântica - a flor, para o vendedor ambulante - o picolé, para o adolescente - a bateria do meu iphone. Enfim, cada um responderia o que lhe era valioso e com curta duração naquele momento de sua vida. E hoje, 2021, o que este idoso, mulher romântica, vendedor ambulante e adolescente entendem como efêmero?! Creio que todos responderiam "a vida". Caro leitor, permita-me passar do artigo ao texto literário. 

O mundo contemporâneo tem mostrado que não é apenas o idoso que morre, que a Covid-19 tem matado pessoas de seis meses, 22 , 42, 65 ou 71 anos do mesmo modo e com a mesma rapidez. Este fato trouxe uma nova ideia de efemeridade, qualquer um pode morrer pela Covid-19, independentemente da idade; porém, por ser algo que foge ao poder do homem, ainda é mais fácil aceitar tais mortes, já que não tem ingerência direta do homem para evitar. 

Também é mais fácil aceitar a morte das crianças como foi o incêndio na creche Casinha da Emília na cidade de Uruguaiana em 2000, por se tratar de caso fortuito ou força maior, uma vez que também houve ingerência voluntária do homem. Mas como aceitar e entender a morte das três crianças com menos de dois anos e das duas professoras na creche de Saudade? 

Trata-se de um jovem de 18 anos que, voluntariamente, adentrou na creche, munido de duas facas e feriu cada uma dessas crianças e professoras com pelo menos cinco facadas. Graças a intervenção dos vizinhos que ouviram a gritaria e das professoras que conseguiram trancar suas salas, não ocorreram mais mortes, inclusive, um bebê de 1 ano e 8 meses conseguiu sobreviver, apesar de ter passado por uma cirurgia de urgência e estar na UTI. 

Como atribuir tais mortes à efemeridade da vida? Não se tem efemeridade, mas outra característica da vida contemporânea: perda dos valores basilares, perda da essência da vida, perda do nosso eu. As reportagens não falam de motivação para o crime, e com certeza não há motivo para tal brutalidade, mas com certeza se esta pessoa fosse questionada sobre quem ela é? Por que ela agiu assim? Sabemos que não teria resposta a estas perguntas. 

Temos resposta a estas perguntas: enquanto o homem não aceitar as diferenças, não entender que cada um tem seu jeito de ser e que todos devem ser respeitados, crimes como estes, infelizmente, acontecerão. A Covid-19 veio e passará, mas as mortes por motivos torpes, infelizmente, continuarão. Que Deus traga o consolo a todos os que perderam seus entes queridos, independente do modo como aconteceu.

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