Artigo

OPINIÃO: Os simples

Eros Roberto Grau

A vida me ensinou que, embora devamos lutar com toda a força em defesa de nossas ideias, é fundamental sermos simples. Simples como o pó da estrada, qual seguidamente repetia meu pai lembrando um poema de Fernando Pessoa. Isso, aliás, relembrei aqui, em um dos meus textos quinzenais. A poesia diz mais do que a prosa, ainda que o Álvaro Moreyra – o Alvinho – em um poema bem curto, de um verso apenas, afirme que palavras não dizem nada, melhor é mesmo calar. Não sigo seu conselho e, desta vez, ouso recorrer a outro poema, este do Guerra Junqueiro, ¿Os simples¿. 

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O peregrino pretendia dar volta ao mundo, prender monstros, combater serpentes... Anos depois, no entanto, ao regressar bem velhinho, deu-se conta de que apenas a estrela Vesper o conhecia, em sua dor e aflição. Nada lhe restou, então, senão bendizer o seu clarão. Ouso fazer literatura de quando em quando. Em um conto que escrevi em torno de uma sibipiruna fustigada pelo frio lembrei que o tempo é mera convenção, de modo que os acontecimentos não são encadeados, não se seguem uns aos outros. 

Menos ainda consequentes, nada impedindo que o antes ocorra depois e um estalar de dedos, de repente, seja mais longo do que a eternidade. Se aumentarmos cem vezes, exatamente na mesma proporção, o tamanho de todas as coisas que enxergamos, nada será diferente do que é. Tudo exatamente na mesma proporção. Objetos, pessoas, horizontes, nós mesmos, na mesma proporção. Multiplique por mil ou divida por um milhão e tudo será exatamente igual ao que temos aqui, agora. 

Divida tudo por um bilhão de vezes, guardadas as mesmas proporções, e nada se altera. Tudo continua a ser exatamente como é. E, mais, o tempo é como o espaço, de sorte que a eternidade pode durar o instante de um plect nos dedos! Suponha uma sala apenas com uma janela e uma porta, fechadas. Tudo vazio, somente você lá dentro. Se aumentarmos a dimensão das paredes exatamente na mesma proporção, inclusive o seu tamanho, não notaremos nenhuma diferença. E, também se alterarmos as unidades do tempo, tudo ficará mais rápido ou lento, mas nenhum de nós terá consciência disso. Por isso nosso ideal haveria de ser, singelamente, a simplicidade, sermos simples. 

Bem a propósito, retorno a Fernando Pessoa, agora em outro poema ¿Se te queres matar¿ no qual afirma que, depois que nos formos, seremos lembrados apenas quando fizer anos que nascemos ou que morremos. Mais nada, absolutamente mais nada. Apenas uma vez ou outra, se alguém falar de nós, outro alguém que nos tenha amado suspirará por nós. Os simples sabem bem que a vida, como diz o Ivan Lins e já repeti nessa minha coluna quinzenal, pode ser maravilhosa! Bah! Quase meia-noite! Preciso enviar esta minha charla à Fabiana, está na hora dela fechar a edição do nosso jornal. Acho que vou conseguir, mas na minha idade – que nem parece, de verdade! – não tenho mais certeza nenhuma. 

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