Marcelo Oliveira (Prefeitura de Santa Maria, Divulgação)
Delimitação de espaço e venda somente para clientes. Estas medidas estão entre as adotadas por alguns bares de Santa Maria após da lei que proíbe o consumo de bebidas alcoólicas em locais públicos durante a madrugada.
É o caso de um estabelecimento em Camobi que, apesar de auxiliar na contenção do público que permanece na rua, vê problemas na eficácia da legislação.
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Passados dois anos após a sanção da lei complementar 159/2022, e um ano e meio com funcionamento punitivo, o poder público emitiu quase 200 notificações a infratores da legislação, o que reverteu aos cofres públicos um montante de cerca de R$ 41 mil.
Atualmente, conforme a secretaria Licenciamento e Desburocratização, que coordena as ações, as atividades são divididas semanalmente, em pontos considerados estratégicos. Com a chegada do verão e consequente aumento da circulação de pessoas durante a madrugada, é cogitada a intensificação das patrulhas.
O contexto atual
Após a sanção, em 23 de dezembro de 2022, a lei passou a valer em fevereiro de 2023, mas ainda com caráter educativo. Foi a partir de 17 de junho daquele ano, que quem fosse flagrado consumindo álcool nas ruas, praças e locais públicos durante a madrugada poderia de fato receber alguma notificação.
Desde o início das fiscalizações, houve mudança nos pontos de concentração de pessoas nas vias públicas. Segundo Beloyannes Pietro Junior, secretário de Licenciamento e Desburocratização, a migração e sazonalidade dos grupos são dois problemas enfrentados pelas equipes:
– Há situações isoladas com poucas pessoas, e outras situações de aglomeração.Nestas há um padrão de migração, a cada mês, geralmente. Com a fiscalização, as pessoas dispersam, mas voltam a atuar em outros locais. É o que chamamos de inconsciente coletivo – afirma.
Sobre estes locais, a secretaria informou que há alguns meses, um dos principais gargalos de imprudência à lei era a Avenida Ângelo Bolson, localizada no Bairro Duque de Caxias. Conforme a pasta, o problema foi amenizado. Porém, com isso, outro local ganhou o foco das ações, a partir do aumento da movimentação a noite: a Rua Silva Jardim, próximo à Universidade Franciscana (UFN).
A Brigada Militar, que é um dos órgãos a fazer rondas de fiscalização, informou que, durante este ano, aglomerações foram dispersadas principalmente na proximidade da Praça Saturnino de Brito, Rua Duque de Caxias e Bairro Camobi.
Justamente nesse bairro, o proprietário de um estabelecimento conta o que mudou a partir da implementação da lei, e que, apesar de adotar novas medidas, carece de apoio do poder público na manutenção da segurança para além dos limites bar.
O horário estabelecido pela lei prevê apenas a proibição ao consumo e não à comercialização de bebida alcoólica. Assim, bares e distribuidoras podem vender normalmente.
O responsável Thallis Huppe, conta que antes (da lei), o empreendimento era aberto e o público que consumia bebidas no ambiente interno se mesclava àquele que por vezes “fechava a rua”. Por isso, uma das soluções encontradas foi a delimitação do espaço da empresa.
Motivada pela lei e na expectativa de contribuir para o cumprimento desta, a administração também passou a vender bebidas somente para quem está dentro do local.
– Não é uma função nossa, mas fizemos o possível para não deixar pessoas na volta. Tanto que não vendemos [bebidas] para quem quer levar. Só vendemos para quem está aqui. Nós poderíamos operar como distribuidora e bar, ao mesmo tempo, mas não fizemos isso – afirma Thalis.
Mesmo com essas alternativas, o administrador diz que é comum a junção de pessoas do lado de fora do bar e ruas nos arredores, o que gera situações de perturbação do sossego. Questionado, ele diz sentir falta de ações concretas dos órgãos de segurança, que costumam apenas “passar em frente” ao local, sem realizar abordagens.
– Se eles passam e não fazem nada, quem somos nós para exigir que eles saiam daí?
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O que se percebe dois anos depois
Dois anos após, para o Poder Público, a avaliação é a seguinte: o hábito de beber na rua está intrínseco na cultura da sociedade, e uma mudança requer tempo. Beloyannes afirma que a situação é frequentemente estudada, e que, ao longo dos anos, houveram mudanças na forma de fiscalização e abordagem. Nesse contexto, o secretário tem uma opinião:
– Temos que atrair esse público que está nas ruas, para outros locais, locais mais reservados. Mas ao mesmo tempo temos que conseguir garantir o direito dos jovens de se divertir, e também o direito da população ao sossego.
Para isso, o secretário frisou que é importante o auxílio das partes: de estabelecimentos que podem auxiliar a controlar o público e de moradores, que podem ajudar com denúncias. Outra ferramenta de combate ao descumprimento da legislação, vem das câmeras de segurança do Centro Integrado de Operações em Segurança Pública (Ciosp).
– A intenção é conciliar o direito dos envolvidos: quem tem o estabelecimento tem o direito de comprar. Quem tem o estabelecimento tem o direito de vender. A pessoa que esta em casa também tem direito de descansar. Todos os direitos são legítimos – afirma o responsável pela pasta.
Apesar do número de notificações formalizadas (de 199), a prefeitura informou que o número de abordagens - que as vezes resultam apenas em orientação - é maior. Em nota, também alegou que as patrulhas são realizadas com frequência e que estas são procedidas da seguinte forma: “No momento da abordagem é solicitado que cesse o consumo de bebida alcoólica, se sim, o pedido é que as bebidas sejam descartadas. Em caso de discordância, lavra-se a notificação.”
O autor da lei, ex-vereador Getúlio de Vargas (Delegado Getúlio), atual titular da Secretaria de Segurança Pública, também atribui o hábito a um processo cultural e que o processo é um “trabalho complexo e contínuo, de atuação multidisciplinar”. Mesmo assim, considera o resultado positivo:
– Tivemos uma redução do consumo em vias públicas e um importante incremento de movimento e criação de bares, restaurantes e espaços privados voltados ao lazer com segurança e qualidade e, também, uma sensível redução do barulho produzido por carros e motos.
Dados levantados pelo secretário mostram que pelo menos 247 operações conjuntas foram realizadas pelas forças de segurança após a implementação da lei.
– É um trabalho muito mais educativo do que repressivo, e isso vem sendo feito, comenta, sobre a forma das abordagens.
Após o início do ano, a Secretaria de Governança, disse que a lei "está sendo discutida no âmbito das tratativas iniciais para execução do Plano de Governo da gestão 2025-2028". Ainda afirmou que um novo decreto deverá ser expedido nos próximos meses para regulamentar a fiscalização do sossego público, bem como determinar a secretaria que ficará responsável pela mesma.
E o que realmente diz a lei?
O texto que está no Código de Posturas do município é descrito como justificativa para garantir o sossego público e proibir o consumo de bebida alcoólica em logradouros públicos (avenidas, ruas, rodovias, praças, calçadas) entre meia-noite e 7h. A vigência da lei é para todos os dias da semana e também proíbe o uso de som alto de veículos em movimento, parados ou estacionados.
Na época, aprovado por 13 votos a sete, ficou determinado que em arredores de bares, quiosques, lanchonetes e restaurantes, a lei não restringe o consumo se os clientes estiverem dentro dos limites de domínio do estabelecimento. Também é permitido consumo, mesmo durante a madrugada, quando houver evento autorizado ou realizado pelo poder público.
A multa pelo descumprimento da legislação é avaliada em 50 Unidades Fiscais Municipais (UFMs). Já na primeira reincidência, a multa passa para 200 UFMs. Na segunda e terceira reincidências, a multa será de 1.000 UFMs e 2.000 UFMs, respectivamente. Convertendo para o real, as penalidades podem variar de R$ 228,12 a R$ 9.124,80 conforme o estágio da punição.
Denúncias
Denúncias por perturbação ao sossego e descumprimento da lei podem ser feitas pelo telefone do Ciosp: o 153. De segunda a sexta-feira, as denúncias também podem ser feitas no site da prefeitura.