desdobramentos

Como a 'indústria do contracheque' tem salvado a economia de Santa Maria nos últimos anos

Ao observar a realidade local, o professor universitário Daniel Coronel fala que Santa Maria sempre foi historicamente forte no setor de serviços. O que, segundo ele, começou com a ferrovia (em meados dos séculos 19 e 20) e, depois, com o Ensino Superior. Tendo, com o passar dos anos, o reforço do expressivo contingente do funcionalismo público (federal e estadual) e, principalmente, a presença das Forças Armadas. 

Por ter o segundo maior efetivo de militares do país - com 9,8 mil homens e mais de 20 organizações militares, o que rende, por ano, mais de R$ 450 milhões com o pagamento de salários de militares (da ativa e da inativa) -, Santa Maria tem, e não é de hoje, uma espécie de "seguro" contra a crise. Ou seja, o dinheiro que é injetado em folha de pagamento (contracheque) acaba por circular na cidade, o que alimenta uma cadeia de setores: imobiliário (venda e locação), automobilístico, comércio, gastronômico (bares e restaurantes), entre outros.

- Não se se pode menosprezar essa característica que é própria de Santa Maria. Mas também não se pode superdimensioná-la. Até porque isso não pode ser visto como a tábua de salvação. É importante sim. Mas não se pode ter na indústria do contracheque a única 'receita' para enfrentar momentos de crise.     

Além disso, o carro-chefe da economia local ao longo de quase 60 anos tem sido a UFSM - com uma comunidade universitária que gira na casa de 40 mil pessoas - e que é responsável por um orçamento, nos últimos 10 anos, superior a R$ 1 bilhão. Porém, como destaca o também economista Herton Goerch, o ponto negativo, nos últimos cinco anos, tem sido o parcelamento dos salários do funcionalismo do Executivo gaúcho. O que, por tabela, gera uma certa paralisia na engrenagem da economia local. Há, ainda, os 4,9 mil servidores municipais (entre professores e funcionários) que se somam à indústria do contracheque.

SUPERAR GARGALOS
Coronel fala de um outro desafio igualmente importante que cabe ao poder público dar enfrentamento: fazer com que Santa Maria seja atrativa ao investimento (seja interno ou externo). É preciso, para isso, atacar os gargalos da burocracia excessiva (o que torna moroso realizar empreendimentos na cidade), da infraestrutura precária (estradas com péssimas condições de trafegabilidade e ainda as próprias vias esburacadas dentro do perímetro urbano) e, por fim, da falta de embelezamento da cidade que, historicamente, tem sido negligenciada:

_ Soma-se a tudo isso, ainda, a necessidade de uma política pública eficiente de atração de investimentos, tanto para empresas nascidas aqui quanto para outras que queiram vir para cá. Precisamos aproximar mais os setores público e privado. E sem dizer da necessidade de revertermos a lógica de uma cidade que só exporta cérebros, e que não os retêm aqui.


Tendência é de diversificação, projeta secretário de Finanças 

  A matriz produtiva e econômica de Santa Maria passa por um momento de diversificação. A afirmação é do economista e secretário de Finanças, Mateus Frozza, que reforça o entendimento em base de números. Ao levar em conta a arrecadação de Imposto Sobre Serviços (ISS) das cem maiores empresas do município, apenas no ano passado, o recorte aponta para a seguinte proporção: empresas ligadas ao sistema financeiro (18%), prestadoras de serviços na área da saúde (14%) e empresas de base tecnológica (6%). A amostragem, enfatiza, é uma clara mudança do que, até então, era o centro dinâmico da economia local.

- Esses movimentos evidenciam que a matriz produtiva está em alteração. O setor de serviços segue sendo o carro-chefe da nossa economia. Mas ele (serviços) também está mudando e, nessa nova dinâmica, está atuando ao lado do setor tecnológico. O importante disso tudo é que a economia local, como um todo, não fica tão dependente de setores tradicionais e que, em regra, são mais suscetíveis aos humores da economia - diz Frozza. 

Frozza destaca ainda a participação das empresas de base tecnológica nesse movimento de ampliação do leque econômico. Ele lembra o projeto de lei, de autoria da prefeitura e aprovado em 2018, que reduziu a alíquota do ISS de 4% para 2% às empresas que atuam com pesquisa tecnológica. A matéria, à época, foi motivada porque Santa Maria perdeu duas empresas locais que buscaram outras cidades em decorrência de uma tributação menor.

REVERSÃO 
Frozza chama atenção para o que ele chama "de reversão de uma tendência de décadas", em que Santa Maria recebeu, por muito tempo, franquias de fora nos setores automobilísticos e do vestuário. E que, agora, nos últimos anos tem recebido franquias nas áreas educacional (cursos de idiomas) e da saúde (segmento odontológico). A cidade também é hoje uma "exportadora" de franquias nascidas aqui, muitas dentro das incubadoras da UFSM, e que ganharam o país. Mas, há um problema, que é a alta transferência de recursos aqui captados para fora, avalia o economista. Uma lógica que, pode ser mudada, quando as empresas aqui nascidas fixarem bases, projeta. 

Setores educacional e da saúde são destaques da economia  

Há, pelo menos, dois setores na prestação de serviços em que Santa Maria é referência: o educacional e o da saúde. Ao completar 115 anos no próximo dia 12, o Colégio Marista Santa Maria, que integra a Rede Marista, "chegou" ao município no longínquo 1905. À época, o trem era a locomotiva da economia de uma provinciana Santa Maria. Depois, veio o boom educacional, sendo que o embrião do que viria a ser a UFSM, com o primeiro curso de Direito, nasceu dentro do colégio marista. 

O diretor do Colégio Marista Santa Maria, Carlos Sardi, que também é delegado do Sinepe RS (Sindicato do Ensino Privado), destaca como o ponto alto da parte educacional privada da cidade seja uma combinação de situações: estrutura física aliada à qualidade do ensino, o que mantém a excelência.

Com 17 escolas privadas na cidade, muitas ligadas a instituições religiosas, Sardi diz que, anualmente, de 10% a 20% da receita do colégio é revertida em melhorias estruturais: obras, ginásios, laboratórios, salas modernas. Porém, ainda há assim há gargalos que precisam ser enfrentados. O maior deles, cita, é a falta de mão-de-obra qualificada. Assim, explica, a Rede Marista promove o chamado programa de formação aos professores com cursos e outras especializações. O Colégio Marista Santa Maria tem, atualmente, 1,1 mil alunos e 180 colaboradores (entre professores e funcionários).

2020 PROMISSOR
Já na área da saúde, o Hospital de Caridade Astrogildo de Azevedo, outra instituição centenária, tem em curso para este ano uma série de investimentos que, juntos, devem chegar à cifra de R$ 20 milhões. A diretora-executiva Angela Maria Perin avalia que, a curto prazo, Santa Maria deve se consolidar como um polo na área da saúde e, mais, sendo referência "entre os grandes do Estado". Prova disso, ela fala da realidade do HCAA que, ainda neste ano, deve realizar a compra de um equipamento PET Scan, considerado o top de linha no diagnóstico de câncer, e que deve ser ofertado em 2021. O investimento é estimado em R$ 10 milhões e faz frente ao montante expressivo previsto para 2020. Além disso, será inaugurada a sala híbrida de hemodinâmica, bem como a reforma de unidades e aquisição de outros aparelhos de ponta. 

Hoje, o HCAA dispõe de 400 leitos e outros 25 devem ser ofertados com a reforma de uma ala que está em curso. Passam, por dia, 6 mil pessoas pelo Hospital de Caridade que, atualmente, tem 1,7 mil funcionários. Além desses postos de trabalho, há outros 500 terceirizados e um corpo clínico de 769 médicos. Ao contabilizar o número de pessoas beneficiadas (entre funcionários diretos, indiretos, terceirizados e dependentes) são cerca de 10 mil pessoas.

PERCEPÇÃO
Originário da década de 1970, o Distrito Industrial tem, atualmente, 41 empresas que, juntas, empregam direta e indiretamente mais de 5 mil pessoas. Levantamento da Associação Distrito Vivo, que reúne as associadas, aponta que as empresas situadas na área de mais de 300 hectares, geraram R$ 260,4 milhões em impostos. O diretor da associação, o empresário Gabriel Trevisan Neto, fala que, muitas das vezes, "há uma percepção equivocada que só a UFSM, o comércio e o Exército são as principais forças da economia local". Ele chama a atenção para a participação efetiva e o potencial do DI junto à matriz econômica da cidade. 


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