opinião

OPINIÃO: Por um copo d'água

O dia amanheceu coberto de neblina, e, da Chapada dos Guimarães, nada se via, mas tinha o café pela frente para dar tempo ao tempo se mostrar. De fato, se mostrou, abriu e o sol reinou solitário para provar o dito da serração baixa, sol que racha. Amigas vestidas, banhadas de protetor solar e repelente, enganchadas nas mochilas com água, bolacha, banana e o chimarrão amigo. Assim equipadas, rumaram para o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. Grande ilusão, mal chegaram à primeira cascata, a Véu de Noiva, pousaram, fotografaram, observaram as maravilhas do Cerrado e as três tiveram a certeza que deveriam voltar; uma pela dor na cabeça, outra pelo respeito aos joelhos, e a terceira por solidariedade, afinal, eram um trio, não famoso como o dos Reis Magos, dos Mosqueteiros, ou dos Porquinhos, mas um trio que entrou para a história de vida de cada uma.

Assim, da cascata retornaram num jipe até a entrada do Parque, pegaram um ônibus, e nele, entre o riso e a conversa, decidiram descer no centro da cidade de Chapada. O trio bateu perna pela avenida principal, visitou a Igreja Matriz de Sant'Anna, um prédio azul construído nos anos de 1700, que abrigou remanescentes de quilombos, sendo restaurado e, nos últimos anos, tem missa nas quartas, sábados e domingos. Quem entra ali tem que segurar o queixo com as duas mãos tamanha beleza esculpida pelos escravos. Andaram do sacro ao profano, da oração às compras, afinal filhos, netos, afilhados, amigos, colegas, vizinhos, conhecidos, alunos. Todos mereciam uma lembrança, ainda mais de um lugar como aquele, tão perto do paraíso.

E, como ninguém é de ferro, entraram num restaurante, encheram o tanque para continuarem a bater pernas e voltarem para a dita Pousada Penhasco onde se hospedaram, cuidando para não rolarem vale abaixo. Na caminhada para a Pousada, 40 graus, a uma quadra de distância, foto daqui, foto dali, encontraram sentados, aproveitando a sombra duma árvore frondosa que crescera na calçada, o Claudio, um comerciante, e sua mãe Erotildes, uma senhora simpática natural de Poxoréu, que gerou 16 filhos e, agora, morava com este na Chapada dos Guimarães. No alto dos seus 80 e poucos anos, lançou um carinhoso olhar cheio de alegria e paz, no momento em que o filho disse: sentem aqui e tomem um copo d'água. Sem esperar a resposta, Claudio levantou-se, atravessou a rua e, num segundo, voltou com cadeiras, copos e água gelada.

Elas, num misto de surpresa e alegria, sentaram naquela sombra maravilhosa, beberam da água da garrafa e do conhecimento da dupla mato-grossense que fizera brotar a certeza de que gentileza, carinho, atenção e solidariedade salvam almas e dão esperança, amor e otimismo para seguir a caminhada. Isto tudo por um copo d'água. E você, caro leitor, já deu uma água para alguém?

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

OPINIÃO: Nada do que é humano me é estranho Anterior

OPINIÃO: Nada do que é humano me é estranho

OPINIÃO: O novo já nasce velho? Próximo

OPINIÃO: O novo já nasce velho?

Colunistas do Impresso