
Ainda sob o impacto de processo e resultado eleitorais sem similares na história, a sociedade brasileira foi sacudida por uma notícia na quinta-feira: o magistrado iniciador e símbolo da maior ação coordenada contra a corrupção, Operação Lava-Jato, aceita o convite para ser Ministro da Justiça (talvez, também da Segurança pela fusão de pastas) do próximo governo. Reflito que o presidente eleito foi o grande beneficiário deste evento: atrai para seu governo figura de enorme respaldo popular e ressalta a imagem pública de suposto combatente contra a corrupção. Pode reduzir algumas das resistências de setores da sociedade ao futuro governo.
Tanto o juiz como a Operação saem menores do episódio. O Magistrado terá de abandonar a função judicante e a carreira, aposentar-se precocemente (sem prejuízo de que venha a ser nomeado para Tribunal Superior). Talvez, deixe dúvidas sobre o passado e o futuro. As insinuações de que tinha inclinação política, lançadas por segmento partidário e ideológico, agora serão ponto de interrogação na cabeça de muita gente e de maior número dos operadores do direito. O Exterior, que já tinha reticências a respeito do tratamento judicial e policial a certo líder, vai aumentar a desconfiança. Quanto à Operação Lava-Jato, sinto dizer que terminou, pelo menos na forma como a conhecemos. Talvez fosse necessário, teria esgotado esta fase. Pode ser até que o país e as instituições tenham aprendido e que o Brasil mantenha vigilância sobre eventuais desvios de conduta de agentes públicos ou nas relações entre empresários e poder político.
Todavia, a forma como as ações foram levadas adiante, esticando ao máximo a interpretação legal e às vezes cometendo algum exagero tolerado por causa do apoio popular, isto se encerrou. Sem o juiz Moro à frente, as condutas e interpretações serão outras. Enganam-se os que pensam que ministro da Justiça sai por aí prendendo gente. Não no Estado de Direito. Ministro é cargo político-administrativo do Executivo. Ah! Mas a Polícia Federal vai estar na estrutura do ministério! Ministro não determina nem impede prisões pela PF, quem faz isso é a Justiça. Como polícia, tem autonomia no que se refere a investigações. Caso contrário, o atual presidente não teria sido tão importunado por sucessivos inquéritos! Aliás, instituições providas por concurso público,
Ministério Público e polícias não deixam de ter suas correntes conflitantes de opinião. Na última campanha eleitoral, tivemos em São Paulo ações típicas de confronto em anúncios de inquéritos que poderiam esperar o final do processo eleitoral: se eles processam o nosso, nós processamos o deles. Infelizmente, nem todos sabem separar a posição político-ideológica pessoal de sua ação funcional. Creio que sagaz e estrategista como é, certo líder político em cumprimento provisório de pena deve estar com um sorriso irônico em relação ao evento da indicação do novo ministro da Justiça e na expectativa de que vai ter novos lances no tabuleiro do xadrez jurídico.