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Julgar alguém?

A interrogação no título é merecida e justa, pois eu teria e tenho extrema dificuldade em julgar qualquer fato ou principalmente alguém em fatos ou atos. Não tenho "estômago" ou coração para adentrar em problemas dos outros. Quem sabe por nunca ter tido momentos obscuros para analisar e/ou culpar ou absolver seres humanos. Ainda que não esqueço que fiz especialização em Criminologia e estudei, no decorrer do curso, criminosos e vítimas.

Mas, no transcurso da vida, algumas situações nos colocam diante de casos que deveríamos ter nos aprofundado muito mais. Conto, pois, uma experiência vivenciada na cidade de Limoeiro do Norte, no Vale do Jaguaribe, mais precisamente 200 quilômetros ao sul de Fortaleza pela BR- 116. Um lugar bom, com um povo que o torna melhor, onde vivi por dois anos com parte de minha família, pois minha mulher, Leange, minha filha Rachel, ainda menininha, e eu ficávamos lá. Já os filhos mais velhos Alex e Erik, por dever de estudar em cursos superiores, ficavam na capital do Ceará.

Pois, em dia normal, recebemos uma pequena, mas representativa, parte dos moradores de um distrito de Limoeiro. Com a humildade contumaz daquela boa gente, que se dizia aconselhada por autoridades, tais como prefeito, o vice-prefeito, vereadores e outros, nos para nos convidaram a participar de uma situação "desajeitada" para com eles. Com a atenção que mereciam, escutamos o teor do problema. Se estava difícil para eles, imaginem para nós!

O problema: "Professor e professora", era assim que nos chamavam, iniciou a mais falante e melhor informada. "Estamos com um problema lá na nossa região, um pequeno roubo (seria um furto) de merenda na escola e temos que tomar uma atitude. O Raimundinho de Zé (nome, para este caso, fictício) foi pego roubando merenda. Descoberto, ele confessou que "por estar completamente sem nada, nada de dinheiro, levou uma parte da merenda para dar o que comer aos filhos e a mulher."

Nesse momento, quando o sol recém havia se escondido e o calor amainado, só se ouvia o cantar de alguns pássaros e mais nada, eu e Leange ficamos a nos olhar e sentindo que o chão sumira. Então, emudecemos ainda mais.

Ouvíamos argumentos daqui, dali, mas juro que a maioria era de dó e nunca de desprezo ao caso, e tampouco ao causador do problema. Alguém do grupo, resolveu nos indagar: "O que acham, professores?"

Entendemos que deveríamos, não mais do que apenas, repassar a pergunta a todos os reunidos e que, por o conhecerem mais e melhor encontrassem à solução. A que mais conhecia os vizinhos e amigos, resolveu e falou: "Professor e Professora, amigos, entendemos que a presença dos senhores foi ótima pois oportunizaram a nos aliviar da responsabilidade de um julgamento. Vamos, com o auxílio de todos, conseguir um serviço para o Raimundinho de Zé. Trabalhando ele ganha e não precisa mais pegar merenda!"

Estava o réu, liberto e sem crime, pois havia levado comida para a família. Nós, que imaginávamos uma punição, entendemos a razão de algumas autoridades da cidade não terem participado, pois ninguém queria a desgraça de outrem. Posso estar errado, mas apreendi que realmente não sei julgar! Deus queira que nunca eu necessite ser julgador ou julgado! Tenham a certeza de que esse fato/verdade, trouxe-me um ensinamento que conservo desde aquele - se não me falha a memória, julho de 1985 - e em companhia de gente humilde - mas sábia. "Somente dê vereditos depois de entender não somente o caso, mas o lado humano e momentâneo do acontecido." Ou melhor ainda, não me convidem a analisar e/o fazer julgamento(s) do que eu nem deveria saber." Abraço a todos!

Texto: Bira Alves
Jornalista

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