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A República dos Bacharéis

data-filename="retriever" style="width: 100%;">"O povo assistiu àquilo bestializado, atônito, surpreso, sem conhecer o que significava. Muitos acreditaram seriamente estar vendo uma parada", afirmou Aristide Lobo sobre o episódio da Proclamação da República, justo ele, um republicano que posteriormente viria, inclusive, a ocupar um ministério de Deodoro da Fonseca.

Serviu a descrição do jornalista mineiro para evidenciar que o golpe de Estado que derrubou Dom Pedro II foi dado por setores de uma elite brasileira totalmente alheia aos anseios populares. Não tinham os revoltosos que assumiam o poder, a intenção de trazer democracia ao país, aliás, derrubaram a Monarquia única e tão somente por não verem mais utilidade na existência de uma Família Imperial.

O período que se seguiu a esse golpe recebeu, dentre outras tantas, a alcunha de "República dos Bacharéis", pelo fato de que até 1930, o exercício de posições de destaque na política era exclusivo para detentores do diploma de bacharelado. Dificilmente vemos políticos de destaque que não tenham sido advogados, médicos ou jornalistas de formação.

A posse de títulos acadêmicos como requisitos para ocupar cargos públicos, na verdade, era apenas uma maneira de a elite manter os privilégios dos tempos de Império. Sabiam que uma ínfima minoria abastada tinha condições de chegar aos bancos universitários e não queriam correr o risco de ver o poder escorrer para as mãos de negros recentemente libertos, ou de imigrantes recém chegados de outros países.

Em termos historiográficos, essa República dos Bacharéis se encerrou em 1930, mas seu espírito permaneceu vagando por terras tupiniquins e, a pouco, vem ressurgindo com intensidade. Se no fim do século 19 os bacharéis determinavam a vida política no Brasil, hoje igualmente o fazem, algumas vezes, inclusive, a despeito da vontade da população e da própria lei.

Então, tudo como dantes no quartel de Abrantes? Não, nem tudo. A advocacia privada, hoje, já não é mais uma "elite" política, nem econômica significativa como foi outrora. Ser advogado não é mais nenhum privilégio, aliás, pelo contrário: nunca o ensino jurídico (mesmo que às vezes enlatado e pasteurizado) foi tão democrático. Nós, causídicos, somos, hoje, cerca de 800 mil em todo o Brasil, formados por 1.240 cursos de direito, número superior ao verificado em todos os demais países do mundo somados.

Com a Constituição de 1988, o poder político foi jogado no colo dos bacharéis inseridos nas carreiras jurídicas de Estado. Estes sim, hoje, têm poder para fixar sua própria remuneração, decidir quem pode ou não ser ministro, definir como deve ser o processo eleitoral, dizer o que pode e o que não pode ser publicado na imprensa, escolher quais leis devem ou não ser aplicadas e, principalmente, estabelecer quais penas devem ser aplicadas a quem se contrapor a essa ordem.

Eis a nossa República dos Bacharéis. Fico eu, aqui, à espera de mais uma Revolução de 1930.

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