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'Cidadão, não. Engenheiro civil'. Existe diferença entre instrução, educação e cidadania?

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Recentemente, um caso ocorrido em uma região "nobre" do Rio de Janeiro ganhou repercussão nacional, quando de forma irresponsável e sem os mínimos cuidados de proteção diante de uma pandemia, pessoas se aglomeravam em bares do Leblon sem levar em consideração as instruções dos órgãos de saúde no contexto do aumento exponencial dos casos de contaminação e óbitos por Covid-19 no Brasil. "Cidadão, não. Engenheiro civil". A fala de uma mulher durante a fiscalização tomou conta do noticiário e das redes sociais.

Nesse momento, reacendeu em mim alguns questionamentos que já faço há algum tempo. Será que a população em geral tem consciência da diferença entre instrução e educação? Será que ambas expressões são sinônimas? Será que uma pessoa instruída é necessariamente bem-educada? Será que não existe pessoas muito bem-educadas mesmo com baixo grau de instrução? Qual a relação que se pode tecer entre instrução-educação-cidadania? Talvez a compreensão desses conceitos possa nos ajudar a entender alguns fenômenos sociais, especialmente no nosso país.

Em conceito menos divergente, instrução faz referência à ação de instruir (ensinar, doutrinar, comunicar/transmitir conhecimentos, dar a conhecer o estado de algo). A instrução, por conseguinte, pode tratar-se da formação ou da educação em geral. Neste sentido, o conceito é bastante abrangente e abarca qualquer tipo de ensino que se leve a cabo em diversos âmbitos. Logo, instrução pode compreender tantos as informações que são passadas de uma pessoa para outra, seja pessoalmente ou através de programas de computador, por exemplo, as instruções gravadas em vídeo ou áudio, ou mesmo pode compreender o ensino ou treinamento passados.

A educação é o processo de facilitar o aprendizado ou a aquisição de conhecimentos, habilidades, valores, crenças e hábitos. A verdadeira natureza da educação não se trata simplesmente de mais uma competência dentro de um modelo de educação, mas trata-se do que de fato é educação, daquilo que dá sentido real e definido ao termo. A concepção de educação como o exercício do conhecimento (ou porque não dizer também, o exercício de competências) sobre as bases de uma regra moral através das interações sociais não é idealista, muito menos sentimentalista, mas lógica e coerente com a realidade prática.

A cidadania por sua vez é o conjunto de direitos e deveres exercidos por um indivíduo que vive em sociedade, no que se refere ao seu poder e grau de intervenção no usufruto de seus espaços e na sua posição em poder nele intervir e transformá-lo. O exercício pleno da cidadania não depende apenas das prerrogativas legais ou dos documentos que delimitam direitos e deveres. A cidadania plena é acessada por meio de condições oferecidas pelo Estado e também pela própria sociedade. Contudo, essas importantes previsões legais não impedem que muitos brasileiros não alcancem direitos básicos, como liberdade, moradia digna, saúde, educação e trabalho.

Sendo assim, podemos concluir que uma pessoa com formação, ou seja, bem instruída, mas que não cumprimenta o porteiro, por exemplo, é definitivamente mal-educada. Assim como existem muitas pessoas inclusive analfabetas, frutos do descaso do poder público com o compromisso de oportunizar boa formação, que são muito mais educadas, com atuação cidadã e senso de coletividade do que muitos que frequentaram as melhores instituições de ensino e que geralmente uma parte privilegiada da população pode acessar. Pois, nas palavras de Paulo Freire, grande educador brasileiro reconhecido internacionalmente: "Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre".

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