mortes

Muito mais que números: dor, saudade e luto pelos que partiram vítimas da Covid-19

***abre***

Quando você disse o seu último adeus? Para mais de 470 famílias santa-marienses, a despedida de uma pessoa amada foi em silêncio e solitária, sem abraços entre familiares e amigos ou oportunidade de lançar um último olhar para quem partiu vítima da pandemia mais severa do século: a de coronavírus. Pessoas que morrem com Covid-19 ou suspeita de contaminação são sepultadas de forma direta, sem velório e com o caixão lacrado. Uma triste cena de ainda mais sofrimento para quem fica. Somente no primeiro trimestre deste ano, foram 713 mortes por diferentes causas na cidade, 257  delas por causa da Covid, o equivalente a 36%. Mesmo que haja dezenas de óbitos por outras doenças e circunstâncias, a Covid foi uma das principais causas de mortes nos meses de janeiro, fevereiro e março. Assim, as funerárias viram seus serviços aumentar e se prepararam ainda mais para garantir o pleno atendimento. O sentimento geral é de perplexidade pelo aumento de casos e mortes. Quase um ano depois do primeiro óbito na cidade, famílias ainda choram as lembranças de quem partiu, enfrentam a dor de uma despedida não ocorrida e do difícil processo de luto intensificado pela pandemia.

Quem acessa os comentários nas redes sociais do Diário já deve ter lido as seguintes perguntas: "ninguém morre de outras doenças?" ou "só morrem de Covid agora?". A resposta é sim e não, respectivamente. Outras doenças e causas externas também levam a óbitos. Dezenas de pessoas morrem todos os meses em Santa Maria por diferentes fatores. Em todo o ano passado, 2.211 santa-marienses morreram. Números aproximados também foram registrados em 2018 e 2019. A diferença é que desde 2020 tem o fator Covid, que faz o número de mortes crescer. 

As informações são da prefeitura, e são consideradas todas as mortes, por diferentes causas, de residentes de Santa Maria que morreram no município. Óbitos por Covid-19 são incluídos na causa da morte por "alguma doença infecciosa ou parasitária". Contudo, os números apresentados neste item são referentes a todas as enfermidades que se enquadram como infecciosas ou parasitárias.

Mesmo que haja outras doenças neste mesmo grupo, percebe-se o claro aumento dos números deste quesito em 2020 e em janeiro, fevereiro e março de 2021. A média de todos os meses de 2018 e 2019 é de 92 mortes por alguma doença infecciosa ou parasitária. Em 2020, foram registrados 217 óbitos neste item. Agora, só o primeiro trimestre de 2021 já soma 233 mortes neste grupo.

Além de Covid-19, pessoas morrem em Santa Maria por diversas outras doenças, como: do aparelho circulatório (582 perderam a vida em 2020); Neoplasias - tumores (520 mortes no ano passado); doenças do aparelho respiratório (191 mortes); causas externas de morbidade e mortalidade (150 óbitos em 2020); entre outras mortes listadas pelo município.

Conforme o enfermeiro da Vigilância Epidemiológica do município, Márcio Difante, percebeu-se este aumento de mortes nos últimos meses, e, assegura, a Covid contribuiu para este crescimento:

_ Percebemos um aumento expressivo, porque são muitos casos de pessoas que morreram de Covid-19 ou em decorrência da doença. Em tempos não pandêmicos, as doenças infecciosas não levam a tantas mortes como agora, durante a pandemia de coronavírus.

REGISTRO CIVIL
De acordo com o portal de transparência do Registro Civil, com base de dados dos cartórios de registros civis, março de 2021 foi o mês mais letal dos últimos seis anos, com total de 316 óbitos registrados pelos cartórios, sendo 125 mortes a mais do que a média para o mês desde 2015. 

Diante do avanço da pandemia e do elevado número de mortes, o primeiro trimestre registrou 781 mortes nos cartórios, o que representa aumento de 231 mortes se comparado com a média do mesmo período dos últimos seis anos.

O aumento de mortes por Covid-19 tem feito, nas últimas semanas, a curva de mortes superar a de nascimentos no mês de abril. Neste mês, em Santa Maria, são 112 nascimentos e 140 mortes, por todas as circunstâncias.

Em março, o Rio Grande do Sul teve mais mortes que nascimentos. Foram 11.971 nascimentos enquanto os óbitos chegaram a 15.802. O presidente da Associação dos Registradores de Pessoas Naturais do Rio Grande do Sul (Arpen/RS), Sidnei Hofer Birmann, afirma não lembrar de nos últimos 20 anos ter uma situação semelhante. Segundo ele, os cartórios de todo o Estado tem visto acréscimo significativo das mortes sobre os nascimentos.


***gráfico 1****

PRINCIPAIS MORTES EM SANTA MARIA

1º trimestre de 2021*

713 mortes registradas

  • Algumas doenças infecciosas e parasitárias (inclusive Covid) - 233 (32,6%)
  • Neoplasias (tumores) - 126 (17,6%)
  • Doenças do aparelho circulatório - 131 (18,3%)
  • Doenças do aparelho respiratório - 51 (7,1%)
  • Causas externas de morbidade e mortalidade - 26 (3,6%)
  • Outras doenças - 146 (20,4%)

****gráfico 2*****

De janeiro a dezembro de 2020

2.211 mortes registradas

  • Algumas doenças infecciosas e parasitárias (inclusive Covid) - 217 (9,8%)
  • Neoplasias (tumores) - 459 (20,7%)
  • Doenças do aparelho circulatório - 582 (26,3%)
  • Doenças do aparelho respiratório - 191 (8,6%)
  • Causas externas de morbidade e mortalidade - 164 (7,4%)
  • Outras doenças - 598 (27%)

***gráfico 3**** De janeiro a dezembro de 2019

2.147 mortes registradas

  • Algumas doenças infecciosas e parasitárias (sem covid) - 88 (4%)
  • Neoplasias (tumores) - 498 (23,1%)
  • Doenças do aparelho circulatório - 591 (27,5%)
  • Doenças do aparelho respiratório - 230  (10,7%)
  • Causas externas de morbidade e mortalidade - 179 (8,3%)
  • Outras doenças - 561 (26,1%)

****gráfico 4****

De janeiro a dezembro de 2018

2.103 mortes registradas 

  • Algumas doenças infecciosas e parasitárias (sem covid)  - 96 (4,5%)
  • Neoplasias (tumores) - 520 (24,7%)
  • Doenças do aparelho circulatório - 600 (28,5%)
  • Doenças do aparelho respiratório - 288 (13,6%)
  • Causas externas de morbidade e mortalidade - 150 (7,1%)
  • Outras doenças - 449 (21,3%)

* Dados do primeiro trimestre de 2021

** Em 2018 e 2019 não havia Covid

*** A primeira morte por Covid foi registrada em maio de 2020 em Santa Maria 


Causas de óbitos entre 2018 e 2020 ((tabela))

Algumas doenças infecciosas e parasitárias - 401

Neoplasias (tumores) - 1.477

Doenças do sangue e dos órgãos hematopoéticos e alguns transtornos imunitários - 18

Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas - 276

Transtornos mentais e comportamentais - 53

Doenças do sistema nervoso - 446

Doenças do ouvido e da apófise mastóide - 2

Doenças do aparelho circulatório - 1.773

Doenças do aparelho respiratório - 689

Doenças do aparelho digestivo - 279

Doença da pele e do tecido subcutâneo - 22

Doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo - 21

Doenças do aparelho geniturinário - 157

Gravidez parto e puérperio - 2

Algumas afecções originadas no período perinatal - 148

Malformação congênita, deformidades e anomalias cromossômicas - 26

Sintomas, sinais e achados anormais de exames clínicos e laboratórios - 56

Causas externas de morbidade e mortalidade (acidentes, suicídio, homicídio) - 493

(Fonte: prefeitura de Santa Maria)

(***(página2***************

Quase 40% dos funerais no primeiro trimestre foram de casos confirmados ou suspeitos de Covid

Na linha de frente para atender os casos de mortes, as funerárias de Santa Maria também sentiram os impactos da Covid-19. Quatro funerárias prestam o serviço em Santa Maria, e, conforme os registros de obituários disponibilizados pelas empresas em suas páginas, foram feitos 715 funerais na cidade neste primeiro trimestre, sendo que 37% deles eram casos de coronavírus ou suspeita de contaminação. Ano passado, conforme os registros do janeiro, fevereiro e março, foram 455 sepultamentos. O aumento de um ano para o outro é de 57%.

O Ministério da Saúde publicou o Guia para o Manejo de Corpos no Contexto do Novo Coronavírus com várias recomendações, dentre elas: velórios e funerais de pacientes confirmados ou suspeitos da doença não são recomendados; a cerimônia de sepultamento deve ocorrer em lugares ventilados e, de preferência, aberto; durante todo o velório o caixão deve permanecer fechado para evitar qualquer contato com o corpo.

O coronavírus mostra força desde janeiro, mas é em março que os números foram ainda mais tristes. Um levantamento feito pelo Diário aponta que nos 31 dias do mês passado, as funerárias de Santa Maria, juntas, fizeram 307 serviços fúnebres. Destes, 146 foram sem velório, o que representa 47% do total. Nas funerárias, o aumento é perceptível. Para o subgerente da funerária Cauzzo, Fábio Coelho Monteiro, a situação foi de aumento e tensão no mês de março: dos 46 serviços funerários na Cauzzo,a metade deles envolveu suspeita ou confirmação do vírus. Situação semelhante aconteceu na funerária São Martinho. Conforme o proprietário, Felipe Knackfuss, números altos assim normalmente são registrados no inverno. No mês passado, 49% dos serviços fúnebres foram por conta do coronavírus:

_ É comum nos primeiros meses do ano termos um número menor de óbitos, mas o que acontece neste ano é diferente. Estamos com taxas semelhantes a de julho e agosto, que normalmente tem crescimento no número de mortes.

Foram considerados os registros de obituários de santa-marienses que foram sepultados no município. Nos casos em que os obituários registraram "sem velório", conforme as funerárias, significa que a pessoa morreu por confirmação ou suspeita de Covid. São raros os casos de mortes não relacionadas à Covid que a família opta por não fazer esse ritual.

PROCEDIMENTO

Conforme o gerente administrativo e comercial da funerária São Martinho, Silvio Borges Cabral, o processo para o sepultamento de casos de Covid é ainda mais delicado, pois os familiares, assim que comunicados do falecimento, procuram as funerárias sem ter tido contato com o ente que perdeu a batalha para a coronavírus. A última despedida dessas famílias é feita, normalmente, direto no sepultamento, com a urna lacrada.

Ao ser acionada pelos hospitais, explica Silvio, a funerária vai até o local e recebe o corpo do paciente que morreu em decorrência da Covid em um saco plástico lacrado. Os agentes funerários colocam a pessoa na urna e, imediatamente, fecham o caixão. Dependendo do horário, o corpo já é encaminhado ao cemitério escolhido pelo familiar, onde uma pequena e restrita despedida com pouquíssimas pessoas acontece ali mesmo. 

As despedidas comoventes, sem velório e com a urna fechada também sensibilizam quem já está acostumado com estes rituais. Agentes funerários mudaram suas rotinas e adaptaram-se à nova realidade. Toda vez que acionados para atender uma morte por coronavírus, os trabalhadores se preparam com o equipamento de proteção completo, com máscaras, luvas, óculos e vestimenta adequada. A cada novo trabalho, o equipamento é desinfectado.

Junto aos familiares que acompanham o cortejo no cemitério, os agentes funerários Volmar Cassanego e Alciomar Trindade relatam as tristes despedidas, em que os rituais de despedida, culturais no país, precisaram ser abolidos em casos de coronavírus.

_ É difícil para a gente, ver aquela situação de muito sofrimento, sem ninguém ao menos poder se despedir como culturalmente estamos acostumados. Mas precisamos ser resistentes, porque naquele momento nós precisamos ser o que há de mais forte para aquelas famílias _ diz Trindade.

Registros de mortes nas funerárias 2021*

Janeiro - 226 mortes:

  • 66 Covid ou suspeita - 29%

Fevereiro - 182 mortes:

  • 51 Covid ou suspeita - 28%

Março - 307 mortes:

  • 146 Covid ou suspeita - 47%
  • Total de mortes nos três primeiros meses de 2021: 715 (263 Covid ou suspeita) - 37%

*São considerados casos confirmados e suspeitos de Covid-19
Fonte: obituários e dados das quatro funerárias que prestam o serviço no município


****página 3********
"Violetas na janela": a dor da perda e a busca do acolhimento

Mães, pais, irmãos, filhos, tios, avós, amigos. No Brasil, são mais de 353 mil vidas perdidas para a Covid. São pessoas que amaram e foram amadas e que fizeram a diferença na vida de alguém. A dor da perda de quem partiu dilacera o coração e abre um vazio no peito de quem fica. Para apaziguar a dor e a saudade, familiares de vítimas do coronavírus se apegaram a diferentes formas para seguir em frente, sem jamais esquecer.

Os funerais de vítimas de coronavírus são rápidos e com caixão fechado. Famílias não conseguem se despedir como culturalmente as pessoas estão acostumadas, tornando o luto um processo de ainda mais aflição As últimas lembranças variam. Algumas vítimas chegaram a ficar semanas internadas, saindo do hospital direto para o cemitério, outras conseguiram por meios remotos dar o último adeus. Para as famílias, não ter os rituais de passagem como o velório tornam o momento ainda mais doloroso.

Há nove meses, a família de Leonardo Comoretto convive com a dor e o luto. No dia 27 de março, o jovem faria 15 anos. O tempo ainda não foi capaz de amenizar a dor de Elisandro Comoretto e Daniela de Fortini por perder o filho. Leonardo, que tinha imunodeficiência e doença pulmonar crônica, chegou a ficar internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital de Caridade Dr. Astrogildo de Azevedo. No dia 18 de agosto de 2020, o gremista fanático não resistiu ao coronavírus. Naquele mesmo dia, foi sepultado, sem velório, no Cemitério Ecumênico.

Hoje, as paredes do quarto de Léo, como carinhosamente era chamado pela família, já foram pintadas, e as roupas e os brinquedos doados.Um pequeno memorial foi montado na sala, com fotos, o urso preferido e alguns carrinhos da antiga coleção do adolescente. Outra lembrança constante são os cuidados com Kiara, uma cachorra da raça pastora maremano, xodó da casa. O pai e o irmão eternizaram no braço o nome de Leonardo. A mãe, apegou-se na fé na tentativa de encontrar o conforto espiritual, e mantém tratamento psiquiátrico. O livro "Violetas na Janela" está sempre próximo e é lembrado por Daniela, afirma, como uma forma de encontrar aconchego, luz e um pouco menos de sofrimento, já que o romance espírita trata justamente sobre a morte a continuidade da vida em outro plano.

A dor da perda, inevitavelmente, ainda arranca lágrimas da família mesmo que todos tentem buscar uma maneira de elaborar o luto. No trabalho ou quando alguma memória vem forte, Elisandro às vezes precisa parar:

_ Por vezes é uma música, uma lembrança. Olho pro lado e ele não está. Então não tem como segurar. Perdi meu amigo, meu filho. O pai perder um filho não é certo, é uma dor muito grande. Eu tento ser forte, para dar suporte, mas ainda é muito difícil.

Os últimos contatos da família com o menino foram no dia da internação no hospital e antes da transferência para a UTI. Somente um rápido acesso foi possível na hora do último adeus. Da UTI, o menino que sonhava em ser policial foi levado direto para o sepultamento. A família não pôde abraçá-lo ou lançar um último olhar para Léo.

_ Um pedaço de mim foi arrancado. Não ter ele em casa é uma dor terrível. Tento me apegar a fé e compreender que ele está em um lugar melhor. Mas a vida agora está mais triste _ conta Daniela.

Vidas de superações interrompidas pela Covid-19

Sozinha. É assim que se sente a aposentada Inês Maria Stangherlin, 71 anos, após perder o único filho para a Covid-19. Diogo Stangherlin tinha 35 anos quando precisou ser atendido na UPA. No dia seguinte, já no Hospital Regional, o licenciado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) morreu. Diogo tinha doença neurodegenerativa e cardíaca. 

Na tentativa de superar a dor, Dona Maneca, como é conhecida entre familiares e amigos, procura manter o jardim da residência sempre organizado. Mexer na terra é uma distração para manter-se firme nos dias mais pesados. Lembrar das superações do filho ao longo da vida a enchem de orgulho. E não é pra menos. Diogo tinha Ataxia de Friedreich, uma doença neurodegenerativa e, por conta disso, precisava de cadeira de rodas. Mesmo com todas as dificuldades, formou-se em 2015, já sem a presença do pai, falecido em 2011. Com o avanço da doença, perdeu a visão, mas, segundo a mãe, nunca perdeu o brilho, o carisma e a vontade de viver.

_ Eu estou sozinha, perdi meu filho. A pessoa que sempre esteve comigo, que eu amava acima de tudo. Hoje vivo sozinha só com as lembranças da pessoa amada, alegre, sensível e educada que ele foi. Dói tanto que é difícil definir.

Assim como a maioria das vítimas da Covid-19, não houve velório. O corpo de Diogo foi cremado, e, conforme Dona Maneca, as cinzas estão junto as do pai. 

DOR

No domingo do dia 21 de março, Elaine Flores Dias, 65 anos, sentiu falta de ar. A família recorreu à Unidade de Pronto Atendimento (UPA). No dia seguinte, com diagnóstico positivo para o coronavírus, ela foi para a ala Covid da instituição. Dois dias depois, o filho Ricardo Helvin Jahnke, 38 anos, levou um celular à mãe para que pudessem se comunicar com mais facilidade. Na sexta-feira, dia 26, Elaine ligou para o filho, pedindo algumas frutas, que prontamente foram levadas à UPA. Por a paciente estar em um espaço restrito, não houve comunicação física. Aquela sexta foi a última vez que mãe e filho se falaram.

No sábado, Elaine piorou e precisou ser intubada, sendo transferida no dia seguinte para um leito de UTI em Rosário do Sul. Na segunda-feira, dia 29, após sucessivas paradas cardíacas, a aposentada foi a óbito, sendo sepultada em São Pedro do Sul no dia 30 de março. Aos familiares restou a dor e a saudade da mulher alegre e carinhosa.

_ Nós deixamos minha mãe na UPA e buscamos ela dentro de um caixão em um hospital de Rosário do Sul. Não nos despedimos como ela queria, não vimos mais ela. É uma dor muito grande. Vão ficar as memórias e boas lembranças, mas neste momento é difícil.



*****página 4**************

A elaboração do luto das famílias que perderam alguém para a Covid-19


Em 1917, o pai da psicanalise Sigmund Freud trouxe no livro "Luto e Melancolia" que o luto é um processo lento e doloroso. As características passam por tristeza profunda, afastamento de toda e qualquer atividade que não esteja ligada a pensamentos do que foi perdido, perda de interesse no mundo externo, entre outras definições. Especialistas não conseguem estipular em quanto tempo o luto é superado, já que ele ocorre de forma diferente para cada pessoa. O que se sabe, é que este processo dura meses. Não cumprir com os rituais estabelecidos na sociedade, como o velório, torna este processamento ainda mais complicado.

O psiquiatra Vitor Crestani Calegaro foi um dos primeiros a atuar no ambulatório de psiquiatria do Centro Integrado de Atendimento às Vítimas de Acidentes (Ciava), criado em função da tragédia da Boate Kiss. O profissional também lidera uma pesquisa nacional sobre saúde mental na pandemia. Para o psiquiatra, os rituais de passagem na nossa cultura, como velório, enterro e missa de 7º dia fazem com que a pessoa compreenda melhor a morte. Ao não ver o ente querido, como nos casos de enterros de Covid, o processo de luto se torna ainda mais difícil.

Segundo Calegaro, o luto faz parte da nossa existência, mas como não falamos com naturalidade desta realidade acabamos por não ter um bom preparado para enfrentar a morte, ainda mais de uma pessoa amada. Um processo de luto, explica, pode passar por várias fases, como revolta, negação - intensificada ainda mais nos casos de Covid por não ver a pessoa -, até a aceitação e estabilidade emocional, assumindo que o ente morreu e que ficam as boas memórias.

_ Vivenciar a tristeza da morte é algo que ajuda neste processo de luto, já que ele faz parte da nossa existência. 

Buscar outros rituais para superar o luto, como rezas, lembranças e homenagens, podem ajudar a superar a dor, explica Calegaro, apesar de não ser a mesma coisa. Casos em que luto toma proporções que geram prejuízos, como evoluir para um quadro depressivo, devem receber atenção de profissional, destaca o psiquiatra. 

O psicanalista Volnei Dassoler, coordenador do Santa Maria Acolhe - criado em 2013 para atender as vítimas diretas e indiretas do incêndio na Boate Kiss -, também cita as redes sociais como uma forma de expressar os sentimentos neste momento em que não pode haver contatos físicos, já que as plataformas são maneiras de compartilhar memórias, manifestar a dor e de receber acolhimento.

Assim como Calegaro, Dassoler ressalta que todas as culturas estabelecem estratégias simbólicas e ritos de despedidas. O velório, explica, é entendido como um momento de acolhida entre familiares e amigos, sendo um espaço de homenagem e despedida para quem partiu. A impossibilidade destes atos impactam na elaboração do luto, ressalva, dando a sensação de que o ciclo ainda não está encerrado:

_ No mínimo, não ter estes ritos estabelecidos na sociedade, causa um sofrimento ainda maior. Então o tempo é um fator importante para elaborar o luto. Entende-se que nestes casos, devido à pandemia, é impossível ter velório, mas ainda assim essa ausência dificulta ainda mais o processo.

Outra maneira, diz Dassoler, que muitas pessoas encontram para aliviar o sofrimento é indo aos cemitérios. Para ele, as pessoas não terem este acesso, mesmo em um espaço aberto e de pouca aglomeração, gera uma angústia ainda maior às famílias.

Durante a pandemia, as visitas aos cemitérios administrados pelo município eram agendadas. No entanto, afirma a prefeitura por meio de nota, as visitas estão suspensas enquanto vigorar a bandeira preta no modelo de distanciamento controlado do governo do Estado. O agendamento, diz o Executivo, voltará a ser realizado quando a região de Santa Maria for classificada em outra bandeira que não a preta.








SÃO MARTINHO

Janeiro - 60 óbitos (22 Covid) - 37%

Fevereiro - 47 óbitos (15 Covid) - 32%

Março - 100 óbitos (49 Covid) - 49%

2020

Janeiro - 48

fevereiro - 37

março - 50

Total 135

Aumento de 50%


ANGELUS BRUM

2021

Janeiro - 41 óbitos (10 Covid) - 24%

Fevereiro - 25 óbitos (7 Covid) - 28%

Março - 43 óbitos (16 Covid) - 33%

2020

Janeiro - 29

Fevereiro - 28

Março - 24

Total 81

Aumento de 45%


IPIRANGA

Janeiro - 96 óbitos (29 Covid) - 30%

Fevereiro - 88 óbitos (24 Covid) - 27%

Março - 119 óbitos (58 Covid) - 48%

2020

janeiro - 76

fevereiro - 59

março - 57

Total 192

Aumento de 53%


CAUZZO

Janeiro - 29 morte (5 Covid) - 17%

Fevereiro - 22 mortes (5 covid) - 22%

Março - 46 mortes (23 covid) - 50%

2020

janeiro - 29

fevreiro - 11

março - 7

Total 47

Aumento de 85%



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