Férias são períodos que reservamos para fazer o que realmente gostamos. Sempre que posso, uso esses períodos para viajar, pois acredito que, além de conhecer novos lugares, pessoas e culturas, favorece uma jornada para dentro de mim mesma. Não pensem ser fácil fugir de velhos hábitos, a cada momento me pego pensando na minha vida cheia de compromissos e prazos. As primeiras 24 horas são de constantes exercícios para conseguir desligar.
No entanto, conforme as novidades vão surgindo, minha mente estabelece novas prioridades. Não é apenas meu corpo que viaja, minha mente voa, imaginando a origem dos lugares, como tudo começou, como as cidades foram fundadas, como as pessoas vivem, como estão enfrentando a pandemia. A vida nos mostra que os lugares estão cheios de histórias extraordinárias com as quais podemos aprender.
Meu destino, uma cidade ao pé da Cordilheira dos Andes, à beira do Lago Lácar, com construções no estilo andino, com paisagem e clima muito parecidos com algumas cidades europeias no inverno. Um lugarejo com arquitetura que lembra um pouco o cenário dos contos de fadas (muito a minha cara), rodeado de lagos com barcos nas margens, montanhas com picos nevados, vulcões e casas de madeira e pedras.
San Martin de Los Andes foi fundada em 4 de fevereiro de 1898 pelo coronel Celestino Pérez, a partir de um acordo entre o general Roca e o cacique Curruhinca, sobre o território da comunidade indígena Mapuche (gente da terra). O vale era usado pelos aborígines para se abrigarem dos invernos rigorosos. A economia do lugar baseava-se em moinhos de madeira e farinha, além da pecuária, até a abertura do Parque Nacional Lanín, em 1937, que mudou substancialmente a vida da população. A partir deste fato, a derrubada de árvores ficou restrita, e novos canais de comunicação, com outras áreas do país, começaram a ser abertos. O turismo começou a ser fortemente promovido, com a abertura de novas estradas, com vistas atraentes e naturais, que tem o Cerro Chapelco como uma das principais atrações, para quem gosta de esquiar.
A influência indígena é forte e faz parte das histórias do povoado, reencarnações, mitos e lendas são transmitidas às novas gerações, com a intenção de esclarecer o passado, compreender melhor o presente e projetar seu legado até o futuro. Assim como no Brasil, os povos indígenas dos Andes são os mais vulneráveis às viroses, especialmente as infecções respiratórias como a Covid-19. A pandemia teve um impacto devastador no povo Mapuche. Além de terem que pedir ajuda ao governo para proteger os seus territórios dos que não fazem parte das suas comunidades, já que podem ser portadores do vírus, ficaram quase sem recursos para sobrevivência. Segundo a emissora internacional da Alemanha Deutsche Welle: “Não são apenas vidas que se perdem, são memórias, lideranças com um histórico de luta pelos direitos de seus povos e de sua existência.”
A aldeia serrana é encantadora, não só pela natureza em toda sua exuberância, mas pela arquitetura com características rigorosamente preservadas, sob um plano urbanístico que limita seu crescimento desordenado e convive de forma harmônica com a paisagem, tornando-a única. Apesar da beleza ímpar, as dificuldades trazidas pela pandemia são as mesmas de qualquer parte do mundo, e isso nos une, torna-nos irmãos na busca de um só objetivo, a luta para superar a doença e, principalmente, as suas consequências, que se estenderam por gerações.
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