Renan Mattos
De acordo com dados da Delegacia Regional da Polícia Civil de Santa Maria, foram registrados 124 estupros no município em 2022. O número indica que a cada três dias pelo menos uma pessoa foi vítima do crime na cidade.
Ao todo foram 32 mulheres e 95 pessoas vulneráveis, ou seja, com menos de 14 anos e/ou pessoas adultas incapazes de consentir. Além disso, aconteceram cinco tentativas de violência sexual.
Apesar do grande número de ocorrências, o cenário demonstra uma redução em comparação a 2021. Nesse período foram 161 casos e 11 tentativas. Destes 41 eram mulheres e 120 vulneráveis. Portanto, em comparação, 2022 apresentou uma diminuição de 22% nas denúncias.
— Aqui em Santa Maria, após a pandemia tivemos uma redução dos números. Na medida em que a vida volta a normalidade, as mulheres vão para o trabalho, as crianças para a escola e a vida social é retomada as ocorrências de violência sexual diminuem. No entanto, a subnotificação sempre é possível e a gente não tem como mensurar — relata o delegado regional Sandro Meinerz.
A advogada criminalista e atuante no Direito Médico, Jéssica Celestino, relata que durante a pandemia foi perceptível o aumento de denúncias de violência física e sexual contra mulheres. Contudo, para ela a queda dos números em 2022 não necessariamente reflete a quantidade de estupros na prática:
— Na maioria das vezes o estupro é praticado dentro do ambiente familiar, por isso muitas vítimas sentem vergonha ou são desencorajadas a denunciar. Portanto, o número de denúncias ter diminuído não significa necessariamente que o número de casos diminuiu.
Crime hediondo
De acordo com a Lei nº 12.015, de 2009 do Código Penal Brasileiro, estupro é definido como “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”.
A pena média é de seis a dez anos de prisão, caso a vítima seja menor de 18 anos pode ir até 12 anos e se a conduta resultar em morte o criminoso pode ter até 30 anos de reclusão.
O estupro é considerado crime hediondo, independente da forma que ocorra sua prática, seja simples ou de vulnerável. Desse modo é inafiançável e não suscetível de graça, indulto ou anistia, além de não ser possível a concessão da liberdade provisória.
— Na grande maioria das vezes o autor do crime é condenado. A palavra da vítima de violência sexual tem um valor muito grande no judiciário. No entanto, em caso de dúvida e na falta de provas o juiz pode absolver o suspeito. Nesses casos é possível pedir uma medida de proteção para crianças e uma medida protetiva para mulheres — explica Jéssica.
O delegado ressalta que é muito importante realizar o exame de corpo de delito para identificar os vestígios materiais deixados que indicam a existência do crime e recolher as provas.
— Se for coletado, do corpo da vítima, material genético do abusador, o exame de DNA nos permite identificar o criminoso. Isso pode ser definitivo para responsabilizar criminalmente o autor. Além disso, existe o risco de contrair também doenças sexualmente transmissíveis com o estupro e essa profilaxia precisa ser feita o quanto antes. Então não é importante só para a questão probatória e policial, mas também para a saúde — destaca Sandro.
Importância da denúncia
O delegado destaca que uma denúncia rápida é a melhor medida. Assim, é possível proporcionar acolhimento e proteção, como a retirada imediata da vítima do convívio com o agressor e iniciar o processo de investigação:
— Se a vítima não denuncia de forma direta, toda pessoa que tem conhecimento de um crime dessa natureza deve denunciar, principalmente nos casos de estupros de vulneráveis. É possível fazer uma denúncia anônima na qual a gente vai averiguar e isso já nos permite tomar providências.
Conforme pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os motivos pelos quais as vítimas não denunciam as agressões sofridas às autoridades policiais são diversos, passando desde a dificuldade de compreensão do próprio fenômeno enquanto crime, medo de retaliação do autor, constrangimento e até receio de relembrar o trauma ao denunciar.
— O ambiente das delegacias pode muitas vezes promover uma revitimização e as vítimas serem descredibilizadas. Na minha experiência eu vejo que quando uma pessoa vai na delegacia sozinha ela é tratada de uma forma e quando ela vai com advogado ela é tratada de outra maneira. Isso é uma realidade, principalmente quando as vítimas são mulheres, por isso a Polícia Civil ainda precisa de treinamentos para tratar das questões de gênero — afirma Jéssica.
Para Sandro o crime é uma questão cultural e social, por isso é necessário investir em políticas educativas para aumentar as denúncias. Ele explica que em relação ao estupro de vulneráveis a escola é uma aliada e a convivência escolar e social é uma estrutura de proteção, pois lá é mais difícil do agressor controlar as conversas da vítima, por isso as crianças precisam saber identificar abusos:
— Esse assunto tem que ser tratado nas escolas para que a gente comece a educar as crianças o quanto antes sobre isso. A gente também precisa de uma rede de proteção e acolhimento para as vítimas dessa violência. As mulheres precisam se sentir fortalecidas, acolhidas e protegidas para denunciarem.
Canais de Denúncia
O delegado aconselha priorizar os órgãos locais ao fazer a denúncia, desse modo o caso pode começar a ser investigado o mais rápido possível. Confira os canais de denúncia:
Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) – (55) 3222-9646
Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) – (55) 3221-0450
Polícia Civil – 197
Disque-Denúncia – 181
Direitos Humanos – 100
Brigada Militar – 190
Ministério Público – (55) 3222-9049
Defensoria Pública – (55) 3218- 1032