"Não quero ser comparado com os ministros de hoje. Não quero falar mal dos remanescentes, mas prefiro o meu tempo."
A frase dita pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), o santa-mariense Eros Grau, em sua palestra na sexta-feira, no Itaimbé Palace Hotel, resume a desilusão dos brasileiros, inclusive de expoentes do mundo jurídico, diante da descrença que tomou conta das instituições do país, da qual não escapa nem mesmo a Suprema Corte.
Eros participou do ciclo de palestras Jus Reconhecimento: O Direito nas suas diversas esferas, promovido pelo Diário, com o patrocínio da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma) e apoio da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Faculdade Palotina (Fapas).
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O evento reuniu nomes reconhecidos da área jurídica durante a tarde e o início da noite de sexta-feira em homenagem a Eros.
Esbanjando empatia e humor, Eros, 76 anos, abordou o tema Direito ou Justiça? Lex ou Jus?
Em exposição filosófica, em que mesclou literatura e história, ele foi taxativo na afirmação que a "Justiça, no nosso tempo, é pura utopia, só existe no paraíso, porque os homens são incapazes de produzir justiça".
O que existe, segundo ele, é a aplicação das leis, que são transformadas em normas a partir do momento em que são criadas pelos legisladores (vereadores, deputados e senadores).
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Essas normas, por sua vez, resultam da interpretação da legislação, transformada em ordenamento jurídico. Eros lembrou que, para tomar uma decisão, o magistrado precisa ter compreensão da realidade.
Ele exemplificou sobre como uma mesma lei pode ser intepretada em épocas distintas:
– Imaginem uma mulher na praia, no ano de 1943, de maiô.
Seria ou não incomodada pelo juiz ou pelo delegado? O Código Penal de hoje é o mesmo daquela época, mas a norma é outra.
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LEI DA ANISTIA
Ao ser indagado sobre os casos mais importantes que julgou em sua carreira, Eros citou a Lei da Anistia, de 1979, que perdoou atos cometidos durante o regime militar (1964-1985) por pessoas contrárias e favoráveis à ditadura.
Em abril de 2010, ao julgar ação ajuizada pelo Conselho Federal da OAB, que contestava "a anistia geral e irrestrita", o então ministro afirmou que não cabia ao Poder Judiciário rever o acordo político, que, na transição para a democracia, resultou na anistia de todos os que cometeram crimes políticos no Brasil entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
Havia a intenção de adversários do regime militar de revogar a parte de lei que perdoou atos de tortura cometidos por agentes do Estado em nome dos governos militares.
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Em seu julgamento, Eros disse que a tarefa de revisar a lei caberia ao Poder Legislativo (Congresso Nacional) e não ao STF, ressaltando que legislar não é papel da Suprema Corte.
Ele disse, ainda, à época, que sua decisão de negar o pedido da OAB não excluída seu repúdio a todas as modalidades de tortura, independentemente de sua origem.
Ao relembrar esse momento da carreira, Eros contou que sua posição foi mal vista por alguns amigos e conhecidos que militavam no campo da esquerda e que pleiteavam a mudança na lei para punir militares.
INFÂNCIA
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Ainda na palestra, o advogado santa-mariense Walter Jobim Neto, irmão do também ministro aposentado Nelson Jobim, lembrou da época em que o STF "teve dois ministros da mesma cidade, do mesmo bairro, da mesma rua e da mesma quadra", em uma referência à Rua Ipiranga (atual Avenida Presidente Vargas).
Foi lá que Eros viveu parte da infância. Eros deixou a cidade natal aos três anos de idade.
Formado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e com doutorado pela Universidade de São Paulo (USP), foi ministro do STF de 2004 a 2010.
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Atualmente, dedica-se a ler e a escrever livros, e vive em três cidades, onde tem residência: São Paulo, Tiradentes (MG) e em Paris, capital francesa.