Após recuo na proposta de aumento do ICMS, Leite investe em corte de benefícios fiscais a 64 setores produtivos

Bibiana Pinheiro e Laura Gomes

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Com o recuo da proposta de aumento da alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), agora, a aposta do governador Eduardo Leite (PSDB) é cortar os benefícios fiscais concedidos às empresas do Estado. Apesar da mudança de estratégia, a justificativa segue a mesma: garantir receitas para o Rio Grande do Sul nos próximos anos. A revisão dos incentivos vai impactar 64 setores produtivos, além de também gerar aumento no custo dos itens da cesta básica.

A decisão de investir em um plano B foi confirmada na noite da última segunda-feira (18), após Leite anunciar que desistiu da proposta de reajuste do ICMS de 17% para 19,5%, em vídeo divulgado à imprensa. O projeto seria votado nesta terça-feira (19). Mas, sem apoio na Assembleia Legislativa e diante da pressão de vários setores da sociedade, o governador anunciou a retirada do projeto da pauta da Assembleia. 

As mudanças nos incentivos fiscais foram publicadas ainda no sábado (16), em edição extra do Diário Oficial (DOE), como alternativa caso o ICMS não fosse aprovado. As novas medidas valem a partir de janeiro e abril de 2024.

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Para o professor e economista, Mateus Frozza, se o foco é gerar receita, a estratégia do governo de aumentar impostos está errada:

– Poderia gerar receita cobrando as apostas online, por meio do refinanciamento das dívidas. Esse plano B do governador impacta diretamente as famílias de menor poder aquisitivo, por atingir os itens da cesta básica. Tem um item específico que me chama atenção, os ovos (rico em proteína). Hoje, uma dúzia custa entre R$ 5,00 e R$ 5,50. Com a retirada do subsídio, poderá custar R$ 9.

No material divulgado à imprensa, o governador destaca que as mudanças têm como objetivo remediar problemas futuros na arrecadação do Estado. Ainda segundo Leite, a Reforma Tributária traria impactos para as receitas gaúchas nos próximos anos:

– Em função das perdas de arrecadação que tivemos do ano para cá, impostas pela União, depois de uma sequência de redução de impostos que fizemos, precisávamos fazer um ajuste na alíquota modal para poder garantir a receita necessária para o Estado pagar os serviços que presta à sociedade. Isso também em função de um contexto de muita insegurança jurídica gerada pela Reforma Tributária.

A Reforma Tributária altera a forma de recolher os impostos, prevendo uma reorganização na distribuição dos valores para os Estados e cidades. O texto, antes da aprovação na última sexta-feira (15), indicava que a repartição do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), levaria em conta, por 50 anos, a proporção da arrecadação de ICMS de cada Estado entre 2024 e 2028.

Repercussão

Confira o que disseram autoridades políticas e entidades empresariais:

“Ao longo destes 30 dias, o debate foi feito e chegamos às vésperas da votação na Assembleia Legislativa com a manifestação de muitos parlamentares não desejando avançar com essa proposta. Respeitamos essa percepção e, portanto, encaminhamos a retirada da proposta à AL. Vamos dar sequência ao plano alternativo para garantir as receitas do Estado, que são importantes para manter os serviços da sociedade e atender as demandas que vêm, inclusive, das entidades empresariais, que se contrapõem ao aumento do ICMS, mas que também demandam a esse mesmo governo: estradas, segurança, atendimento, qualificação profissional e educação, necessárias ao desenvolvimento do Estado. Para poder garantir um governo com equilíbrio, capacidade de financiar os serviços públicos e prestigiar os servidores, vamos dar sequência ao plano alternativo”.

Eduardo Leite (PSDB), governador do RS

“A forma como o governo apresentou a proposta (de aumento do ICMS) foi autoritária, arrogante e prepotente, porque não discutiu com ninguém. O governador recuou porque percebeu de última hora que não seria aprovada a proposta. No meu ponto de vista, esse tema está completamente fora de contexto. Em um momento em que a economia começa a se restabelecer e reagir, vem o governo do Estado e apresenta uma proposta de aumento (do ICMS), que implica na produção, na geração de emprego, na cesta básica, todo mundo ia pagar esse preço. Logicamente, o setor empresarial e a sociedade em geral vieram para cima e pressionaram os deputados. Essa foi uma derrota do governador e uma vitória da sociedade. Como uma forma de chantagem, ele encaminha o projeto e diz ‘se não votarem, vou fazer o plano B’. Isso piora (a situação) e tensiona ainda mais a base dele. O governador precisa compreender que, antes de fazer discurso para diminuição do Estado, tem que apresentar proposta de desenvolvimento econômico”.

Valdeci Oliveira (PT), deputado de oposição ao governo

“ O governador não conseguiu (aumentar o ICMS), mas isso vai acontecer de uma forma ou de outra. Com o Plano B, o que irá acontecer naturalmente é um produto mais caro, porque o empresário é um repassador. Acho que todos nós vamos ser impactados, e isso é ruim. Ruim para uma economia que está em recuperação. A gente vem de pandemia, problemas de enchentes, estiagem há tempos. Então, não vejo com bons olhos, não tem como ver com bons olhos aumentar o imposto”. 

Andrei de Lacerda Nunes, presidente da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Santa Maria (Cacism)

“Recebemos muito bem a notícia de que o governador do Estado retirou a sua proposta de aumento do ICMS de 17 para 19,5%, que seria votada pelos deputados estaduais na Assembleia Legislativa. Mas entendemos que vai haver alterações. Entendemos que haverá reflexos em todos os setores do Rio Grande do Sul. É algo complexo, você determinar incentivos para uma parcela limitada da economia, ainda que alguns incentivos são importantes até para tornar certos segmentos da nossa economia mais competitivos perante a concorrência com outros Estados. Entendemos que os incentivos devem ser muito bem refletidos, mas não concordamos com a forma que o governador encontrou de retirar esses incentivos fiscais como uma forma de chantagear a Assembleia Legislativa. Foi um ‘canetaço’, sem diálogo com a sociedade, setores econômicos afetados e entidades representativas do setor produtivo gaúcho. Discordamos frontalmente da decisão do governador e, certamente, isso irá impactar o bolso dos trabalhadores e de toda a sociedade gaúcha no ano de 2024”. 

Marcio Rabelo, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Santa Maria (CDL)

"Durante a aprovação da Reforma Tributária pela Câmara dos Deputados, foi excluído o trecho que definia que a arrecadação de ICMS entre 2024 e 2028 seria parâmetro de distribuição das compensações de receitas com a criação do IBS, que será o novo tributo. Foi algo que nós buscamos, inclusive, e que derruba um dos principais argumentos do governo do Estado para aumentar a carga tributária, agora. O chamado plano B ao aumento da alíquota, do Governo do Estado, contudo, também pode ser uma ameaça. Ele prevê a retirada gradual de 40% dos incentivos fiscais de 64 setores e a ampliação do ICMS sobre os itens da cesta básica para 12%, uma vez que atualmente são isentos ou pagam 7% de tributo. A Fecomércio-RS é contrária à proposta e manterá o acompanhamento com a intenção de impedir prejuízos aos contribuintes",

 Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS) 

Foto: Nathália Schneider (Diário)

O plano B

O plano B foi apresentado pelo governo do Rio Grande do Sul e tem como base revisar os benefícios fiscais. As mudanças são divididas em três pontos:

Corte nos benefícios fiscais de 64 setores

O plano indica o corte gradual de 10% a 40% dos incentivos fiscais (isenção ou redução de base de cálculo do ICMS imediata) concedidos a 64 setores (veja a seguir). Segundo o governo, esse montante deverá ser depositado em um fundo estadual e poderá gerar uma recuperação de R$ 433 milhões a R$ 1,7 bilhão por ano nas receitas do Estado.

  • Insumos agropecuários
  • Máquinas e equipamentos
  • Produtos primários
  • Fertilizantes
  • Veículos
  • Varejo
  • Ração animal
  • Arroz
  • Produção primária
  • Aves
  • Suínos
  • Alimentos
  • Medicamentos
  • Outros serviços
  • Material de construção
  • Transporte de cargas
  • Metalurgia
  • Tratores
  • Defensivos agrícolas
  • Óleos vegetais
  • Lojas departamento e magazines
  • Bovinos
  • Outras indústrias
  • Atacados
  • Outros agro
  • Eletroeletrônico
  • Bares e restaurantes
  • Floriculturas e petshops
  • Têxtil
  • Artefatos domésticos e ferramentas
  • Combustíveis e derivados
  • Outros metal mecânico
  • Tabacos
  • Peças e acessórios para veículos
  • Trigo
  • Super e hipermercados
  • Plásticos
  • Leite
  • Vestuário
  • Cimento
  • Embalagens
  • Produtos de limpeza
  • Madeiras
  • Calçados e artefatos
  • Outros químicos
  • Pneumáticos e borracha
  • Petroquímicos
  • Móveis
  • Vinho
  • Cosméticos
  • Biodiesel
  • Resíduos e sucatas
  • Curtimento de couro
  • Produtos odonto-hospitalares
  • Tintas e solventes
  • Comunicações
  • Outras bebidas
  • Cerveja e chopp
  • Outros transportes
  • Outros produtos de papel
  • Vidro
  • Energia elétrica
  • Refrigerante
  • Chá e mate

Ampliação do Fator de Ajuste de Fruição (FAF)

A política de fruição condicionada de incentivos fiscais prevê que parte dos créditos presumidos (descontos em impostos) seja concedida às empresas, de acordo com o comportamento de compra de cada estabelecimento, pontuando mais aqueles que fizerem mais aquisições no Estado.

Atualmente, as empresas têm 85% desse incentivo garantido e podem ter até mais 15% se adquirirem matérias-primas no próprio Estado. Com a mudança, só receberão os descontos as empresas que comprovarem que 100% dos insumos forem compradas no RS. Com a alteração nos índices, o governo indica que será possível fazer uma recomposição anual de R$ 382 milhões a R$ 607 milhões nas receitas gaúchas.

Veja os setores que terão ampliação do FAF:

Agropecuária

  • Arroz
  • Aves
  • Bovinos
  • Leite
  • Óleos vegetais
  • Suínos
  • Trigo
  • Outros agro

Alimentos e bebidas

  • Alimentos
  • Cerveja e chopp
  • Vinho
  • Outras bebidas

Combustíveis

  • Biodiesel

Coureiro-calçadista

  • Calçados e artefatos

Eletroeletrônico

Energia elétrica

Insumos agropecuários

  • Fertilizantes
  • Ração animal

Madeira, cimento e vidro

  • Madeiras

Metal mecânico

  • Embalagens
  • Máquinas e equipamentos
  • Veículos

Móveis

Outras indústrias

Papel

  • Embalagens
  • Outros produtos de papel

Plástico

  • Embalagens
  • Plásticos

Extinções e reduções de benefícios da cesta básica de alimentos

O plano também estabelece a extinção das isenções e reduções dos benefícios fiscais concedidos à cesta básica de alimentos. Atualmente, a alíquota varia de 0% a 7%. Com a mudança, a alíquota passa a ser de 12% para 10 itens da cesta (confira a seguir). De acordo com o governo, com essa mudança, o potencial de recomposição das receitas será de R$ 1,3 bilhão por ano.

  • Frutas
  • Verduras
  • Ovos
  • Carnes de aves
  • Suínos
  • Erva mate
  • Leite
  • Pão francês
  • Óleo degomado
  • Embalagens

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