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VÍDEO: os desafios e as mudanças que o isolamento impõe a todos nós

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data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos

A primeira morte por coronavírus foi relatada na China em 11 de janeiro de 2020. Já são mais de 5 milhões de infectados em todo o mundo, com centenas de milhares de mortes.

Ainda sem uma cura conhecida, essa pandemia tem mudado realidades. Em meio a dúvidas quanto a sintomas, cura e soluções, só o que se sabe, até agora, é que não basta ter um bom plano de saúde. A urgente e principal recomendação é fazer de tudo para não pegar a doença.

E, para diminuir riscos, foi necessário mudar hábitos, até os mais simples, como ir menos ao mercado e evitar se reunir com amigos e familiares. Hoje, já se considera a flexibilização, mas, por mais de dois meses, além do uso da máscara e do álcool gel, a principal recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) foi o isolamento, ou distanciamento social, para quem não ficou totalmente sozinho. 

Ou seja, junto à economia, à educação e ao sistema de saúde mundial, a liberdade de ir e vir e de estar perto uns dos outros foi afetada pela Covid-19. No entanto, o "ficar em casa" significou autocuidado e empatia. O inimigo é um só: o vírus, mas a batalha é de todos. 

Nesta reportagem, o Diário conta a experiência de algumas pessoas que, tendo condições, fizeram o distanciamento social. Que desafios e aprendizados elas tiveram? Confira, também, a opinião de especialistas sobre o aspecto emocional envolvido.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">"A vida é cheia de desafios. Devemos resistir e acreditar", conclui Jorge

Aos 60 anos, o procurador federal da Advocacia Geral da União (AGU) Jorge Adaime Filho já poderia ter se aposentado. No entanto, preferiu continuar trabalhando por não gostar de ficar isolado. Hipertenso e diabético, ambas situações sob controle, é da sala do apartamento, onde mora sozinho, que ele administra o home office. Para compras na farmácia e no mercado, ele conta com os filhos. Otimista quanto ao fim da pandemia, ele se assegura na fé em Deus para vencer essa experiência:

- É ruim ficar sozinho, mas é necessário por mim e pelos outros. Esperamos pela vacina. Lembro de quando a varíola assustava o mundo, eu ainda era criança. Varíola ainda mata? Sim. No entanto, é controlada com vacina. Sou esperançoso. Deus está no controle. Vai passar.

Das poucas vezes em que Jorge precisou sair de casa em dois meses, uma delas foi para um procedimento médico de urgência, em Porto Alegre. Ele, que sempre gostou passear e de estar entre amigos, acredita que fez a sua parte.

- Medito nas Escrituras Sagradas e acompanho as notícias na companhia do meu mate. O que aprendi? Que a vida é cheia de adversidades. Devemos resistir a elas e acreditar no que vem depois.


"Por mim, por nós, Por quem não pode ficar em casa"

Ser professora do filho, comemorar o aniversário sem os amigos, ficar longe do escritório e abrir mão de uma rotina que envolvia sair praticamente três turnos por dia estão entre os desafios da advogada Daniela Almeida de Mello, 43 anos. Ela defende que o isolamento social, para quem pode fazer, é questão de responsabilidade individual e coletiva. Junto ao marido, o professor Lúcio Dornelles Ramos, 48, e do filho Pedro Henrique, 7, Daniela está "em casa", antes mesmo de as aulas serem canceladas. A partir das primeiras notícias com números, estágios e sintomas da pandemia, ela organizou o expediente e não "colocou mais o nariz para fora", como diz:

- Lembro que era uma segunda-feira, 17 de março, quando decidimos por parar. Como advogada, consigo trabalhar em casa. E, se posso, por que ser mais uma pessoa a não cumprir recomendações da OMS? Se usar uma máscara pode proteger uma vida, por que tanta resistência? Minha obrigação, agora, é fazer por mim, por nós e por quem realmente não pode ficar em casa.

Lúcio, que também é diretor de escola, sai somente por necessidade. Além de atender demandas profissionais, ele fica encarregado de ir à farmácia e ao supermercado. Fora isso, o isolamento é algo certo e combinadíssimo entre os três.

Conforme Daniela, no início do distanciamento, Pedro Henrique pensava que estava em férias. Mas, aos poucos, entendeu que as tarefas escolares continuavam e que o período em casa era para se protegerem do vírus.

- Temos feito o que é recomendado pelos especialistas. No início, foi difícil para alguém que tinha tanta atividade. Frequento a Casa Espírita, e, mesmo com os encontros virtuais, o contato físico faz falta. Não vi mais os amigos e passei o aniversário em casa. Nos primeiros momentos, foi assustador. Nunca havíamos presenciado algo assim. De repente, o nosso livre arbítrio foi tocado, minha rotina foi transformada. Aos poucos, o Pedro, mesmo tão novo, foi silenciando quanto às dúvidas e, junto a nós, faz de tudo para sempre ter algo novo para fazermos.

AULA EM CASA
Como Pedro está em fase de alfabetização, precisa de acompanhamento total nas tarefas escolares. Daniela tentou suprir a figura do professor na vida do filho, mas logo entendeu que não precisa impor a si mesma uma especialização que não era dela.

- Eu achava que tinha que ensinar igual aos professores. Como ele já está sem a socialização na escola, tentei compensar. Procuramos manter o horário para as tarefas igual ao que ele fazia no colégio e corresponder à atenção que ele recebe dos professores. Nosso papel, mesmo o Lúcio sendo professor, é de sermos pais. Agora, estamos tranquilos.

SAUDADE
Daniela e Lúcio também administram a saudade dos pais. A mãe dele, que mora em Pelotas, eles viram em fevereiro. Os pais dela moram entre Santa Maria e Restinga Sêca.

- Depois de um bom tempo em isolamento, com toda a segurança, teve um dia que levamos o Pedro para "fora", para ver os avós. Foi a única vez. Ninguém vai ficar imune a tudo isso, mas eu não quero prejudicar ninguém por falta de cautela. Tem um ser invisível que não pode entrar em nossa casa, e o nosso foco está nessa barreira. Se alguém não pode ficar em casa, fizemos o isolamento para contribuir com essas pessoas também, que se arriscam por todos.

SIGNIFICADOS
Reuniões extensas, hábitos de consumo, atropelar o tempo. Tudo agora tem novo significado para a advogada:

- As conversas, o convívio e a rotina mudaram. O tempo em família ganhou qualidade. Nós, que já gostávamos de cozinhar, nos arriscamos em outras receitas. É prazeroso estarmos juntos. A possibilidade da doença nos mostra a verdadeira importância de tudo. Não tem como não revermos prioridades e necessidades vitais para a humanidade, como a empatia e a resiliência.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Fotos: Pedro Piegas
As pets Julie e Cacau têm ajudado Ceres e Fernanda a se distraírem durante o isolamento

Elas já eram unidas, mas, na luta contra o coronavírus, estão mais perto do que nunca. Mãe e filha, a aposentada Céres Ramos Silveira, 55 anos, e a administradora Fernanda Roncato, 28 anos, estão em isolamento social desde o início da pandemia. Para Céres, a falta dos encontros com os amigos machuca. Mesmo assim, ela entende que o momento é de não apenas proteger-se, mas de cuidar do outro.

- Sou comunicativa. Adoro estar em grupos. Fazia academia, aula de pintura, saía aos finais de semana. No início, muito difícil deixar tudo isso, ainda mais sem saber até quando. A rotina da gente é a vida da gente. 

Céres decidiu pelo isolamento depois de acompanhar o tratamento do irmão. Com uma embolia pulmonar, ele precisou ficar entubado no hospital por várias semanas. Ao vê-lo em uma situação tão frágil, ela compreendeu mais ainda o quanto é importante não correr riscos.

- Como foi bem no início da pandemia, os médicos acharam que ele tinha coronavírus. Felizmente, não era. Meu irmão se recuperou, e a lição valeu para todos nós. Só a suspeita de alguém tão próximo ter a doença já nos fez ver a vida de outra forma. Ninguém escolhe o distanciamento social. A escolha é pela saúde, pela vida. De repente, ficamos em casa. Só em casa. Então, percebemos o quanto dávamos intensidade a coisas tão pequenas, né? 

data-filename="retriever" style="width: 100%;">A administradora Fernanda Roncato e a mãe, Céres Ramos Silveira, aposentada, estão em isolamento social. As pets Julie e Cacau são os únicos motivos de elas saírem de casa um pouquinho, todos os dias

Nesta nova rotina, Céres descobriu dons que nem imaginava, entre eles, a arte da culinária.

- Eu, que detestava cozinhar, aprendi a fazer doces maravilhosos e a valorizar a rotina, que também pode ser especial, só depende da gente. Nas primeiras semanas, enfrentamos conflitos internos e uma com a outra, como a difícil missão de dividir as tarefas domésticas. Para mim, o principal aprendizado diz respeito aos valores do coração, que, agora, estão ainda mais latentes.


REAPROXIMAÇÕES
É por meio das conferências pela internet que Fernanda dá conta do expediente em casa, que agora virou escritório. A saudade dos amigos e dos finais de semana no barzinho tem sido acalentada por reaproximações, mesmo que virtualmente. Para ela, o momento é de resgatar laços importantes, antes subestimados pelo excesso de atividades.

- Cada um lida de um jeito com a situação. Tenho olhado mais para "a Fernanda". Estou em distanciamento, não em isolamento total. Saímos com as cachorrinhas e, quando dá, com muita proteção, vou à academia. 

Fernanda está longe do pai, o advogado Flávio Roncato, 60 anos, que tem pressão alta e faz parte do grupo de risco.

- Não deixamos de nos falar, mas, em um mês, vi meu pai apenas uma vez. Quanto à pandemia, estou otimista. Com responsabilidade, vamos vencer tudo isso.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">A acadêmica de Medicina da UFN Carollyna estuda de forma online em seu notebook

"O maior obstáculo é a doença, mas a saudade dói" também

A estudante de Medicina Carollyna Brum, 20 anos, está em isolamento desde 17 de março, quando as aulas da Universidade Franciscana (UFN), onde estuda, foram canceladas.

A jovem é de São Sepé, mas mora em Santa Maria para estudar. Ela decidiu fazer a quarentena na cidade natal, mas, antes, para não comprometer a saúde dos familiares, ficou em isolamento total por 14 dias, no apartamento onde mora:

- Fui para São Sepé em 1º de abril. Não quis ir direto para lá porque moro com minha avó, de 86 anos, do grupo de risco.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Desde o início da pandemia, além do isolamento social total, Carollyna tomou todos os cuidados indicados pela OMS

Em isolamento, Carollyna saía de casa apenas quando havia necessidade, para pagar contas e atender demandas para que a avó não saísse. Mesmo assim, nunca descuidou das medidas de proteção.

- Na rua, utilizava máscara. Ao chegar em casa, tirava calçados e roupas e ia direto para o banho. Minha avó e eu mantivemos distância dentro de casa. Passávamos água sanitária no chão, álcool nos móveis, e ela tinha os próprios talheres.

No último dia 11, Carolynna voltou para Santa Maria devido à possibilidade de que as aulas práticas voltariam. Desde então, ela não sai do apartamento.

- O cancelamento das aulas mudou toda a minha rotina. Eu passava a maior parte do meu tempo na faculdade. Vim para cá para isso. Agora, é esperar. Não tem como não se preocupar. Ainda não sabemos o que vem por aí - reflete.

A jovem, cheia de planos para a profissão que escolheu, sabe que o momento é de espera. Neste tempo, procura vários recursos para não se abater.

- Sei que o maior obstáculo é a doença, mas o distanciamento das pessoas dói, sim. Sinto falta de jantar com os amigos e da minha família. Tenho saudades de abraços, apertos de mão, de carinho físico.

Carollyna também se coloca no lugar de quem já vive mais só. Ela costumava visitar as idosas do Lar das Vovozinhas, instituição que frequentava regularmente através de um projeto acadêmico:

- Essa falta, com certeza, é a que mais dói. Imagino que, para elas, seja ainda mais difícil. Muitas são sozinhas e recebem poucas visitas - comenta.

A estudante e o restante do grupo que integra o projeto têm feito chamadas de vídeo com as vovós.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Práticas como a leitura ajudam a jovem a ocupar o tempo e distrair a mente

- Minha saúde mental está bem afetada. A maneira que encontrei para amenizar estes efeitos é praticar meditação e assistir e ler conteúdos que me acalmem. Essas buscas , que eram raras no meu dia a dia, agora são essenciais - explica.

Por conta da ansiedade, a alimentação da jovem também tem sido prejudicada, e os exercícios físicos tiveram que ganhar outro aspecto. Ela, que jogava futsal e handebol, agora, em casa, faz alongamentos, com ajuda de vídeos do YouTube:

- Estou aprendendo tanto com esse período... O isolamento me levou ao autoconhecimento. Reflito sobre a humanidade e o nosso enorme poder de resiliência. Precisamos perceber, de uma vez por todas, o que de fato é importante e valorizar a nossa grande casa, a Terra, e o maior e mais valioso presente que temos, a vida. Temos que abraçar, beijar, encontrar todos que amamos sempre que houver oportunidade. A maior lição? O amor!

"Um novo olhar sobre si e sobre o outro"

style="width: 100%;" data-filename="retriever">A educadora física Camila Jobim precisou se reinventar no isolamento. Dá aulas de forma online seu celular por meio de vídeo chamadas

A bacharel em Educação Física e personal trainer, Camila Cardozo Jobim, 31 anos, precisou mudar toda a rotina assim que decidiu priorizar o distanciamento social. Como trabalha em academia, os treinos em grupos fazem parte no dia a dia dela há muito tempo. Aos poucos, ela voltou a atender alguns treinos em core training, mas individualizados.

Fiel às normas estabelecidas pela OMS, Camila sabe que o isolamento é fundamental para cuidar de si e dos outros. Por isso, decidiu que aproveitaria este tempo da melhor forma.

- Poderia continuar fazendo tudo o que fazia antes, mas acho que é uma questão de empatia, sabe? Mesmo em casa, os exercícios e leituras, que já faziam parte do meu dia, ganharam mais atenção. Dediquei-me, mais ainda, a estudos relacionados ao meu trabalho, especificamente em áreas que antes eu não abordava, como marketing e vendas online. Fiz cursos e assisti a palestras a respeito de treinamento físico. Neste período, percebi o quanto tem conteúdos bons e gratuitos disponíveis em diferentes plataformas para quem deseja aprender - comenta ela.

Para Camila, os primeiros dias em casa foram complicados. Aos poucos, a ansiedade ganhava espaço junto à incerteza que o vírus representava:

- Após duas semanas em isolamento em Santa Maria, fui para a casa da minha mãe em Cacequi, no entanto, evitei ficar perto dela. Não pude visitar minha avó, que tem 91 anos, e isso doeu um pouco. O que mais me "segurou" foi a fé, principalmente da minha mãe. Trabalhar, ainda que à distância, e fazer atividade física tem me ajudado a superar a ansiedade. Compreendi que ficar sem contato presencial é questão de saúde agora.

style="width: 100%;" data-filename="retriever">

HORA DE FAZER MAIS
A correria do dia a dia, segundo Camila, é uma das principais causas para o abandono de sonhos. Ainda que a pandemia não tenha acabado, ela acredita que já tem um novo olhar sobre si e sobre o outro:

- Sem perceber, temos feito mais pelos outros do que por nós mesmos. Comecei a fazer parte do Generatividade, projeto que busca soluções para qualidade de vida, e isso tem me ajudado a sonhar. Estou em um projeto do grupo, com Debora Denardi, Clarice Veigo e Cassiano Boessii, que tem me motivado bastante.

"Cuidar da saúde mental é um desafio diário"
Psicóloga, Suane Faraj, 36 anos, é profissional, mãe, de dois filhos, de 13 e 5 anos, e dona de casa. Assim como é a realidade da maioria das mulheres do Brasil, ela se divide para exercer todas as funções da melhor maneira possível. Organizar a rotina dos estudos dos filhos com o home office foram as primeiras ações a serem executadas em um plano diferenciado: fazer o isolamento recomendado para prevenir a contaminação com o novo coronavírus: 

- A rotina em casa é intensa, mas procuro estabelecer horários para acordar, almoçar, fazer as atividades escolares, trabalhar e dormir. A saúde é a nossa prioridade, mesmo assim, busco sempre a flexibilidade. Converso sobre o cenário atual e explico as razões de não podermos ir à escola ou ao futebol, em especial ao meu filho de 5 anos. Compartilhamos uns com os outros o que estamos sentindo e pensando. Além de exercer a empatia, precisamos priorizar a saúde mental para lidar com os desafios, que acredito que são diários, pelo menos aqui em casa.

VIVÊNCIAS
Doutoranda, Suane tinha todos os turnos preenchidos. Acompanhava os filhos na escola e em atividades extras, como futebol. Saía de casa às 7h30min e retornava às 18h. No isolamento, continua dividindo as horas entre trabalho, e atividades acadêmicas, porque o semestre na UFSM continua. Somando a isso, ela não descuida da missão de ser mãe e dona de casa por 24 horas:

- Incluí na minha rotina escrever e conversar por videochamada ou telefone com minha irmã, com meus pais e amigas. São as formas que encontrei para compartilhar as experiências atuais e elaborar as vivências.

VÍDEO: o que dizem as crianças sobre a pandemia do coronavírus

 É na arte de escrever, seja textos pessoais ou projeto de tese e artigos científicos, que Suane tem encontrado ajuda para enfrentar o cenário atual. Ela, que nunca foi das atividades domésticas e nem um pouco caseira, vê no contexto de isolamento algo enriquecedor, como desfrutar da alegria diária da convivência com os filhos:

- As crianças são afetivas, carinhosas, verdadeiras, criativas e sensíveis. Estar com elas ajuda. Buscamos fotos e vídeos de família para recordar momentos bons e ficarmos próximos de quem está longe. Converso, diariamente, com a minha irmã gêmea, que mora em outra cidade. Compartilhar nossas histórias é uma possibilidade de elaboração da vivência atual. 

DESAFIOS
Para Suane, ficar longe das pessoas que gosta e do trabalho em equipe (presencial) tem sido bastante difícil:

- Não estamos visitando os familiares e amigos. Além de conciliar trabalho e casa, tenho aprendido a lidar com as emoções que tantas informações nos despertam. É necessário contextualizar o que está acontecendo, atender às recomendações e nos adaptarmos a essa realidade. Minha perspectiva é um retorno à rotina antiga, mas com mais cuidado, ainda no segundo semestre do ano.

Todo mundo em casa, sala que vira escritório, pais que viram professores, celulares como cenários de comemorações. Encontros virtuais, homenagens de longe e incertezas.

No consultório da psicóloga Giselma Melo, perda é a palavra mais repetida neste momento. Tal sentimento tem sido relacionado ao medo do desemprego, à falta da convivência e a impossibilidade de ir e vir:

- O isolamento não é a realidade de todos. Se não pode fazer, não se sinta culpado. Para muitos, manter o emprego, por exemplo, é tão necessário quanto se proteger da pandemia. Não tente controlar o que não está no seu controle. Se precisar sair, exponha-se o mínimo possível.

VÍDEO: quarentena é tempo de desapegar de roupas e maquiagens e doar a quem precisa

Para alguns, segundo Giselma, a resistência ao isolamento pode estar na dificuldade de olhar para dentro de si.

- No convívio social e no dia a dia, certas coisas passam despercebidas. Contemplar a si mesmo, às vezes, pode ser um processo doloroso. Já para outros, ficar em casa é muito difícil por diversas causas. Há, ainda, a negação, um dos nossos mecanismos de defesa. É fácil percebê-la em discursos como "é só uma gripezinha", "em mim, não pega".

Giselma explica que home office também é isolamento. Ao trabalhar em casa, a pessoa pode se sentir sobrecarregada e ter crises de ansiedade, insônia e se sentir sem energia:

- Separar casa e expediente não é uma tarefa simples. A exigência é maior em vários aspectos e, a cada reunião, ficamos um pouco expostos. O bebê chora, os cães brigam, os familiares passam correndo atrás do vídeo - comenta ela.

FADIGA MENTAL
Por mais que o aconchego do lar seja bom, dias a fio no mesmo lugar podem trazer fadiga mental. Giselma explica que isso pode ser percebido quando a pessoa perde a disposição, fica irritada com facilidade ou apresenta, entre outros sintomas, dificuldade de concentração:

- Isolamento pode causar fadiga, sim. Peça ajuda, faça terapia e atividades prazerosas. Exercícios físicos ajudam. Se precisar, consulte um psiquiatra.

Especialista em pedagogia do trabalho, Débora Denardi reforça que se adequar a tantas mudanças é um desafio para qualquer profissional desta geração:

- Equilíbrio e produtividade no trabalho vão requerer mais disciplina agora. Não estávamos preparados para essa reclusão. É hora de criar, ser colaborativo e se mexer. Nosso modo de trabalhar, mais do que nunca, terá que ser repensado.

QUEBRA DE PAPEIS
Terapeuta ocupacional, Kayla Ximenes Palma diz que tanta mudança representa uma quebra de papéis ocupacionais. A necessidade, agora, é adequar-se ao contexto atual.

Fazer tudo como antes também não será possível. O importante, de acordo com a terapeuta, é buscar crescimento a modo compatível com a própria realidade.

- Outras formas de aprendizado foram impostas. Não devemos nos cobrar. Podemos, sim, procurar estímulos a partir deste novo modo de vida - diz Kayla.

URGÊNCIAS E PRIORIDADES
Segundo a psicóloga Suane Faraj, cada um viverá o isolamento a seu modo. A maioria dos jovens, por exemplo, vive de forma intensa. Já os idosos usam a experiência para encontrar estratégias.

- Estamos diante de algo que exige empatia, paciência e responsabilidade. Alguns serão resistentes, outros resilientes. Viva essa história do seu jeito e não deixe de expressar o que sente. Só assim será possível construir saídas. Não existe receita. Podemos experimentar, acertar, errar, refazer - conclui Suane.

Como cuidar do corpo e da mente durante o isolamento

  • Ao acordar, mentalize um dia feliz. Não negligencie a alimentação saudável e o sono de qualidade. Mexa o corpo por pelo menos 30 minutos
  • Estabeleça metas. Confira e comemore as realizações diárias
  • Exercite a fé
  • Fique em silêncio, escute e sinta o seu corpo. Coloque em prática o desapego e exerça a solidariedade
  • Arrume armários, cuide do jardim, faça mudanças em casa
  • Tenha um horário fixo e crie um lugar especial para trabalhar ou estudar em casa
  • Converse com quem ama. Amizade é essencial. Cuide da mente e da espiritualidade
  • Fique em silêncio, escute e sinta o seu corpo. Coloque em prática o desapego e exerça a solidariedade
  • Agradeça pelo trabalho, pela saúde, pela família
  • Não exponha a criança ao excesso de informação
  • Ajude a criança a se sentir segura e a elaborar a ausência da escola, a falta dos amigos, o fato de não poder brincar no parquinho
  • Não interrompa tratamentos médicos ou psicológicos. Alguns profissionais de saúde mental estão oferecendo atendimento gratuito
  • Desenvolva a resiliência. Situações adversas geram importantes aprendizados
  • Não interrompa tratamentos médicos ou psicológicos. Alguns profissionais de saúde mental estão oferecendo atendimento gratuito
  • Ouvir música, ler um livro, assistir a um filme ou série na televisão podem aliviar a fadiga emocional
  • Recursos internos ajudam. Invista no autoconhecimento. Respeite o próprio tempo
  • Se preferir, use as redes sociais para compartilhar vivências. Separe tempo para entretenimento
  • Busque notícias de fontes confiáveis 
  • Em casa, cuide para não ter a mesma exigência do trabalho presencial. Você terá que lidar com limitações
  • Veja o home office como oportunidade de novas aprendizagens, habilidades e formas de interação
  • Busque as próprias estratégias para o isolamento. Não dê lugar à solidão. Telefone, faça contatos, diga o que sente

*Colaborou: Gabriele Bordin

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