Comportamento

Os desafios de conviver em condomínios

Tatiana Py Dutra


Diariamente, a Brigada Militar (BM) atende casos de perturbação de sossego e violência doméstica em condomínios residenciais de Santa Maria. Mas um caso de agressão física entre vizinhos, registrado pela BM há cerca de 20 dias, fez pensar: o que aconteceu com a velha prática da boa vizinhança? 

Para a antropóloga e professora Sílvia Norberto, de Porto Alegre, um individualismo exacerbado pode estar associado à urbanização da sociedade.
- Não só pelo crescimento físico das cidades, mas como também de valores ligados ao meio urbano. O indivíduo tenta preservar-se do avanço do externo, fechando-se. Se, antigamente, as relações de vizinhança eram semelhantes às relações de parentesco, hoje, muitas pessoas se tornaram refratárias a esse avanço do olhar do outro a sua vida privada - teoriza.
Fato é que a convivência em condomínio pode ser estressante. Muitos moradores viveram por décadas em casas amplas, onde tinham maior liberdade, espaço, privacidade e individualidade. Conviver com vizinhos tão próximos e compartilhar áreas de lazer e espaços comuns pode ser complexo. E daí vêm as reclamações.
O Diário consultou cinco administradoras de condomínio da cidade para descobrir quais as principais causas de queixas entre os condôminos. Na lista, incômodos causados por animais de estimação, brigas de casal, infiltrações, uso indevido do estacionamento e inadimplência. Mas o problema número um é o barulho, causa da maioria dos conflitos entre moradores. 
Não que as pessoas tenham, necessariamente, ficado mais barulhentas. São as paredes que estão mais finas. Muitas construtoras, para reduzir os custos e otimizar espaços, têm diminuído o tamanho das unidades e dos seus cômodos. Paredes e lajes também ficaram menos espessas, facilitando a propagação de sons, exigindo maior cuidado com o uso para evitar que seu vizinho seja incomodado.

CHAMA O SÍNDICO! 

Quando o ruído é recorrente, as rotas dos moradores podem entrar em colisão. Para evitar isso, a sugestão dos administradores é uma boa conversa entre vizinhos. Mas há quem evite por medo de um possível comportamento antissocial após a crítica. Esse é um dos casos em que se chama o síndico. Porém, a ação do responsável pela gerência do condomínio é limitada, o que pode frustrar os condôminos. 
- O morador A não quer conversar com o vizinho B e chama o síndico. Ele vai oferecer ao morador A o livro de registro de ocorrências, onde ele fará a queixa do B por escrito. O síndico vai comunicar o vizinho B e pedir providências e, em caso de reincidência, aplicar multa - explica Cleber Neckel, proprietário da Gestores Condomínios. 
A formalização da queixa por escrito é uma forma de garantir que o morador A, se confrontado pelo vizinho B, não mude sua história e coloque a culpa no síndico. Essa situação, recorrente no passado, está a caminho de ser abolida, junto com outras velhas práticas, graças à profissionalização dos síndicos, como explica o presidente do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Comerciais de Santa Maria (Secovi Centro Gaúcho), Cristian Menezes.
- Antigamente, o síndico era uma pessoa aposentada, com poucas atribuições e que podia vigiar o condomínio. Naquele tempo, a legislação era menos exigente. Hoje, os condomínios têm CNPJ e atribuições semelhantes a das empresas. Isso exige conhecimento em áreas como administração, direito e contabilidade, e saber de leis que não gerem ônus para o condomínio - explica Menezes.
O presidente do Secovi diz que muitos condomínios, hoje, enfrentam ações judiciais justamente pela falta de capacitação do síndico:
- Se ele cobra presencialmente do morador inadimplente, ou o proíbe de usar áreas comuns, o condomínio pode responder por danos morais. Se ele contrata uma empresa prestadora de serviço que não cumpre as leis trabalhistas, o condomínio pode responder solidariamente. A figura do síndico, hoje, mudou. Ele não é vigia do condomínio. É um gerente, intermediador.
A seguir, exemplos de como moradores e síndicos enfrentam os problemas do dia a dia. Eles contaram suas histórias enviando mensagens por e-mail e via Facebook. Alguns pediram para ter a identidade preservada para evitar atritos com os vizinhos.


UM PROBLEMA QUE SE ESCONDE NAS PAREDES

Problemas hidráulicos podem ser fonte de grandes dores de cabeça. Isso porque as responsabilidades pelo encanamento tanto podem ser do condomínio como de um morador. E quando o assunto é infiltração e vazamentos, solucionar o problema com agilidade é sinônimo de economia.
- A água é uma das maiores despesas de um condomínio e, com vazamentos, o custo se eleva ainda mais. É preciso que os moradores sempre estejam atentos a marcas de umidade e vazamentos. Observar se os rejuntes não apresentam mofo, se não está correndo água no vaso sanitário são formas de prevenir esse problema - explica Mateus Schwarcke, dono da TriAD Condomínios.
A indisposição de alguns em serem cordiais com vizinhos, muitas vezes, causa danos desnecessários. Foi o que concluiu uma professora, de 44 anos, moradora de um condomínio no Bairro Bonfim.
- Meses atrás, percebi umidade na parede do meu quarto e na da área de serviço. Era um sinal claro de infiltração. Interfonei para os vizinhos do apartamento de cima, que disseram que "estava tudo seco" lá, que não tinha problema nenhum. Eu falei que queria chamar um encanador para dar uma olhada, mas ele disse que não abriria a porta para técnico nenhum - relata a professora, que mora no quarto andar de um edifício de 12 pavimentos.
Foi necessária a intervenção do síndico e, até, da administradora do condomínio para que o homem se convencesse a permitir a averiguação. O processo demorou 15 dias.
- Quando o técnico foi lá, viu que a origem do problema era um apartamento de cima, no sexto andar. Mas o do meu vizinho de cima já apresentava danos da infiltração também - conta a professora, acrescentando que o dono do apartamento onde se originou o problema não tardou a resolvê-lo.
Exigir do responsável o conserto imediato do problema, bem como a indenização pelos danos causados, é um direito. O responsável deverá arcar com o conserto, seja morador ou condomínio.
- O Código Civil até determina que se o síndico for omisso na correção de determinados vazamentos e isso ficar provado, o morador pode solucionar o problema e, depois, cobrar do condomínio. Dentro do imóvel, a responsabilidade é do condômino. De acordo com a Lei de Responsabilidade Civil, ninguém pode provocar dano ao outro. Se há vazamento em meu apartamento, é meu dever reparar - explica Kênio de Souza Pereira, especialista em Direito Imobiliário.




AMOR DEMAIS x AMOR DE MENOS: CASAIS COMPLICADOS

Ao se mudar de um condomínio com centenas de apartamentos para um prédio de apenas 12 unidades, uma estudante de 25 anos achou que seria mais fácil lidar com menos pessoas. Ledo engano.
- Cheguei sendo comunicada de que o prédio tinha um sublocador que fazia as vezes de ator pornô com a namorada, transando de janela aberta, inclusive aparados na janela, aos finais de semana - conta.
A estudante não levou tão à sério o que lhe contaram, até que teve a oportunidade de ouvir tudo o que o tal morador e sua namorada gostavam de dizer um ao outro durante o sexo. A moça definiu a situação como duplamente constrangedora: ouvi-los e reclamar com o casal, que já havia sido notificado anteriormente pelo condomínio.   
- O problema só acabou quando foram embora - conta a estudante.
A personal trainer Josiane Lopes Souza, 37 anos, disse já ter convivido com muitos casais que faziam sexo "animadamente". Cultivou o hábito de deixar bilhetes:
- Eu tentava ser cordial, dizer que ficava feliz por se curtirem tanto, mas que a cama rangia muito e batia na parede, e eu não conseguia dormir. Como tenho de acordar muito cedo, preciso estar descansada. Foi um jeito de pedir que maneirassem. Às vezes, funcionava, às vezes, não. Mas eu achava ridículo procurar o síndico para notificar um casal transando.
Porém, Josiane não se furtou de buscar a autoridade do condomínio quando uma briga de casal evoluiu para a agressão física. Com medo do desfecho, ela acionou o síndico, que a orientou a chamar a Brigada Militar (BM). A atitude foi correta, diz Jonatan Ineu, sócio e diretor administrativo da Modelo Administradora. 
- É um caso extremamente delicado. Como o síndico vai intervir em uma briga? Como saber se não tem alguém armado? O morador tem de comunicar o síndico para dizer que estão perturbando o coletivo, mas a ação dele não tem força de leis. Tem de chamar a polícia, fazer o registro de ocorrência. Depois, sim, o síndico pode notificar o morador por perturbar os demais - afirma Ineu.
O administrador aconselha que, em qualquer caso de violência, os moradores acionem a BM pelo número 190.


UMA QUESTÃO DE SABER RESPEITAR O ESPAÇO DO OUTRO

Uma psicóloga de 33 anos, moradora do Bairro Medianeira, vive em pé de guerra com um vizinho que ela considera "folgado":
- Ele recebe visitas e deixa que elas estacionem em qualquer vaga vazia do condomínio. Quando a gente chega do trabalho, não consegue estacionar porque tem um carro no lugar. A gente reclama com ele,  ele dá risada e diz: "Tu nem tava usando, tia!". Me sobe o sangue! Dá vontade de chamar o guincho.
O problema é que não é possível guinchar, como explica Jonatan Ineu, da Modelo Administradora. 
- O guincho não pode entrar em propriedade particular. E outra que a garagem da maioria dos condomínios nem suporta a entrada do veículo. A solução é registrar na polícia, já que o vizinho está invadindo a sua propriedade particular - diz Ineu.
Justamente por esse fator, o condomínio nada pode fazer nos casos de uso da propriedade privada. Agora, se a situação ocorre em áreas comuns, cabe ao síndico encaminhar as soluções.
- A velocidade que pode ser usada dentro do condomínio, as áreas onde é proibido estacionar, tudo tem de estar sinalizado para que os condomínios estejam cientes de que podem ser cobrados por alguma infração - adverte o especialista em Direito Imobiliário Kênio de Souza Pereira.
Mas nem sempre a sinalização garante que as regras sejam respeitadas.
- Quase saí no tapa com um ex-vizinho que, diariamente, estacionava na área proibida, bem na frente da placa de proibido estacionar. Ela estava ali, justamente, por que é uma curva que leva para os fundos do condomínio. Como eu tenho uma caminhonete, ficava difícil passar por ali com o carro dele atravessado. Se eu bato, ainda vou ter de pagar o conserto para a pessoa - diz um militar de 39 anos, morador do Passo d'Areia.
Mais um caso que pode ser intermediado pela convenção do condomínio.
- O síndico deve aplicar a convenção. Intervir, notificar e, se for o caso, aplicar multa - afirma Pereira.
Em caso de reincidência contumaz, o condomínio pode adotar medidas mais drásticas, como recorrer ao Poder Judiciário, diz o advogado:
- Atos irregulares podem ser eliminados com a aplicação de multas, bem como com uma ação de obrigação de não fazer, na qual o juiz poderá aplicar uma penalidade diária que poderá acarretar um grande prejuízo para o infrator.



DEVO, NÃO NEGO. PAGO...

A inadimplência - o atraso ou o não pagamento da taxa de condomínio - causa grandes prejuízos para o caixa que o síndico tem que administrar. Se a situação não for controlada logo, o condomínio pode ficar endividado.
- Condomínios são como empresas, mas não geram lucro. O dinheiro que sobra é colocado em um fundo de reserva, que deveria ser usado para melhorias e benfeitorias, e não para pagar as contas do mês - diz Mateus Schwarcke, da TriAD Condomínios.
"Assaltar" o fundo de reserva para pagar as contas do mês tem sido a saída para muitos condomínios graças ao aumento da inadimplência nos últimos 15 anos. Isso porque, desde 2003, quando passou a vigorar o novo Código Civil, o teto das multas para quem não pagava as taxas condominiais em dia caiu de 20% para 2%. 
- Isso criou uma categoria de inadimplentes eventuais, que atrasam dois, três meses, mas não sempre. Como a multa é menor do que ficar com outros pagamentos em atraso, o condomínio acaba sendo a última preocupação dessas pessoas - comenta Schwarcke.
O primeiro recurso para os administradores é sempre tentar negociar com os inadimplentes, para que ponham as contas em dia o quanto antes. Outra possibilidade é protestar as contas atrasadas em cartório. Se o condômino não pagar no prazo estipulado, terá o nome incluído em listas sujas dos serviços de análise de crédito, como SCPC e Serasa.
Menos comuns são os casos de condôminos que passam mais de seis meses devendo as taxas condominiais. O encaminhamento de soluções, nesses casos, também é mais simples e conhecido.
- É claro que a solução amigável é sempre a melhor. Contudo, aplicar o que a lei permite é uma saída que não pode ser dispensada. Por isso, recorrer à Justiça para receber os valores atrasados pode ser a melhor maneira de resolver a situação - diz.
Mas, atenção: constranger o morador inadimplente é ilegal.
- O síndico não pode fazer cobranças presencialmente, proibir o inadimplente de usar áreas comuns ou cortar a água do apartamento. Isso, apesar de praticado no passado, nunca foi uma atitude de acordo com a lei - lembra o presidente do Secovi Centro Gaúcho, Cristian Menezes. 



PROBLEMA PRA CACHORRO

Décadas atrás, era bastante comum que as convenções condominiais vetassem a presença de animais. Barulho, cocô e xixi em locais indesejados eram as principais justificativas para a regra - que, no fim, é ilegal. A proibição violando o direito de propriedade, permitido pela Constituição Federal.
Assim, desde que o animal não cause risco à saúde ou à segurança dos demais moradores e não tire o sossego da vizinhança, sua permanência é permitida. As convenções podem, porém, restringir a forma como os animais são mantidos nas áreas de uso comum. Se devem usar o elevador de serviço, circular nas áreas comuns com guia e focinheira, ou mesmo não circular fora dos apartamentos etc.
Cumprir as regras, porém, é sempre uma questão de bom senso - que costuma falhar. Cães e gatos, principalmente, são alvos de grande parte das queixas de condôminos, perdendo apenas para o barulho dos moradores humanos. 
- Muitas pessoas moram sozinhas, e deixam o cão no apartamento o dia inteiro sem companhia. Eles ficam ansiosos e começam a fazer barulho, latem por qualquer coisa. Com gatos, as queixas são mais raras, mas ocorre de condomínios com garagens abertas terem problemas, já que os felinos gostam do calor e sobem nos carros, arranhando a lataria - comenta Mateus Schwarcke, proprietário da TriAD Condomínios.
Escolher bem a raça do cachorro pode poupar seus tutores de dor de cabeça.
- Há raças com características mais adequadas à vida em apartamento. O pequinês, o maltês e o shitzu, por exemplo, se adaptam bem a pequenos espaços e são silenciosos. Já cães das raças pinscher e poodle costumam latir sempre que alguém passa pelo corredor, o que irrita os vizinhos - avalia Jonatan Ineu, diretor administrativo da Modelo Administradora. 


"NÚMERO 2" 

O segundo maior problema relacionado a cães e gatos é a higiene. Muitos moradores deparam (às vezes, tarde demais) com cocôs fedorentos espalhados pelo condomínio. A recusa dos proprietários em limpar as fezes de seus animais obrigou Loreni Rezende dos Santos, síndica de um condomínio no Bairro São José, a propor uma mudança na convenção do condomínio.

- Propus, e foi aprovado, que o passeio com animais fosse proibido nas áreas comuns. Quem quiser levar seu cão para passear na rua deve levá-lo no colo. A multa é o valor da média de três taxas condominiais. É drástico, mas a gente parou de pisar em cocô - esclarece a síndica. 
O condomínio onde a funcionária pública Roberta Schneider, 35 anos, vive com a filha Maria Rosa, 9, (ambas na foto) ainda é flexível. Apesar de ficar em frente a uma praça, permite que os moradores que têm cães usem a garagem para os necessários passeios de alívio. E até disponibiliza produtos de limpeza para serem jogados sobre o xixi dos bichos. Já o cocô, cada morador tem de juntar. Ou teria.
- Tem gente que não está respeitando essa regra. Então, na última assembleia, ficou estabelecida uma multa de meio salário mínimo para quem for flagrado pelas câmeras - conta.
Para uma jornalista de 36 anos, a falta de bom senso de alguns tutores não tem limites. Pelo Facebook, ela relatou uma experiência nada agradável que teve com uma vizinha tempos atrás. 
- Ela não saía com o cachorro (para a rua) porque ele era cego, mas largava o bicho no corredor do prédio para fazer xixi e cocô: E adivinha onde ele ia fazer isso? Na minha porta, porque sentia o cheiro dos meus - conta, acrescentando que o problema só acabou quando o cão morreu. 

SOLUÇÃO CRIATIVA 

O advogado Juarez Fernandes assumiu o sindicato de um recém inaugurado condomínio, de 126 apartamentos, dois anos atrás. Durante a definição das regras da convenção, os primeiros moradores decidiram proibir a presença de pets na área de lazer do prédio de duas torres, onde havia um colorido brinquedo para crianças.
No entanto, conforme o tempo foi passando e os apartamentos foram sendo ocupados, o síndico percebeu que as famílias que os habitavam tinham mais animais do que crianças.
- Dos 126, cinco ou seis apartamentos têm crianças, sendo que só em dois as crianças são residentes. Mas há animais em 60 unidades. Inclusive, em um dos apartamentos, há cachorros e crianças - detalha Fernandes.
No vídeo a seguir, o síndico explica a ideia que teve, com base nessas informações.

O plano de Juarez e dos conselheiros só irá a votação na próxima assembleia, em julho, mas já conta com o apoio de muitos moradores.
- Eu quero um espaço para levar meu cachorro dentro do condomínio. Já que não há tantas crianças, dividir o espaço é uma boa ideia - opina a estudante Maria Vitória Pinheiro, 19 anos.

VIZINHOS DO BARULHO

A comemoração dos 50 anos da microempresária Maria José Lima Oliveira terminou com a chegada da polícia em novembro passado. Moradora de um condomínio horizontal em Camobi, ela convidou cerca de 30 amigos e parentes para uma confraterninzação no salão de festas do condomínio. Mas nem tudo o que planejou deu certo.
- No fim, vieram 70 pessoas, e não 30, entre elas, muitas crianças. A noite estava muito quente, e o ar-condicionado não funcionava. A maioria dos convidados ficou fora do salão bebendo cerveja. Os pais perderam o controle das crianças, e eu não quis ser deselegante. Acabou que o barulho, que era para ser concentrado num lugar só, ecoou pelo condomínio. E isso que não havia muitos moradores à época - lembra Maria José.
Apesar de desagradável, a chegada da polícia aliviou a aniversariante.
- Eu sabia que aquilo era errado e não sabia o que fazer. Só me chateei porque nenhum vizinho interfonou para o salão de festas. Chamaram logo a polícia - lamenta a microempresária.
O barulho é o principal pivô das brigas entre condôminos. É o salto da vizinha do andar de cima que impede que alguém consiga tirar um cochilo, são as crianças que não param de fazer algazarra ou o gosto musical duvidoso do companheiro de andar que podem colocar os moradores em pé de guerra.
Para os menos tolerantes, basta que o vizinho de cima arraste uma cadeira para que as reclamações surjam. Por outro lado, o barulho excessivo ou persistente gera reclamações justas, que devem ser confrontadas com o bom senso e com as leis.
A melhor alternativa é resolver o problema dentro de uma conversa amistosa, que ressalte o direito que o outro tem aos momentos de sossego. Caso a solução não venha amigavelmente, é preciso apelar para o que diz a lei sobre o assunto.
Aliás, uma delas gera muita confusão nas vizinhanças barulhentas: a Lei do Silêncio, que determinaria o cessar de ruídos após as 22h. 
- Meu vizinho de andar, muito fã de música ruim, sempre foi muito respeitador do horário de silêncio. Desligava o som às 22h. Mas, desde as 18h, me tortura com canções horrendas em volume altíssimo. Meu único consolo é que a tortura tem hora marcada para terminar. Graças a Deus! - ironizou um publicitário de 29 anos, morador do Bairro São José.
- Horário de silêncio no meu condomínio é uma incógnita: 22h é o horário em que todo mundo resolve fazer barulho. TV, conversa, crianças correndo e gritando, xingando quem passa pela rua, som ligado. E, caso alguém peça para baixar, dizem: "Ué, não é aqui, cuide da sua vida" - contou uma leitora do Bairro Rosário, por e-mail.
Em Santa Maria, o Código de Posturas do Município até especifica locais e horários em que não se pode perturbar a ordem pública, mas, dentro de condomínios, o que vale é o que está determinado na convenção. E o silêncio após as 22h é um acordo entre vizinhos, não, necessariamente, uma lei.
- As pessoas chamam de lei do silêncio, mas isso não existe. A perturbação do outro pode acontecer em qualquer horário, e quem se sente incomodado tem o direito de reclamar para o vizinho e até para a polícia. O horário 22h é um acordo entre vizinhos, não existe uma lei que estabeleça isso - explica Jonatan Ineu, diretor administrativo da Modelo Administradora. 

ESTABELEÇA REGRAS 

Há diferença entre incômodo e perturbação. Isso porque a última nunca atinge uma pessoa só. Nesse caso, segundo o advogado Kênio de Souza Pereira, especialista em Direito Imobiliário, o condomínio não tem legitimidade para intervir.
Pereira acrescenta que, para lidar com problemas dessa natureza, é fundamental que o regimento ou a convenção do condomínio tenha normas claras de conduta para uso das áreas de lazer, e que elas sejam amplamente divulgadas. Determinar os períodos para o silêncio, o limite máximo de decibéis e as punições para quem infringir as regras são cruciais. Em alguns Estados, existem leis que determinam qual é esse limite. Em Santa Maria, o Código de Posturas estabelece que cada conjunto residencial determine o seu. Já em condomínios onde moram muitos adolescentes, pode ser saudável fazer uma reunião específica com os jovens e incentivar a participação deles na organização das festas, eventos e das regras, conscientizando-os da importância do bem-estar de todos que ali convivem. Persistindo o problema, a saída é notificar os pais e aplicar multas.
Mas, segundo Cleber Neckel, proprietário da Gestores Condomínios, a solução desses problemas pode começar com numa conversa franca e aberta com o vizinho. 
- Às vezes, o vizinho não percebe que a criança está fazendo barulho, que está arrastando a cadeira, que o salto atrapalha ou que seu som perturba. Normalmente, eles aceitam bem a reclamação e pedem desculpas. Às vezes, também, o morador descobre que quem faz barulho não é o vizinho que ele pensava. Então, tentar conversar é o melhor caminho - ensina. 

_______________________________

EXPEDIENTE 

reportagem
TATIANA PY DUTRA

arte
PAULO CHAGAS

imagens
CHARLES GUERRA

edição de videos
GUILHERME BORGES

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