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VÍDEO: ''A pandemia está nos obrigando a pensar nas outras pessoas', diz arcebispo de Santa Maria

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data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos (Diário)

Esbanjando bom humor, aos poucos, dom Hélio Adelar Rubert, 75 anos, prepara-se para deixar o posto mais importante da Igreja Católica na região. Arcebispo metropolitano e da Arquidiocese de Santa Maria, em função da idade, ele é obrigado a colocar a função que exerce à disposição do papa Francisco.  


O documento com o pedido de aposentadoria foi enviado ao Vaticano no mês passado, quando fez aniversário. Agora, o Papa precisa aceitar o afastamento e nomear outro arcebispo titular - o que pode acontecer a qualquer momento. Enquanto isso, dom Hélio continua exercendo suas funções normalmente.

Responsável por 14 paróquias de Santa Maria e mais de mil comunidades religiosas de 26 municípios, o arcebispo conta, em entrevista por telefone, um pouco de sua trajetória, dos desafios da igreja e sobre como encara a nova fase na vida.

Diário - Como o senhor descobriu sua vocação?
Dom Hélio Adelar Rubert -
Nasci no dia 11 de maio de 1945, no distrito de Segredo, do município de Sobradinho. Desde pequeno, fui sentindo o desejo de ser padre. Minha família trabalhava na lavoura, meu pai era construtor e, assim, tínhamos muito trabalho. Sentia uma empolgação que vem de Deus, certamente. Nunca perdi aquele desejo de ser padre. Entrei bastante jovem no seminário. Naquele tempo, era possível. Hoje, o ingresso ocorre com mais idade. Entrei com 10 anos no pré-seminário de Ivorá. Éramos seis ou sete crianças e jovens de Segredo. Fomos para lá em 1957. Um ano depois, viemos para Santa Maria fazer o antigo curso ginasial, que duravam quatro anos, e, depois, os três anos do científico (hoje, Ensino Médio). Fiz no seminário São José, ao lado da Basílica da Medianeira. Depois, o seminário foi demolido e construído no Parque Dom Antônio Reis. Desde pequeno, senti esse desejo no meu coração. Fui cultivando e fiz uma preparação de muitos anos. Mais tarde, cursei Filosofia e Teologia no seminário de Viamão, na região metropolitana de Porto Alegre. Foram anos difíceis, em que vivíamos no regime militar. Em 1971, no dia 18 de dezembro, eu fui ordenado padre, na paróquia São Marcos, em Segredo, que, até então, era município de Sobradinho. 

Diário - Como é seu dia a dia como arcebispo?
Dom Hélio -
Neste período de pandemia, é um tempo especial, é claro. Mas, normalmente, eu sempre costumo levantar às 5h50min. Depois, faço a meditação e, às 7h, a missa. Isso quando não tem nada para fazer fora. Nos tempos de trabalho normal, a gente faz muitas visitas às paróquias da arquidiocese. Existe toda uma organização. Durante cinco anos, o arcebispo visita todas as paróquias e todas as capelas, conforme a programação. A vida do bispo é, em tempos normais, essa. Levantamos cedo e vamos dormir tarde, sempre atendendo tudo que é possível.  

Diário - É um trabalho de extrema importância no elo entre as cidades que englobam a arquidiocese...
Dom Hélio -
Fui nomeado em 1999 como bispo auxiliar da Arquidiocese em Espírito Santo. Fiquei lá por quatro anos e meio. O papa João Paulo 2º me convidou para ser bispo e, depois, me nomeou como sucessor de dom Ivo Lorscheiter, em Santa Maria. Acompanhei o resto da vida de dom Ivo, até o final. Foi uma alegria poder acompanhar esse homem extraordinário que fez muito por Santa Maria. Depois, nossa diocese, em 2011, foi transformada em arquidiocese. Foi um salto muito importante para Santa Maria, e tive a graça, sem merecer, de ser o primeiro arcebispo que engloba seis dioceses na região: Uruguaiana, Santo Ângelo, Cruz Alta, Santa Cruz do Sul, Cachoeira do Sul e Santa Maria. Eu tenho a obrigação, como arcebispo, de ser um polo de união entre todas essas dioceses da pastoral, caminhando em conjunto e em harmonia para que possamos evangelizar o povo dessa região do Rio Grande do Sul.  

Diário - São quase 50 anos como padre. Há muitas diferenças entre a realidade que se vivia na época em que o senhor foi ordenado e hoje? Como avalia isso?
Dom Hélio -
Eu vejo que, antigamente, dava-se muito valor para a oração, para a vida em família e para a comunidade do seminário. Nós perdemos, na sociedade de hoje, essa dimensão. Parece que, com o coronavírus, estamos recuperando um pouco disso. Nasci em uma família do interior, então, a vida era diferente, e a prática da religião muito mais séria. As pessoas meio que se dispersam com tantas realidades que se têm na cidade, como o trabalho e os problemas que a área urbana carrega. Por outro lado, acho que existem muitas coisas positivas na sociedade de hoje. Ela está evoluindo. Não podemos perder a dimensão da nossa vida. Deus em primeiro lugar, com nossa família e o nosso trabalho. Depois, o resto, a gente vai passando dificuldades, crises, mas a graça de Deus está aí. Se a gente não se apega ao Senhor, o que sobra no final da vida? A gente está vendo, agora, com o coronavírus, no que as pessoas se apegam. No que os poderosos estão se apegando? Fortunas em armamentos militares, nucleares, enquanto que toda essa fortuna deveria ser usada para o bem-estar das pessoas, especialmente das mais necessitadas.  

Diário - Ao chegar aos 75 anos, pelas regras da igreja, o bispo precisa enviar uma mensagem avisando o papa. Como funciona isso?
Dom Hélio -
A gente escreve uma carta para o papa pedindo que ele providencie ou nomeie outro para continuar na missão. É uma norma da igreja que, quando um bispo chega aos 75 anos, ele nomeie outro. Existem bispos que, com essa idade, já estão com a saúde bem fragilizada. O papa pode aceitar logo ou, então, demorar. É uma carta de gratidão juntamente com esse pedido para ser substituído. Depois, a gente continua como bispo, mas não mais como titular. Fica servindo à igreja até o final da vida, no meu caso, aqui em Santa Maria. Essa é a situação. É um passo muito bonito, que faço com alegria. Já mandei a carta. Mandei no dia 20 do mês passado. E ele que vai decidir o que é melhor para a nossa arquidiocese.  

Diário - Como o senhor está vivendo em tempos de pandemia?
Dom Hélio -
Acredito que Deus tem um grande desígnio para toda a humanidade. Quantas coisas o ser humano se deu conta, coisas positivas e negativas que temos que nos converter. Essa ganância de buscar, acumular e esmagar os outros. Estamos vendo como precisamos ser mais solidários. Dar mais atenção ao outro, a começar pela família. Parece que, hoje, vale tudo. O ser humano faz o que quer e pronto. Não é bem assim. Deus nos criou com tanto amor para sermos felizes. O ser humano está se desviando disso, se afastando. Agora, a pandemia está nos obrigando a pensar nos outros. Quantos gestos bonitos na cidade de Santa Maria. Quantas paróquias e outras religiões estão promovendo a ajuda para os mais necessitados.  

Diário - Fora as suas atribuições como arcebispo, o que o senhor mais gosta de fazer?
Dom Hélio
- Eu sempre gostei muito de esporte. Dentro do seminário, isso é normal para todos os jovens. Não era grande craque no futebol, mas também ganhei minhas taças. Sempre gostei muito de alpinismo também. Como bispo no Espírito Santo, que é um Estado muito montanhoso, tive a oportunidade de fazer o meu trabalho e praticar o alpinismo. É o Estado mais montanhoso que nós temos no Brasil. Também quando tive a oportunidade de ir a Europa, como na Suíça e na Itália, sempre procuramos um tempo. A última escalada foi o Dedo de Deus, em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Foi uma aventura meio perigosa, mas foi bonita. Eu sempre gostei porque acho que o esporte faz parte da nossa vida, como o canto, a música, a arte e a poesia. São tantas coisas bonitas. 

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