Quando saiu de Santa Maria, com apenas 20 anos de idade, em novembro de 2014, o soldado Cristian Willian Ortiz Pregardier tinha como convicção cumprir com êxito o trabalho incumbido aos militares brasileiros que, desde 2004, faziam parte da Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti (Minustah). Na manhã desta quarta-feira, no pátio de formaturas do 29º Batalhão de Infantaria Blindado (29º BIB), Pregardier, junto com outros 65 militares, participaram da solenidade que homenageou e formalizou o fim da missão dos popularizados "capacetes azuis". O relato da experiência que o soldado viveu por seis meses e cinco dias transcendeu protocolos que visavam manter a ordem e a segurança do país caribenho:
– Eu voltei melhor do que fui. Me apresentei como voluntário, fiz treinamento, e saímos preparados. Mas não esperava ir tão cedo no início da minha carreira militar. Fazíamos o patrulhamento e víamos muita coisa. Coisas que hoje fazem a gente agradecer pelo que temos. Aquele povo sofrido ensinou a importância que há em ajudar os outros.
Em meio a furacões, terremotos e cenários de extrema violência e miséria, de 2004 a 2017, foram 30,5 mil militares do Exército Brasileiro que contribuíram para a manutenção do ambiente no país, cooperaram com as atividades de assistência humanitária e de fortalecimento das instituições nacionais. Alguns, não voltaram para casa: 18 perderam a vida.
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Da 3ª Divisão Encouraçada (3ª DE), foram enviados três contingentes de tropas com homens e mulheres. Cerca de 500 militares de junho a dezembro de 2007; outros 130 de janeiro a setembro de 2010; e, por último, pelo menos 480 de novembro de 2014 a maio de 2015.
EXPERIÊNCIAS
Em Santa Maria, o impacto da missão é vista com orgulho e remete à relação amistosa junto dos haitianos, além do legado pessoal e profissional.Veja alguns depoimentos:
– O país é repleto de lixo, esgoto a céu aberto e a fome extrema, que é o que mais impacta. Pessoas e animais comendo os mesmos alimentos. Havia muitos casos de cólera. Fomos para cuidarmos da saúde dos nossos militares, mas, às vezes, nos permitiam fazer trabalhos voluntários nos orfanatos. Aquela gente é carente de tudo: de infraestrutura e de afeto. A gente vai e entrega o coração. Sou técnica e agora curso enfermagem. Desde que vim de lá, me voltei à assistência social saúde primária.
3º sargento Luciléia de Oliveira Vicente, 35 anos
– A empatia é o que nos fez (Exército Brasileiro) diferentes dos demais países. Passei um Natal e um Ano Ano Novo lá, em que diversos sentimentos se misturavam. Viramos uns irmãos dos outros na tropa, e muito reconhecidos pelos haitianos. Foi minha maior realização pessoal e profissional. Quando voltei fui fazer o mestrado em Relações Internacionais. Voltei com essa necessidade de entender melhor o mundo.
Tenente-coronel Carlos Alexandre Geovanini, 43 anos
– Uma missão de paz gera uma expectativa em qualquer militar, pois somos preparados para isso. Ao chegarmos lá, vimos uma cultura diferente da nossa e tínhamos que respeitar, aprendermos o hino deles, por exemplo. Em outros caso, presenciávamos a falta de estrutura: mulheres fazendo partos dentro das viaturas. Mas, poder ajudar outro país é o principal legado do Exército e a mim, propiciou muito amadurecimento.
Subtenente Paulo Romário Carvalho, 46 anos
FIM DAS AÇÕES?
Ao longo desses 13 anos somam-se mudanças e ações significativas no contexto do Haiti – o país mais pobre das Américas. Mas, ainda que os ministérios da Defesa e das Relações Exteriores tenham entendido que o país está estabilizado e retirarem os militares brasileiros, a fragilidade das políticas sociais e precariedade persistem e são comprovadas pelos baixíssimos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). Os haitianos, porém, promoveram eleições democráticas e reassumiram o controle da segurança pública, sobretudo, pela Polícia Nacional Haitiana (PNH).
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A especulação, agora, é que governo brasileiro envie tropas para participar da Minusca, missão de paz da ONU na República Centro-Africana, assolada por uma guerra civil e com população em condições de vulnerabilidade social. Se confirmada a participação do Exército, a previsão do Ministério da Defesa é que, em 2018, aproximadamente 800 soldados sejam enviados.
MINUSTAH
– Missão de paz da ONU no Haiti foi criada em junho de 2004
– O efetivo total foi de 30,5 mil militares de 21 nações em todo o período da missão
– Com atribuições, as tropas da ONU deveriam tirar o Haiti do caos e estabilizar o país
– A permanência da Minustah no Hati deveria durar poucos meses. Mas, a missão teve de ser prolongada diversas vezes
– Apesar de ter sido criada para estabelecer a ordem e a segurança, os chamados "capacetes azuis" da ONU também envolveram-se com a distribuição de alimentos, atendimento médico e obras de infraestrutura