Lei Maria da Penha: a cada dia, três medidas protetivas são solicitadas em Santa Maria

Lenon de Paula

Lei Maria da Penha: a cada dia, três medidas protetivas são solicitadas em Santa Maria

Gabriel Haesbaert

Foto: Renan Mattos (arquivo/Diário)

Em 2019, a cidade contabilizou a cada dia cerca de cinco solicitações de medidas protetivas pela Lei Maria da Penha. Entre 2019 e 2021, foi registrado uma queda de 27,3% no número total de requisições, com três solicitações por dia. Índices de ameaças e lesão corporal contra mulheres na cidade também registraram queda, segundo o Estado. No entanto, casos de estupro e feminicídio não acompanham a tendência. Atualmente, Santa Maria contabiliza mais de 2 mil medidas protetivas em andamento. 

O levantamento dos últimos três anos conta com dados da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) do município, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) e da Secretaria de Segurança Pública (SSP) do Estado. Veja, a seguir, o que dizem os especialistas e os principais agentes sobre estes dados, e ainda, como atuam a Polícia Civil e a Brigada Militar no enfrentamento à violência contra a mulher em Santa Maria.

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) completou 16 anos no domingo (7). A legislação trouxe avanços no combate à violência doméstica e familiar, tipificando como crime as diversas formas de violência contra a mulher e trazendo mais rigor na punição aos agressores e na assistência às vítimas. Esta lei define como violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial.

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Outra determinação sobre a assistência às mulheres vítimas de violência diz respeito às medidas protetivas de urgência, uma determinação judicial que proíbe o agressor de se aproximar da vítima, da sua residência e do seu local de trabalho. Em caso de descumprimento da medida, o intimado fica sujeito à pena de prisão de três meses a dois anos. As medidas protetivas possuem validade de seis meses e são prorrogadas mediante pedido da vítima. Quando o magistrado avalia que a vítima corre risco por maior período de tempo, a medida pode ser deferida com um prazo maior de validade, ou com prazo indefinido.

Concessões

No Rio Grande do Sul, somente no 1º semestre de 2022 foram 60.632 medidas protetivas concedidas e 15.274 prisões decretadas pelo Poder Judiciário em casos de violência doméstica. Em Santa Maria, do ano de 2019 até 2021 foi registrado uma queda de 27,3% no número de solicitações de medidas protetivas pela Lei Maria da Penha. Dados da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Santa Maria registram que os índices foram de 1.860 medidas solicitadas em 2019 para 1.351 em 2021. 

Já em 2022, até o dia 31 de julho, foram 789 solicitações. Estes dados são referentes às medidas protetivas solicitadas tanto pela Deam quanto pela Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento de Santa Maria (DPPA). Conforme informações do Poder Judiciário, até o dia 28 de julho deste ano haviam 2.025 tipos de medidas protetivas em andamento em Santa Maria*.

O Monitoramento dos Indicadores de Violência Contra as Mulheres no Rio Grande do Sul, gerido pela Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP/RS), aponta que o número de registros de ameaça e lesão corporal contra mulheres em Santa Maria também registraram queda. No entanto, casos de estupro e feminicídio (consumado e tentado) não acompanham tendência. Confira os dados:

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Fonte: Observatório Estadual de Segurança Pública / Monitoramento dos Indicadores de Violência Contra as Mulheres no RS. SIP/Procergs – Atualizada em 06.07.2022

*Dados do Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher da Comarca de Santa Maria, órgão que examina as solicitações de medidas protetivas. Na maioria dos casos cada uma das vítimas têm concedidas, no mínimo, duas medidas protetivas. Além disso, quando constatada a necessidade, o magistrado concede, por iniciativa própria, as medidas protetivas de ofício em processos criminais e nas sentenças.

O Estado cumpre seu papel, mas pode haver subnotificação, apontam agentes públicos

Questionada sobre a redução do número de solicitações de medidas protetivas nos últimos anos, a delegada Elizabete Shimomura, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Santa Maria, avalia que o esforço conjunto do poder público traz resultados. No entanto, a delegada considera temerário determinar um único motivo, e menciona a possibilidade de haver a subnotificação, quando casos não são denunciados às autoridades.

Delegada Elizabete Shimomura assumiu a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher em março de 2019. Foto: Eduardo Ramos (Diário)

– Eu acho temerário determinar um único motivo, pois se vermos mês a mês nós temos números oscilantes. Em julho tivemos um número alto de ocorrências policiais. Esse mês já percebemos uma redução. Eu acredito que a redução se deva em parte aos esforços conjuntos da Polícia Civil, do Poder Judiciário, Brigada Militar e Ministério Público. Trabalhamos sempre em conjunto para dar uma resposta rápida aos agressores e isso traz resultados. Mas é temerário afirmar que este seja o único fator. Talvez tenhamos subnotificação.

O juiz titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar da Comarca de Santa Maria, Rafael Pagnon Cunha, também destaca a rápida atuação integrada do poder público, e acredita haver situações que não são levadas ao exame do Estado.

– A gente acredita que esse cumprimento rápido de medidas protetivas tem ajudado sim a diminuir o número de solicitações. Por outro lado, também existe uma possibilidade de que haja uma zona cinzenta, um número muito grande de situações que não são trazidas a nossa apreciação. Tudo leva a crer que a violência familiar tenha aumentado, em face da pandemia. Mas a gente gosta de acreditar que o que está ocorrendo é que todas as partes estão trabalhando bem, e a gente tem conseguido dar uma resposta satisfatória a estas questões.

O Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher está sediado anexo ao Fórum de Santa Maria, onde anteriormente estava a Justiça Militar do Estado. Na foto, o juiz titular, Rafael Pagnon Cunha. Foto: Lenon de Paula (arquivo/Bei)

Especialista em Estudos de Gênero afirma que é preciso ir além dos dados

Para a advogada e mestre em Estudos de Gênero pela Universidade de Salamanca (Espanha), Gabriela Souza Cezimbra, os dados numéricos não representam um espelho da realidade social.

– Todo dado deve ser analisado dentro da complexidade do contexto atual e sua transversalidade. Assim como, por exemplo, se for diminuído o policiamento nas ruas, serão registrados menos flagrantes, o mesmo ocorre na diminuição de ocorrências por fatores variados, que não a diminuição da violência doméstica propriamente dita – afirma Gabriela.

Dentre estes fatores, Gabriela aponta que há uma crescente descredibilidade das instituições, em razão da ampla divulgação de notícias de casos emblemáticos, que acabam se voltando contra a vítima, ainda que muitos elementos apontem para a culpabilidade do agressor, e traz como exemplo o caso Mari Ferrer*, em Santa Catarina.

Além disso, na visão de Gabriela, o atual cenário político e econômico, que enfrenta a maior crise das últimas décadas, representa menores oportunidades de independência financeira para a mulher, principalmente sendo ela uma gestora familiar. 

– Há também que há uma crise política, com um atual estímulo ao discurso violento como base de valores conservadores, e uma tendência a normalizar e legitimar o comportamento violento e machista.

Gabriela observa que durante o período analisado, entre os anos 2019-2022, em razão do enfrentamento da crise sanitária do COVID, houve uma maior ausência de informação sobre o tema da violência doméstica.

– Como os esforços estavam voltados a sanar os conflitos de informações voltadas para a saúde pública, pouco foi trabalhado sobre políticas públicas de prevenção à violência de gênero. Muitas mulheres não conhecem seus direitos e ficam reféns de uma situação da qual não sabem como sair.

*Mariana Ferreira Borges denunciou em 2019 ter sido estuprada por um empresário em dezembro de 2018, na cidade de Florianópolis (SC). No julgamento em primeira instância, o acusado foi absolvido e a vítima foi humilhada por advogados. Em 22 de novembro de 2021 entrou em vigor a Lei Mari Ferrer, que visa evitar constrangimentos durante audiências e julgamentos e punir agentes que causarem sofrimento desnecessário a vítimas de crimes de violência sexual.

A linha de frente no combate à violência contra a mulher

Deam – Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher | Polícia Civil

A Deam foi instituída em Santa Maria no ano de 2001, cinco anos antes da Lei Maria da Penha. Foi liderada pela delegada Débora Dias até março de 2019, quando a delegada Elizabete Shimomura assumiu a titularidade.

– Nós lidamos com questões da violência doméstica que vitimizam mulheres adultas, adolescentes ou idosas. Fora a questão da violência doméstica, a gente também instrui procedimentos ligados à violência sexual, assédio sexual. Temos um leque grande de delitos que são tratados pela Deam – afirma Shimomura.

A delegada relata que o ano de 2019 foi um ano difícil, não somente por assumir a Deam, mas por ser um ano em que ocorreram quatro feminicídios consumados em Santa Maria.

Foto: Eduardo Ramos (arquivo/Diário)

Conforme a Polícia Civil, compete à Deam, com exclusividade, prevenir, reprimir e exercer as atividades de polícia judiciária e de investigação criminal em relação a todas as infrações penais previstas na legislação criminal que sejam praticadas contra a mulher no contexto da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), ou em razão de menosprezo ou de discriminação à condição da mulher, bem como em relação às infrações penais contra a dignidade sexual das mulheres.

– Fazemos registros de ocorrências policiais, coletamos depoimentos de vítimas, testemunhas, acusados. Solicitamos por prisões, e as cumprimos. É uma operação que vai além da instrução de inquérito policial, que é a atividade fim – afirma a delegada titular Elizabete Shimomura.

A Deam está aberta para atendimento ao público de segunda à sexta-feira, das 8h30min às 12h e das 13h30min às 18h. Fora desse horário, as ocorrências de violência doméstica podem ser registradas na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) de Santa Maria, que atende 24 horas por dia. A DPPA está localizada na Avenida Nossa Sra. Medianeira, nº 91, junto ao Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp).

– A DPPA é a grande porta de entrada das ocorrências relacionadas à violência doméstica, pois funciona 24 horas, e muitas ocorrências geralmente ocorrem fora do expediente da Deam, ou no final de semana. A DPPA é uma grande parceira que temos – declara Shimomura. A delegada acrescenta ainda que as prisões em flagrante são todas feitas na DPPA, que é a origem de ampla maioria dos pedidos de medidas protetivas.

A Deam é coordenada pela Divisão de Proteção e Atendimento à Mulher (Dipam), Divisão da Polícia Civil responsável por coordenar, operacionalizar e fiscalizar as atividades destas delegacias especializadas e demais órgãos que lhe são subordinados, no âmbito do Estado. 

A Dipam, por sua vez, está vinculada ao Departamento Estadual de Proteção a Grupos Vulneráveis (DPGV). Este departamento atua em defesa de todos os Grupos Vulneráveis: mulheres, idosos, crianças e adolescentes quando vítimas em razão de sua condição, bem como de pessoas que figurem como vítimas de crimes de intolerância (discriminação ou preconceito) quanto à raça, cor, etnia, religião, procedência nacional, orientação sexual, identidade de gênero ou em razão de deficiência.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Patrulha Maria da Penha | Brigada Militar

O Programa Patrulha Maria da Penha (PMP) foi implementado pela Brigada Militar (BM) em outubro de 2012, com o objetivo de atender às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar no território gaúcho. A PMP atua durante a validade da medida protetiva, ou seja, a partir do momento em que é concedida pelo Poder Judiciário até decisão de extinção ou término do prazo. 

Em Santa Maria, a PMP surgiu no ano de 2015, e está sediada no 1º Regimento de Polícia Montada (1º RPMon), localizada na Rua Pinto Bandeira, nº 350, Bairro Nossa Senhora das Dores, Santa Maria. Atualmente conta com uma viatura e seis policiais especializados no atendimento a vítimas de violência doméstica e familiar.

Conforme o capitão Luiz Mário, responsável pela PMP em Santa Maria, a Patrulha Maria da Penha é uma patrulha policial criada para dar um pós atendimento às vítimas de violência doméstica.

– O atendimento da ocorrência de violência doméstica, em si, é feito pelo policiamento ostensivo. A Patrulha Maria da Penha atua em um segundo momento, como um suporte para aquela pessoa que sofreu a violência – afirma Luiz.

Conforme o capitão da Patrulha, desde 2015, ano de início das atividades, a PMP de Santa Maria atendeu 3.845 vítimas. Atualmente há cerca de 500 pessoas sendo acompanhadas pela PMP em Santa Maria e cidades próximas, como Itaara e São Martinho da Serra. Diariamente, a patrulha recebe cerca de oito a dez novas medidas protetivas e realiza uma média de 12 a 15 visitas.

O atendimento ocorre através da realização de visitas, as quais têm o objetivo de fiscalizar se as medidas protetivas de urgência estão sendo cumpridas pelo agressor/acusado, bem como verificar a situação familiar da vítima.

– A justiça manda as medidas protetivas para a Patrulha, que faz um cadastro da vítima, com seus dados e endereço, e as coloca em um planejamento para uma visita posterior. Nas visitas, verificamos como a vítima está, e checamos se o agressor se aproximou ou não. Caso positivo, levamos a vítima para fazer um registro do descumprimento da medida.

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