Cortes no orçamento da UFSM também impactam em serviços à comunidade

Eduarda Costa

Cortes no orçamento da UFSM também impactam em serviços à comunidade

No último ano, R$ 232,054 milhões deixaram de circular na economia de Santa Maria. O montante corresponde aos valores retirados das bolsas, salários e recursos de custeio da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Em uma projeção que considera que cada real investido gera cerca de quatro vezes mais verba na economia, a cidade estaria perdendo quase R$ 1 bilhão de investimento direto por conta dos cortes de verbas aplicados somente em 2021.

A diminuição refletiu no menor orçamento dos últimos 10 anos para manutenção da UFSM: R$ 119 milhões – sendo R$ 4,3 milhões ainda bloqueados. O valor necessário para custeio e investimento na instituição, considerando a inflação, seria de R$ 285,63 milhões. Frente ao orçamento, foram necessários cortes em inúmeros segmentos da instituição, incluindo o ensino e a extensão, pela primeira vez.

Com orçamento cada vez mais apertado, o reitor da UFSM, Luciano Schuch, ainda planeja novas readequações para 2022, incluindo o aumento valor da refeição do Restaurante Universitário (RU) e novas demissões de terceirizados.

— O que nós estamos discutindo hoje não é a universidade funcionar ou não, porque ela vai funcionar! Se tirar todo o orçamento da universidade, ela vai funcionar também. Deixaríamos de pagar as contas, mas ela funciona, e a aula vai ser dada. Só que, dessa forma, viramos um colégio, não seríamos mais uma universidade. Porque a universidade é feita de ensino, pesquisa, extensão, inovação e gestão, e no momento em que ficamos sem recurso, a gente vai dar aula, mas não só é isso que faz uma universidade. O nosso papel é transformar a nossa sociedade, e isso a gente fica adiando, adiando e adiando — desabafa o reitor.

Desde 2016, 269 Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) deixaram de atuar na universidade, seja por aposentadoria ou afastamento. Por norma do governo federal, essas vagas não podem ser repostas e foram extintas da universidade. A falta da força de trabalho sobrecarrega a demanda dos servidores e tira de circulação cerca de R$ 24,3 milhões em salários e benefícios.

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Redução de R$ 4,5 milhões em terceirizados

Faltam recursos para os serviços essenciais, como manutenção, limpeza e segurança. Em 2022, foram 98 demissões de servidores terceirizados. Com a falta desses salários, deixam de circular na economia local cerca de R$ 4,5 milhões em salários de terceirizados.

O serviço de vigilância, que era feito de forma fixa nos núcleos da UFSM, foram reduzidos em 63% e passaram a ser fixos apenas nas entradas, saídas e entornos, com exceção do Restaurante Universitário e da Casa do Estudante Universitário (CEU), que possuem dois vigilantes. Nas áreas centrais do campus, os funcionários passaram a ser volantes.

— Há dois anos, quem andava pela universidade já avistava vigilantes desde a Avenida Roraima. Agora, nós temos apenas vigilantes volantes. Mas que também vão precisar ser rediscutidos. Com certeza, vamos ter que fazer novos ajustes, e ainda estamos estudando quais vão acontecer. Mas, certamente, vai reduzir de novo portaria e vigilantes — informa o reitor.

Foto: Nathalia Schneider (Especial)

Nas portarias, houve redução de metade dos cargos. No Centro de Artes e Letras (CAL), por exemplo, de cinco portarias passaram a ser dois, que ainda devem ser reduzidas a apenas uma. As prioridades haviam sido definidas para prédios que prestam serviços à comunidade externa, como no caso do Centro de Ciências da Saúde (CCS), onde funcionam atendimentos de fonoaudiologia e fisioterapia, e havia necessidade de ter os funcionários terceirizados para receber e fazer o cadastramento dos pacientes. 

— A unidade de ensino nos solicitou, argumentando ser fundamental manter essas recepcionistas. Mas, agora, nós não temos como manter mais. Como nós vamos reestruturar esse serviço, eu não sei dizer, mas não conseguimos mantê-los mais — relata Schuch.

Restaurante Universitário

Foto: Nathalia Schneider (Diário)

A proposta para aumento do valor do custo da refeição no Restaurante Universitário (RU) para os alunos sem Benefício Socioeconômico (BSE) voltou a ser debatida nesta semana. A ideia, pretende diminuir o subsídio de 75% para 50% ou 25%, na tentativa reduzir o déficit de R$ 5 milhões causados pelo custeio da refeição aos estudantes, que possui valor de contrato de R$ 11,80, e custo de R$ 2,50 para os estudantes.

— É uma discussão muito difícil, porque vai impactar no momento em que o poder aquisitivo das famílias reduziu, e cesta básica disparou, o gás e a energia. E neste momento nós vamos ter que falar para o nosso estudante pagar mais para se alimentar. É difícil, mas é isso ou a universidade não funciona, ou vamos ter que tirar de outros serviços — desabafa Schuch

O custo para manter as refeições é de R$ 18 milhões, e o recurso disponível pela lei orçamentária é de R$ 13 milhões, os R$ 5 milhões de diferença vêm do orçamento da universidade. É justamente essa diferença que seria anulada com o aumento do custo para os estudantes. O valor do RU não é reajustado há mais de 20 anos.

O aumento do custo já afetou os servidores e técnicos que utilizam o RU, que pagam, agora, o valor integral do contrato: R$ 11,80. A decisão gerou uma economia de R$ 200 mil para universidade.  

Nesta semana, a proposta deve sair do gabinete e seguir para a Procuradoria. A previsão é que até a metade do mês de julho a proposta já esteja sendo discutida. Quem decidirá são os dois Conselhos Superiores: o Conselho de Curadores e o Conselho Universitário (CONSU).

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Cortes no Ensino e na Extensão

Foto: Nathalia Schneider (Especial)

Entre os princípios da gestão de Schuch, desde que fazia parte da última gestão como vice-reitor, era priorizar o tripé da universidade: a pesquisa, o ensino e a extensão, além de outros dois inclusos por ele, a inovação e a gestão. Porém, frente ao menor orçamento da década, os impactos dos cortes acabaram esbarrando no ensino e na extensão. A redução afetou as bolsas, tanto da graduação quanto da pós, os inúmeros projetos de extensão, como as incubações na Agittec, o Geoparque e a Orquestra Sinfônica, além dos eventos consagrados da UFSM como o Descubra e a Jornada Acadêmica Integrada (Jai).

Os projetos de financiamento ao ensino, pesquisa e extensão – Fundo de Incentivo à Extensão (Fiex), Fundo de Incentivo à Pesquisa (Fipe) e Fundo de Incentivo ao Ensino (Fien) – que contribuem para a melhoria e desempenho dos projetos desenvolvidos na UFSM foram impactados com corte de 15% nos recursos dos projetos. Somente na pós-graduação, 262 alunos de mestrado e doutorado perderam o benefício, somando R$ 5,5 milhões a menos por ano investidos em programas de pesquisa.

Dois exemplos conhecidos são a Orquestra Sinfônica da UFSM e o Geoparque em Caçapava do Sul. Em ambos, o número de alunos bolsistas foi reduzido. Na Orquestra, duas apresentações em eventos foram canceladas neste ano. No Geoparque, eram investidos anualmente quase R$ 300 mil em bolsas e deslocamento para pesquisas nas cidades da Quarta Colônia, que também foram cortadas.

— Por mais que a bolsa seja pequena e de valor baixo, de R$ 250 ou R$ 400, é a bolsa que esse aluno tem para comprar o pão ou o vale-transporte que ele precisa — explica o reitor.

De acordo com o reitor Luciano Schuch, também está em discussão a redução do período de duração das bolsas de iniciação científica dos projetos, de 12 para oito meses. Participações em eventos, congressos e eventos nacionais e internacionais também foram cortadas.

— Não estamos mais financiando com recurso próprio. Se os professores não conseguirem financiamento de um órgão de fomento, a gente não tem como mandar um professor ou um aluno para um evento — relata Schuch.

Descubra UFSM

Foto: Renan Mattos (Arquivo Diário)

Organizado anualmente desde 2014, o Descubra UFSM é um evento voltado para apresentar a instituição aos que planejam ingressar nos mais de 140 cursos de graduação. Sua realização tem custo total de R$ 200 mil, entre aluguéis das estruturas de estandes, lonas, bolsas de auxílio aos monitores e confecção e impressão de materiais de divulgação dos cursos. 

Na edição de 2022, pela primeira vez, os acadêmicos que se interessarem por representar seus cursos como monitores serão voluntários e não receberão a bolsa de auxílio.

— Pela primeira vez, não pagaremos bolsas aos monitores. Também vamos continuar fazendo uma parte online, não porque a gente quer, mas porque não temos dinheiro para fazer — explica Schuch.

Jornada Acadêmica Integrada

Foto: Pedro Piegas (Arquivo Diário)

A Jornada Acadêmica Integrada (Jai) é o maior evento acadêmico da UFSM, que promove a divulgação de trabalhos e estimula a participação acadêmica dos alunos de graduação e pós-graduação. Para 2022, o recurso para realização está limitado em 50%, e também terá que ser uma parte remota. 

— Não vamos conseguir pagar passagens diárias para os palestrantes virem presencial. Ou seja, não vai ter aquele contato com o palestrante, seja referência nacional ou internacional, que venha até a universidade — adianta Schuch.

Agittec

A Agência de Inovação e Transferência de Tecnologia (Agittec) é responsável por duas incubadoras de empresas tecnológicas da UFSM, que estimulam e auxiliam a operacionalização e de uma ideia de empresa inovadora.

Neste ano, pela primeira vez, participam da incubação 55 ideias com potenciais de virarem negócio, número quatro vezes maior que a média dos outros anos, que era de 13. O problema, como explica o reitor, é que faltariam estruturas para abrigar as sedes das possíveis empresas:

— Mesmo que apenas metade desses projetos deem certo e fossem para a incubação, nós não teríamos lugar para colocá-los, mesmo com espaço na Aggitec, eu não tenho como reformar os espaços que temos para abrigar eles. A gente teria que buscar parcerias, o que é bom, mas os nossos alunos que poderiam estar aqui conosco, estaríamos precisando colocar em outro lugar. 

Intercâmbios

Foto: Nathalia Schneider (Especial)

Para enviar alunos para estudar em outros países, a UFSM possui convênios de “cooperação acadêmica” com instituições internacionais. Assim, o mesmo número de alunos que vão da UFSM para intercâmbio vêm destas instituições estrangeiras para a universidade.

Por conta dessa “reciprocidade”, a UFSM costumava atender alunos estrangeiros em vagas da moradia estudantil, o que não está mais sendo viável. Por conta disto, a ideia é lançar um novo edital com 100 vagas para alunos de outros países acessarem à instituição como alunos regulares, sem ser como intercambistas:

— Cada vez mais, nossos alunos que entram na universidade demandam de moradia, pois estão em situação de vulnerabilidade social, o que é uma conquista nossa, trazer os vulneráveis para dentro da universidade. Então, os apartamentos possíveis estão sendo usados pelos nossos estudantes, e não temos como ceder mais vagas para os estrangeiros. Por isso, estamos lançando um edital sem a “reciprocidade” — explica o reitor.

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Eduarda Costa, [email protected]

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