Uma ação conjunta da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego com o Ministério Público do Trabalho (MPT-RS), a Polícia Federal (PF) e a Polícia Rodoviária Federal, resgatou mais de 200 trabalhadores em situação análoga à escravidão em vinícolas e cooperativas de Bento Gonçalves na serra gaúcha na noite de quarta-feira (22). Em entrevista à Rádio CDN 93,5 FM, a deputada estadual Laura Sito (PT), presidente da Comissão de Direitos Humanos na Assembléia Legislativa, que acompanhou a situação dos trabalhadores, relatou sobre o que encontrou no local e medidas que devem ser tomadas pelo Poder Público.
A ação começou após uma denúncia de um grupo de trabalhadores que fugiram do alojamento, onde sofriam diversos tipos de violência, como agressão e privação de refeições. A fiscalização de Caxias do Sul foi ao local para verificar a situação e encontraram um cenário de péssimas condições. Eram cerca de 215 trabalhadores em um alojamento pequeno, sem segurança, higiene, sofrendo ameaças, agressões com o uso de choques elétricos e spray de pimenta.
Cenário desumano
Em coletiva, o Ministério Público do Trabalho declarou que, durante esta semana, será designada audiência com a empresa terceirizada e com as vinícolas Aurora, Salton e Cooperativa Garibaldi. Além das três vinícolas, foi divulgado que 23 proprietários rurais – cujas identidades não foram reveladas – utilizavam os serviços dos homens resgatados. Em nota à imprensa, as vinícolas apontaram sobre o desconhecimento da situação, por essa parte ser prestada por uma empresa terceirizada. A deputada estadual Laura Sito conversou com alguns dos trabalhadores e conta que os relatos são assustadores. – A alimentação diária era mínima, existia multa por falta de trabalho de R$ 1,2 mil, além de pessoas trabalhando com pneumonia, mulheres grávidas, uma situação aterrorizante. O modelo terceirizado faz com que se perca o controle mais cotidiano com as formas de trabalho. Mas, não desresponsabiliza essas vinícolas, era responsabilidade delas acompanhar os trabalhos.
Muitos dos trabalhadores eram de outros estados, como a Bahia, mas também estavam nesse alojamento – cativeiro – indígenas e argentinos, por exemplo. A presidente da Comissão dos Direitos Humanos comenta que as investigações vão mostrar o caminho que levaram a esse cenário desumano:– A primeira etapa com esse caso é fechar o cativeiro, porque as notícias apontavam que estava fechado, mas quando cheguei lá, continuava funcionando. Inclusive, encontrei lá advogados dessa empresa terceirizada mobilizando os trabalhadores para ir para outro lugar se alojar.
Denúncias
Todos os trabalhadores resgatados estavam com vínculo empregatício com a prestadora de serviço Fênix Serviços de Apoio Administrativo de Bento Gonçalves, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A empresa atua na colheita da uva e transportando aves em aviários e prestava serviços a grandes vinícolas da região, como Aurora, Salton e Cooperativa Garibaldi. O administrador da empresa, Pedro Augusto Oliveira de Santana, chegou a ser preso durante a operação. Porém, já foi liberado, após pagar fiança no valor de R$ 39.060.
De acordo com a parlamentar, o alojamento, que funciona desde 2018, está aparentemente com a documentação em dia, já teve duas atuações por não cumprir as normas sanitárias, por isso não poderia estar funcionando.– É preciso afinar o trabalho do Ministério Público, do Poder Público e da própria Comissão de Direitos Humanos, para fiscalizar, passar um pente-fino e fazer um mapa dessas cadeias produtivas do Estado, por exemplo da colheita da maçã. É um cenário delicado e vamos precisar de um olhar atento e humano para fazer isso.
O MPT-RS também foi chamado a auxiliar nos trâmites de regularizações e na negociação com empregadores para pagamento de verbas rescisórias e garantia de transporte de retorno para os trabalhadores, a maioria da Bahia.