Deni Zolin

O que pode acontecer com clientes que não receberam imóveis da Conceitual

O que pode acontecer com clientes que não receberam imóveis da Conceitual

Foto: Alan Orlando (Diário)

No sábado (20), as vítimas lesadas criaram uma associação para cobrar resoluções.

Angústia e revolta são sentimentos comuns entre os cerca de 1,1 mil clientes da Conceitual Construtora, de Santa Maria, que pagaram quantias entre R$ 200 mil e R$ 1 milhão, mas ainda não receberam os imóveis. Após ficarem sabendo do problema, outras sensações tomam conta de muitos: a de impotência e a de incerteza. Afinal, diante de vários possíveis desdobramentos jurídicos, não sabe se conseguirão morar no tão sonhado imóvel já pago ou se terão de volta ao menos parte do que pagaram. E mais: não fazem ideia de quando esse pesadelo vai acabar. Até porque, se a disputa for parar na Justiça, pode levar anos ou até mais de década para o imbróglio ser resolvido. 

Mas afinal, o que pode acontecer daqui para a frente? Para tentar esclarecer essas dúvidas, o Diário procurou um advogado especializado em recuperação de empresas e processos de falência. Segundo Carlos Alberto Becker, do escritório Bochi Brum e Zampieri Advogados, que defende algumas das vítimas da Conceitual, ainda não se sabe qual medida a construtora vai tomar. A lei prevê algumas alternativas, parte delas com solução, teoricamente, mais rápida, e outras mais demoradas. Becker lembra que a lei de falências trata das empresas em crise econômico-financeira e prevê três alternativas.

+ Receba as principais notícias de Santa Maria e região no seu WhatsApp

As três possibilidades previstas em lei:

1ª opção: recuperação extrajudicial

A primeira delas é a recuperação extrajudicial, em que a construtora tenta entrar em acordo direto com os credores (funcionários, fornecedores, bancos, clientes) para seguir com as atividades e tentar entregar os apartamentos prometidos nos quatro prédios inacabados. Uma vantagem seria a solução, em tese, mais rápida, pois uma negociação direta evitaria a demora da Justiça, como numa recuperação judicial, em que há toda uma tramitação.

 — Na recuperação extrajudicial, o objetivo é continuar com as atividades, mantendo os funcionários e os contratos de compra e venda dos imóveis. Quem seriam os credores? Seriam os fornecedores, os trabalhadores, instituições financeiras, eventuais multas contratuais, de modo que os contratos com os compradores para entrega das unidades deveriam ser cumpridos. No momento que a empresa identifica que essa negociação com esses credores resolve o seu problema, para o fim de concluir as obras e entregar as unidades, poderia ser considerada uma alternativa – diz o advogado. 

Uma negociação direta seria mais fácil, principalmente, para os dois prédios que já estão quase prontos. Nesse caso, faltaria pouco para a construtora concluir e entregar os imóveis. Porém, no caso da Conceitual Construtora, há algumas peculiaridades que podem dificultar uma possível recuperação extrajudicial, como o fato de que parte dos apartamentos teriam sido vendidos para mais de um comprador, segundo os relatos deles. Num dos prédios, são 138 apartamentos e haveria mais de 200 compradores. Dessa forma, o que fazer com quem teria pago e ficaria sem imóvel? Se houvesse acordo entre todos, uma saída seria entregar os 138 apartamentos e, para ressarcir quem ficaria sem imóvel, vender algum outro bem da construtora ou dividir o prejuízo entre quem conseguiu apartamento, pagando um valor aos que ficaram sem.

2ª: recuperação judicial

Outra saída possível, prevista pela legislação, seria a recuperação judicial, que pode ser pedida pela empresa para obter um prazo para negociar e pagar as dívidas, evitando o fechamento da empresa. Nesse caso, se receber o aval da Justiça, a construtora poderia tentar concluir e entregar os quatro prédios. Mas também não há uma garantia de que isso será possível. 

– No caso da Conceitual, há promessas de compra e venda dos imóveis, pelo que se tem conhecimento. Há empreendimento que está praticamente concluído, então poderia continuar e concluir a obra. Mas quando se chega a uma situação que não há mais viabilidade de continuar com negócio e concluir as obras para entregar, pode tanto a empresa quanto algum credor pedir a falência, desde que preenchidos requisitos legais – diz Becker.

3ª: falência

Em um eventual pedido de falência, o advogado lembra que os desdobramentos vão depender de cada caso.

– Tem construtoras que registram o chamado patrimônio de afetação, em que esse empreendimento (prédio) vai responder pelas dívidas dele mesmo, sendo que os compradores poderão, inclusive, assumir e concluir a obra. Por outro lado, há empreendimento com registro de incorporação, onde, em que pese se tratar de patrimônio comum, os compradores também poderão assumir, por meio da instituição de condomínio de construção, e concluir a obra. Tem um prédio que só falta o habite-se, então poderia o administrador judicial, em caso de falência, cumprir os contratos, com a escrituração do imóvel em favor dos compradores adimplentes – diz. 

Outra hipótese é fazer com que os prédios em fase inicial e seus terrenos, assim como outros imóveis em nome da construtora ou da família de sócios, sejam colocados à venda para pagar as dívidas da empresa. Mas esse processo é demorado e burocrático, pois primeiro seria preciso nomear um administrador judicial para analisar toda a situação da construtora e dos imóveis. Depois, pedir autorização da Justiça para leiloar eventuais prédios e bens, para usar o dinheiro obtido para pagar todos os credores, de forma concursal (na ordem definida pela lei). E aqui vale destacar o deságio no preço normalmente aplicado na venda judicial dos bens, bem como o custo do processo de falência. Daí, a lei prevê uma lista de prioridades. Vão receber primeiro os funcionários, que têm direitos trabalhistas. 

Na sequência, devem ser pagos credores que tiverem contratos em que foi incluída a chamada garantia real, em que a construtora se comprometeu a quitar débitos com bancos ou fornecedores, por exemplo. Em terceiro lugar, devem ser pagos tributos e, só depois, os demais credores comuns (fornecedores de materiais de construção e serviços e compradores dos imóveis), que entram numa mesma categoria. A vantagem do processo de falência seria o aval da Justiça para buscar uma forma mais justa de dividir os bens que restaram e pagar todos os credores. As desvantagens seriam a demora do Judiciário e, para os compradores dos imóveis, o fato de ficar para o fim da fila de recebimento. É difícil prever o que realmente irá acontecer. Tudo dependerá do que a Conceitual decidirá fazer e se algum credor pedirá ou não a falência da empresa. Até o fechamento desta reportagem, os advogados da Conceitual Construtora não haviam informado se pediriam ou não recuperação ou falência.

Leia mais

Possível estelionato

A possível venda de um mesmo apartamento para mais de um comprador, que foi relatada por vítimas da Construtora Conceitual, pode caracterizar estelionato. Há registro policial. 

– Numa hipótese de recuperação judicial, no início do processo, o juiz pode determinar a constatação prévia, em que ele nomeia perito para verificar se o empresário não está usando da recuperação judicial de forma fraudulenta. Não quero fazer juízo de valor, mas essa questão criminal, de um eventual estelionato pela venda em duplicidade dos imóveis, pode inviabilizar a continuidade da recuperação – diz Carlos Alberto Becker.

Quem ocupou o prédio terá de sair

Em dois dos prédios inacabados da Conceitual, já há famílias morando. Apesar de serem pessoas que pagaram pelo imóvel, isso não dá o direito a elas de ocupá-lo antes da conclusão e de saírem habite-se e escritura. Como o caso pode acabar na Justiça, é possível que esses imóveis sejam vendidos para pagar credores. 

– Aparentemente, eles não têm a propriedade, mas estão na posse do imóvel. Demonstrada a irregularidade da posse, pode ser pedida a desocupação do imóvel – diz Becker.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Prefeitura de Santa Maria entrega estudo para tentar retomar voos a São Paulo Anterior

Prefeitura de Santa Maria entrega estudo para tentar retomar voos a São Paulo

Exército reduz área desmatada de 180 para 90 hectares para nova ESA Próximo

Exército reduz área desmatada de 180 para 90 hectares para nova ESA

Deni Zolin