pacientes de manaus

Com alta dos pacientes, familiares que atravessaram o país por conta própria planejam o retorno

Leonardo Catto

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Pedro Piegas (Diário)

Alívio é a palavra mais falada sobre a alta de 12 pacientes de Manaus que tiveram o tratamento da Covid-19 no Hospital Regional. E não se falaria em alívio se não houvessem outros sentimentos, como medo, nervosismo e saudade. Os 15 manauaras que pousaram em Santa Maria em 2 de fevereiro não podiam estar acompanhados por determinação do Ministério da Saúde. Porém, para tentar aliviar esses sentimentos, cinco familiares desses pacientes viajaram por conta própria até Santa Maria. Esse foi o começo de histórias de pessoas que moravam na mesma cidade e não se conheciam, mas se aproximaram depois de atravessar o país e percorrer 4.376 km.


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O pastor João de Souza Simões, 58 anos, é um dos pacientes que vai voltar para casa hoje, no voo com embarque previsto às 11h30min. Ele ficou no mesmo quarto que outros três pacientes, em uma ala isolada somente para os manauaras, no Hospital Regional. No leito ao lado, estava o pintor automotivo Lee Jekysn Silva Ramos, 41 anos.

Simões mora na zona norte da Capital amazonense, no Bairro Colônia Terra Nova. Já Ramos mora no Bairro São Francisco, na Zona Sul. De um bairro a outro, um aplicativo de mobilidade aponta 25 minutos de carro. O voo que trouxe Simões e Ramos ao Rio Grande do Sul levou cerca de 5 horas. A vinda foi em uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB). A volta, organizada pelas secretarias da Saúde gaúcha e amazonense e o Ministério da Saúde, será em voo comercial. Duas semanas depois de chegar, Simões leva para casa uma bagagem além de malas.

- É uma experiência que Deus preparou para esse momento, de conhecimento e relacionamento entre amigos. É sobrenatural aquilo que os profissionais se dedicaram para aprender. Se a gente não tivesse vindo para cá, sei lá... Mas, aqui, nós recebemos tratamento de qualidade - agradece.

A fé não precisou mover os montes que circundam Santa Maria para manter o otimismo do pastor. Com a Bíblia, ele mantinha as preces em dia enquanto esteve internado.

O apoio também se deu com os companheiros de quarto. Ramos exalta o companheirismo que se formou entre os pacientes. Segundo ele, o sentimento na chegada causava um susto por não conhecer ninguém. Contudo, isso pôde ser superado, e a alegria maior é poder voltar.

- Estou feliz de ver minha família. Mudou minha vida. Eu trabalhava, tinha minha casa, meus pais, meus irmãos - destaca, elencando as saudades.

A recuperação foi progressiva. O alívio mesmo foi com o "certificado de alta" entregue aos pacientes na segunda-feira. No mesmo dia, o único pedido que Simões fez à família foi para ajudar a acabar com a saudade quando chegar em Manaus. A solução para isso é simples. Para o pastor, basta a companhia e um caldo de sambaqui com bastante verdura.

LEITOS
Os manauaras tinham condição de alta desde o começo da semana. Conforme o diretor técnico do Hospital Regional, Mery Martins Neto, caso fossem necessários leitos, e os pacientes ainda estivessem lá, seria responsabilidade do Estado realocá-los.

Foi preciso atravessar o país e, depois, a cidade
A filha caçula de Simões, Ana Karolina Almeida Simões, 27 anos, não tinha nem recebido o salário do mês quando o pai embarcou no voo para Santa Maria. Mesmo assim, ela sentia que precisava viajar até o centro do Rio Grande do Sul. A nutricionista se licenciou oficialmente do cargo no Hospital 28 de Agosto, mas ainda não sabe se vai conseguir retomá-lo quando voltar.

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Arquivo Pessoal
Da direita para esquerda, João de Souza Simões com as filhas Suelen Carolina Almeida Simões, 31 anos, Ana Karolina Almeira Simões, 27 anos, e a esposa, 61

Ela partiu da Capital amazonense graças a uma passagem bancada com ajuda de amigos e familiares, em 3 de fevereiro. A demora na decolagem a fez chegar em Porto Alegre mais tarde do que previa. De ônibus, ela só chegou em Santa Maria no dia 4.

Ao chegar, outro problema surgiu. A informação que ela tinha, a partir da Secretaria da Saúde do Amazonas, era que seu pai iria para o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm). Foi por isso que ela reservou um quarto em uma pousada próximo à Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Apenas quando chegou no Husm, soube que o pai estava no Hospital Regional. Depois de atravessar o país de Norte a Sul, ela precisou cruzar Santa Maria de leste a oeste.

- Quando surgiu a possibilidade de vir, foi questão de horas, para decidir. Aí foi uma correria. Fui correr atrás da minha passagem mesmo com ele não querendo que eu viesse - lembra.

Agora, a gratidão é a principal lembrança que leva da cidade:

- Não tenho o que reclamar, somente agradecer por uma cidade que nos acolheu tão bem. O hospital mesmo, com cartazes, as bandeiras. Quem trabalha na saúde precisa ter amor pelo que faz. Aqui a gente pôde ver que o trabalho foi por amor.

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Arquivo Pessoal
Lee Jekysn Silva Ramos (à esquerda), com a filha Emilly Isabelle, 14 anos, e a esposa Valéria Soraya de Oliveira, 37


Expectativa pela volta "com calma"
Enquanto Simões e Ramos estavam no hospital, e Ana Karolina descobria o quão longe o Hospital Regional é do Bairro Camobi, a esposa do segundo chegava em Santa Maria, no dia 5. Graças a uma amiga, a funcionária pública Valéria Soraya de Oliveira, 37 anos, tinha onde ficar na cidade. O lugar que a acolheu foi um apartamento no Bairro Camobi. Simões e Ramos fizeram o meio de campo para que as familiares pudessem se encontrar. Assim, as duas se conheceram e seguem juntas até o retorno para Manaus.

- Ela tinha que ficar comigo, estamos juntas nessa situação e acabamos compartilhando a aflição e a alegria - conta Valéria.

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Arquivo Pessoal
Ana Karolina e Valéria viam os familiares no Hospital Regional apenas por uma janela

As duas conseguiam ir até o hospital. Para as visitas, os pacientes eram levados até uma janela, onde podiam se ver, mesmo que separados pelo vidro e uma tela.

Valéria sentiu o efeito direto do colapso do sistema de saúde do Amazonas. A situação que se impôs à família determinou a escolha na hora de aceitar a transferência para o Sul.

Depois de provar "xis", as novas amigas ainda esperam a chance de apreciar o churrasco gaúcho. Pela gratidão, Santa Maria pode estar na rota quando for possível viajar novamente:

- Espero, quem sabe logo, voltar só para passear.

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