série pedofilia no esporte

Rede de acolhimento que Santa Maria oferece as vítimas de violência sexual é falha, dizem autoridades

Naiôn Curcino e João Pedro Lamas

Foto: Renan Mattos (Diário)

SÉRIE PEDOFILIA NO ESPORTE

A delegada Luisa Sousa, titular da Delegacia de Proteção a Criança e Adolescente  (DPCA) é franca ao dizer que a rede de acolhimento que resolveria problemas como esse, apesar de existir, é fraca. A Polícia Civil começa a atuar quando crime já aconteceu, afinal, tem natureza investigativa. No entanto, trata do âmbito penal. É, muitas vezes, a porta de entrada, junto da Brigada Militar (BM), na rede. É necessário que essas vítimas recebam tratamento físico e mental, o que Santa Maria não parece estar preparada para dar.

A DPCA, por exemplo, conta com um projeto de extensão da Faculdade Integrada de Santa Maria (Fisma), que oferece psicólogos que se responsabilizam pelo acolhimento das vítimas. Mas não há um servidor público da área lotado na delegacia que possa fazer esse atendimento sempre - a dependência de terceiros é constante.

Ainda, esses psicólogos, apesar de fazerem um trabalho fundamental na avaliação da polícia, não tapam o buraco que existe. Eles fazem de três a quatro sessões individuais com as vítimas ao longo tempo enquanto a polícia precisa que elas estejam próximas, para coleta de provas, e depois terão de buscar atendimento em outro lugar, o que nem sempre acontece - entre os motivos, falta de informação ou de dinheiro. O tratamento psicológico, na avaliação dos profissionais que fazem o acolhimento, muitas vezes precisa prosseguir por uma vida inteira. Vale lembrar que o tratamento psicológico é confidencial, e as informações que surgem durante ele não são divulgadas para ninguém - nem mesmo para a polícia. O foco é tratar a vítima, e não coletar provas.

A assistência social do município não oferece tratamento psicológico para crianças vítimas de abuso sexual de forma efetiva. Faltam profissionais e falta estrutura. Acaba que, por mais absurdo que seja dizer, a vítima precisa buscar um tratamento particular (em 2018, houve o chamamento de 11 profissionais para atuar nos Caps, Centros de Atendimento Psicossociais, mas para áreas diversas). Caso a vítima não tenha condições financeiras de arcar com isso, fica sem atendimento ou precisa buscá-lo via judicial.

Os esforços do poder público são investidos, principalmente, na prevenção. Há campanhas junto à rede de educação, mas elas ainda são tímidas. Por esse motivo, em todo o Estado, a Polícia Civil tem organizado o que chamaram de "Papo Responsa", que é quando policiais civis vão até as escolas para conversar - e "conversar" é uma palavra-chave.

Isso porque ele é estruturado de forma a não ser uma palestra, mas uma roda de conversas, onde o assunto é tocado de forma superficial, descontraída, em um primeiro momento, para então ser aprofundado, e incentivar crianças e adolescentes a denunciarem se souberem de alguém passando por violência sexual ou se sentirem seguros para falar se eles próprios estiverem passando por isso.

A responsável pela Vigilância da Violência da Secretaria Municipal de Saúde, Ingrid Amaraim, relata que recebe os casos de violência a partir do Conselho Tutelar, por exemplo, e faz o repasse para o Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), que conta com o serviço dedicado exclusivamente para vítimas de violência sexual. E acaba aí o que o município pode fazer por essas pessoas.

A JUSTIÇA

Foi por esse motivo que o Ministério Público (MP), por meio da Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude, ingressou com ações judiciais contra o município. A ideia é que o Executivo municipal estruture seus serviços de forma que preste o atendimento às vítimas de forma satisfatória.

Hoje, Santa Maria conta com um Centro de Atendimento Psicossocial Infantil (Capsi). O município está dentro da lei, pois é necessário um Capsi para cada 200 mil habitantes.

A cidade, segundo dados de 2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), conta com 280.505 habitantes. No entanto, conforme a opinião dos entrevistados até aqui, um só não é o suficiente.

- A proteção à criança tem que ser o mínimo? É dever da sociedade, do Estado e da família priorizar a criança. Sabemos das restrições de orçamento, mas é necessário priorizar. A rede (de saúde) não é compatível, o município não é tão rico quanto gostaríamos, ações judiciais oneram os municípios e atrasam a prestação de um serviço, mas é necessário conversar para viabilizá-lo de alguma forma - afirma o promotor Ricardo Lozza, responsável pela Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude.

Lozza diz que Santa Maria precisa de um Capsi "extremamente bem equipado", que não ter psiquiatra em turno integral é um problema, e sinaliza que há deficiências também nos Conselhos Tutelares, cuja estrutura não seria o suficiente para dar conta da demanda. Ele reitera que a rede de educação, muitas vezes, é a denunciante de possíveis casos de abuso que estão ocorrendo com estudantes.

Uma das ações judiciais é para que a cidade ofereça atendimento psicológico específico para crianças e adolescentes vítimas de violência sexual. Outra é para que a vítima tenha garantia de atendimento reservado e prioritário nas unidades de saúde, para que assim não precise enfrentar filas por exemplo.

Em 2017, houve ação contra o Estado, determinando que houvesse uma reorganização na rede de forma que uma conexão entre todos os serviços de atendimento fosse estabelecida. Com isso, equipes do Matriciamento, Conselho Tutelar, DPCA, Centro de Referência da Assistência Social (Cras), Secretaria de Desenvolvimento Social, Saúde e 4ª Coordenadoria Regional de Saúde (4ª CRS) têm se reunido de forma a discutir "a efetiva implantação da rede de acolhimento".

A ideia é que a criança, ou adolescente, seja atendida e não seja "perdida" antes de fechar o ciclo de tratamento. Além disso, se busca que esses órgãos dialoguem entre si de forma a poupar a vítima de mais sofrimento, como no caso de ter que repetir sua situação a cada encontro com uma nova autoridade do poder público. Um exemplo é a criação da sala especial, no Husm, na qual um psicólogo e um assistente social fazem perguntas de forma a tentar traduzir, em uma linguagem mais humana, menos violenta, para essa criança, a demanda policial, que visa colher elementos de prova.

Uma lei federal, inclusive, de número 13.431/2017, deu a possibilidade da criação, junto ao SUS, de serviços de atenção integral voltados para situações de violência contra crianças e adolescentes.

COMO DENUNCIAR OU PEDIR SOCORRO

Há diversas formas de pedir ajuda, tanto para crianças - meninos ou meninas -, quanto para adultos, homens ou mulheres, vítimas de abusos sexuais ou estupros

Conselho Tutelar

Centro - (55) 3223-3737 e (55) 9973-6674 

Leste - (55) 3217-7790 e (55) 9603-2022 

Oeste -  (55) 3212-5410 e (55) 9972-9638

Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente 

  • (55) 3221-0459

Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher 

  • (55) 3222-9646

Delegacia de Pronto-Atendimento 

  • (55) 3222-2858

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