Retorno de chuvas intensas antecede o início da primavera, que será marcada pelo fenômeno El Niño

Bernardo Abbad e Nathália Arantes

Foto: Nathália Schneider (Diário)

O último fim de semana que antecedeu o início da primavera contou com a presença do sol, vento norte e temperaturas altas em Santa Maria e Região Central. Diferentemente do cenário observado durante a última semana, quando os altos índices das chuvas entraram para os registros históricos do mês de setembro, a condição atmosférica fez o termômetro registrar 35,7°C no domingo santa-mariense, a maior temperatura deste inverno.


Porém, ainda sob a influência do El Niño, o tempo já muda na segunda-feira, dia 18, no Estado, devido à uma frente fria. Conforme a BaroClima Meteorologia, em Santa Maria a segunda-feira será abafada e com predominância de vento norte até o início da tarde. Já a chuva retorna com pancadas de maior intensidade em municípios como Rosário do Sul, São Gabriel, São Sepé e Caçapava do Sul.


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O meteorologista Gustavo Verardo, da BaroClima, adianta que a chuva desta semana deve ser expressiva, porém não tão volumosa como a anterior, que chegou a marcar 200mm em 48 horas em alguns municípios. Apesar da previsão ser de menores acumulados, Verardo destaca que, por consequência do curto período de tempo entre os dois eventos climáticos, a atenção deve ser mantida para os possíveis transtornos:

– Existe risco de transtorno para esta semana pelo fato de o solo já estar saturado. Como uma esponja, quanto mais água você coloca nele, menos ele absorve. Agora, qualquer água, depois do que tivemos na semana passada, podemos ter um repique de cheias e enchentes. Então é alerta total para essa condição a partir da terça-feira – destaca.

A previsão é que a partir da terça-feira, o sistema avance mais ao norte do Estado, com potencial para chuvas volumosas e trovoadas. A BaroClima alerta para possíveis transtornos, sobretudo nas cidades já atingidas com as enchentes na semana passada. Entre terça e quinta-feira, os acumulados podem se aproximar dos 100mm, com a possibilidade de queda de granizo novamente na região.

A partir da sexta-feira, a instabilidade perde força devido ao afastamento da frente fria. No entanto, o tempo ainda não firma por completo. As temperaturas durante as tardes tendem a ficar amenas por conta da chuva, sem o calor intenso de domingo, por exemplo.


PRIMAVERA


Caracterizada como estação de transição, a primavera chega ao hemisfério sul em 23 de setembro. Apesar da floração ser o principal símbolo, este ano, as chuvas ganharão destaque. Após três anos com o La Ninã influenciando um tempo mais seco, em 2023, a primavera será marcada pela umidade causada pela atuação do El Niño.

– Apesar da primavera astronômica, com o alinhamento da Terra com o sol, começar apenas no dia 23, a gente já teve o início da primavera climática no início do mês. Desta vez, com muita umidade e chuva decorrente do fenômeno El Niño, que deve seguir até maio do ano que vem – explica Verardo.

O meteorologista Murilo Lopes, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), explica que há um impacto direto da condição de aquecimento do Oceano Pacífico no regime de chuvas no Brasil, especialmente na Região Sul. Existe uma correlação entre o quão quente ou frio está em relação à média da água superficial no Oceano Pacífico Equatorial. Quando há o assoreamento das águas, ocorre o La Niña, porque as águas estão mais frias. Porém, quando as águas estão mais aquecidas, surge a condição para El Niño.

– Temos a presença de um gradiente maior de temperatura na Região Sul e países vizinhos, o que intensifica o contraste de massas de ar e gera condições favoráveis para muita chuva e tempestades no Estado. Então, basicamente, esse é o impacto do El Niño. Temos esse aporte de umidade mais contínuo para o sul do Brasil, ao mesmo tempo que há um contraste de temperatura aumentado. E existe uma frequência maior também na formação de ciclones, que tipicamente se formam na parte oceânica, mas eles empurram as frentes frias para o sul do Brasil com maior intensidade.

Primavera não só de flores: em Dona Francisca, um ponto de alagamento causado pelas chuvas fez com que pelo menos 10 pessoas deixassem suas residências de maneira preventiva na última semanaFoto: Nathália Schneider (Diário)


O El Niño tende a ganhar mais força na primavera, já que o pico do fenômeno ocorre durante a estação das flores no Hemisfério Sul. Segundo Murilo Lopes, as águas do Pacífico devem aquecer ainda mais, e o impacto deve continuar:


Então podemos esperar uma primavera com mais chuva e até mesmo tempestades, o que também contribui com esse escoamento de norte mais frequente, gerando dias mais quentes. Deve ser uma primavera em média mais quente e bem mais chuvosa.


O meteorologista aponta que teremos chuva acima da média em praticamente todos os meses da estação o que, consequentemente, deve agravar as condições de cheias, uma vez que os rios já estão com volumes bastante elevados de água. Essa condição deve se manter e até mesmo se agravar a longo prazo.


Murilo Lopes aponta que, para além do El Niño, as chuvas têm sido cada vez mais intensas e frequentes também devido ao aquecimento global:

2023 está sendo o ano mais quente já registrado e, em consequência disso, temos um planeta com oceanos e continentes muito aquecidos. Dessa forma, há maior evaporação e, ao mesmo tempo, a atmosfera, por estar mais aquecida, ainda consegue suportar vapor d’água. Quando temos essa grande disponibilidade de água na atmosfera, surgem as situações para eventos potencialmente favoráveis à precipitação intensa.


FUTURO

Conforme o meteorologista da UFSM, as chuvas extremas serão mais frequentes. E quando elas ocorrerem, serão grandes acumulados em curtos períodos, como se chovesse muito em um intervalo pequeno de tempo.


E o El Niño deve se estender pelo menos até o começo do outono, o que ocasionará um verão de mais chuvas e não seca, como nos últimos anos.


Contudo, Lopes aponta que o El Niño não deve perdurar, haja vista que é um fenômeno que raramente dura dois anos.


– Mas, independentemente, a condição de chuvas intensas é piorada pela questão de aquecimento global, então é sempre importante pensar que a sociedade tem que estar preparada para essas situações e saber como reagir quando estiver diante de eventos climáticos como esses que têm ganhado força.


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