Bicentenário da imigração: como Agudo preserva a história e a cultura alemã

Bicentenário da imigração: como Agudo preserva a história e a cultura alemã

ICBAA (Divulgação)

Sede do ICBAA em Agudo, casa em estilo enxaimel.

Corria o ano de 1824 quando os primeiros 38 imigrantes alemães chegaram à Província de São Pedro do Rio Grande do Sul – nome do atual Rio Grande do Sul que, na época, vivia sob período Imperial. Era 25 de julho, quando as famílias foram instaladas na antiga Real Feitoria do Linho Cânhamo, que deu origem, mais tarde, ao município de São Leopoldo. 

O ano de 2024 marca o bicentenário da história de um povo que deixou tudo para trás, atravessou o Atlântico e veio colonizar terras gaúchas. Seja na dança, na música, na culinária e até mesmo na alegria, há muito dos traços alemães no cotidiano das cidades. Depois da primeira leva de imigrantes – que colonizou as margens do Rio Caí e dos Sinos – colonos oriundos principalmente da Pomerânia (região norte da Alemanha) desbravaram outras terras.


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​Foi o caso das famílias Poetter, Neujahr, Fiss, Holz e Finger, que chegaram na localidade de Cerro Chato, às margens do Rio Jacuí, em 1857. A colônia, que décadas mais tarde se oficializaria como Colônia de Santo Ângelo, deu origem ao município de Agudo. Dori Laura Muller Paul, presidente da Comissão do Bicentenário da Imigração Alemã em Agudo, conta que cerca de 70 pessoas vieram nessa primeira oportunidade. Outros imigrantes foram chegando ao longo dos anos, até 1904

Aos poucos, casas em estilo enxaimel coloriram os morros da Linha dos Pomeranos, Picada do Rio, Linha Boêmia, Porto Alves, Várzea do Agudo e Nova Boêmia. Essas localidades, do interior do município, concentram, atualmente, a maior parte dos descentes germânicos. A estimativa, conforme Dori, é que pelo menos 65% dos 16 mil habitantes do município tenham algum tipo de relação com os antigos imigrantes. 

A cidade, que respira tradição e cultura, também fala o idioma alemão. Segundo a presidente do Bicentenário, ainda há, no interior do município, moradores que falam somente a língua alemã. 

– No comércio, por exemplo, é bem comum que, na hora de contratar pessoas, um dos pré-requisitos seja entender o alemão – afirma Dori. 

Outros, assim como ela, aprenderam o português somente quando começaram a frequentar a escola. Dori, que tem 73 anos, é descendente das famílias Müller, Grützmacher, Valster, Rehbein, Petzold, Kilian, Hoffmann, Eisslöffer, sendo filha de comerciantes. Seus bisavós paternos e maternos vieram da Alemanha para enfrentar a crise do desemprego:

– Eu lembro que uns dias antes de eu ir pro colégio, meu pai me chamou e me ensinou o básico do português: bom dia, boa tarde, por favor, obrigada. Mas apesar de aprender na escola, entre nós, crianças, conversávamos sempre em alemão, era muito comum na época. 

Atualmente, o alemão é ensinado em escolas municipais. Segundo a secretária de educação, Andressa Hoffmann, três escolas possuem a Língua Alemã como disciplina do currículo: a Emef Três de Maio, a Emef Santos Reis e a Emef D. Pedro II. Alunos do Ensino Fundamental, do 4º ao 9º ano, aprendem a escrever e a falar alemão. A proposta, de acordo com a secretária, era que todas as escolas oferecessem o ensino, no entanto, há falta de professores na área. 


O Enxaimel ou Fachwerk

Além do dialeto, a cultura germânica está presente na arquitetura das residências, nas chamadas casas estilo Enxaimel ou  Fachwerk (em alemão) – técnica em que as paredes são erguidas com vigas de madeira posicionadas na vertical, horizontal e diagonal, formando uma espécie de treliça. A sede do Instituto Cultural Brasileiro-Alemão de Agudo (ICBAA) é um exemplo de uma casa que foi trazida do interior e reconstruída para representar o estilo arquitetônico dos primeiros imigrantes.

A Casa da Charlote, como é chamada, foi inaugurada em 2021 e seu estilo é datado no início do século 20. O ICBAA preserva hoje um museu e uma biblioteca com livros em alemão e português e é, segundo a direção, um dos mais completos repositórios da cultura germânica da região. 

– Ao entrar na Casa da Charlote, muitos visitantes lembram a casa de seus avós ou bisavós. O ambiente, o mobiliário, as paredes, o assoalho, o forro e a disposição das peças na casa remetem a sentimentos que emocionam – afirma Rosangela Rohde Wilhelm, presidente do ICBAA. 

Sede do ICBAA em Agudo. ICBAA


Culinária

Linguiça cozida, salada de batata, marreco e pato assado, bolinho de carne, café colonial e, é claro, a tradicional cuca mantêm viva a tradição alemã no município. O costume é tão arraigado que motivou a criação de empreendimentos fofocados na valorização dessa tradição. É o caso da padaria Ki Delícia, que existe desde 1986 e preserva receitas originais alemãs. A receita do Mürberteig, por exemplo, é mantida a sete chaves por Fabiana Roos Temp, 48 anos, filha da fundadora da padaria. O Mürberteig é uma massa crocante que pode ou não incluir o recheio, e é um dos pratos mais tradicionais da padaria, ao lado das cucas. 

Mürberteig com nata e morangos.Padaria Ki Sabor


– As cucas, por exemplo, apesar de inovarmos os sabores com ingredientes que temos hoje, ainda mantemos as tradicionais também, como a de Frischkäse, que é o requeijão em alemão, e com as frutas da época – afirma Fabiana. 

As receitas ultrapassam gerações e, hoje, a neta Laura Ana Temp, 19 anos, também cuida da empresa familiar.


Schuälmer - a cultura nos passos da dança

Em Agudo, grupos de três categorias diferentes preservam a tradição das danças alemãs. O projeto, financiado pelo município, oferece aulas semanalmente na sede da ICBAA. O objetivo é propagar danças típicas, como a Tschu tschu wa - Die Eisenbahn - tradicionalmente ensinada às crianças, a Französischer reigen e a Schuälmer, a principal delas, uma dança com giros, valsas e polkas. 

A professora Graciele Caroline Karkow conta que o projeto existe desde 1992 e funciona com grupos nas categorias infantil, juvenil e adulta. Todos participam de eventos e competições na cidade e também no Estado. Qualquer cidadão agudense pode participar, desde que se encaixe nos critérios de idade solicitados para cada categoria. Informações e inscrições podem ser feitas presencialmente, na sede da Secretaria de Cultura do município. 


Vídeo alemão de Diário de Santa Maria


25 de julho 

Nesta quinta-feira (25) é feriado no município de Agudo. A data lembra a imigração alemã e também celebra o Dia do Colono e Motorista. Neste dia, haverá uma celebração com o lançamento de um documentário sobre a história dos imigrantes e a apresentação de corais e orquestras. O evento é realizado pelo ICBAA em parceria com a Comunidade Evangélica de Confissão Luterana. 

A programação terá início às 9h30min na Igreja Luterana

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