PLURAL: os textos de Marcio Felipe Medeiros e Nara Suzana Stainr

Referências de felicidade
Marcio Felipe Medeiros
Sociólogo e professor universitário

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Felicidade, no mundo em que vivemos, tem se tornado um castelo kafkiano que, por mais que seja buscado, nunca é alcançado. Buscar a felicidade, de forma alguma, pode ser considerado um problema. A questão reside em outra instância. Quais referências de felicidade nós estamos usando como parâmetro em nossas vidas? É nas referências que residem parte da angústia que muitas pessoas na contemporaneidade vivenciam.

Filmes, séries e toda sorte de produtos culturais apresentam ao consumidor modelos de mundo. Neste modelo, instituições como família, relacionamento e tantas outra,s são apresentadas. O problema dessas representações é que elas não estão preocupadas com a realidade, são construções feitas para serem consumidas, comercializadas. O espectador é um consumidor, e quanto mais sua atenção for capturada, maior a lucratividade da indústria cultural.

NA VIDA REAL

O ponto nevrálgico está na diferença de propósitos entre a vida e a indústria. A indústria busca vender uma ideia de felicidade fictícia, sem compromisso com a realidade, mas que seja agradável de ver. Na vida real, os indivíduos buscam a felicidade em meio ao caos da existência, e os modelos midiáticos não conseguem se ajustar, gerando frustração e uma dose significativa de sofrimento.

No trabalho de Edgar Cabanas e Eva Illouz "Manufacturing Happy Citizens" os autores apresentam provocações sobre como o modelo ficcional de felicidade é instrumentalizado, de modo maquiavélico, pelo mercado para gerar consumo. Apresentar felicidades inatingíveis tem um grande potencial mercadológico, pois, quanto mais a felicidade é transferida para o universo externo, como viajar e adquirir bens, o mercado ganha. A consequência tem sido o adoecimento, melancolia e depressão experimentados no nosso atual momento.

PONTOS FOCAIS

Onde reside a felicidade? A reflexão sobre esse ponto é essencial para alcançá-la. Nessa esteira, Albert Borgmann questiona, quais são nossos "pontos focais"? Quais elementos damos a devida atenção e são efetivamente importantes? Quais situações nos fazem bem? Refletir sobre a existência, provocação típica da filosofia, é um dos caminhos importantes para termos clareza sobre onde reside a felicidade.

 Encontrar a felicidade, através da reflexão, está em antagonismo a felicidade massificada da mídia. Para atingi-la, algum trabalho precisa ser feito, como sair do universo das distrações e suportar a si mesmo em momentos de reflexão. Talvez, para alguns, acostumados a viver integrados em tecnologia, pode ser um tanto angustiante, mas sem ficarmos um pouco sozinhos, conosco mesmos, como poderemos saber o que nos faz bem e, consequentemente, felizes?