agronegócio

Poder público está preocupado com o fim da agricultura familiar no interior da Região Central

João Pedro Lamas


Fotos: UFSM (Divulgação)

O poder público está preocupado com a possibilidade do fim da agricultura familiar na Região Central do Rio Grande do Sul. Por essa razão, trabalha para evitá-lo, e isso perpassa principalmente a sucessão familiar.

De acordo com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), o interior da região tem como característica a composição por pequenas propriedades rurais, na maioria com relevo acidentado. Isso prejudica o manejo de qualquer tipo de cultura por dois motivos: impossibilidade do trânsito de máquinas e acesso restrito de pessoas.

Ainda, a região, tradicionalmente, plantava fumo, cultura que foi sendo substituída gradualmente por outras pelas famílias de agricultores que tinham como objetivo diversificar a sua renda. No entanto, as mais populares, como arroz e soja, exigem grandes propriedades, o que não é acessível para a maioria dos pequenos produtores.

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A situação, a médio e longo prazo, seria positiva com o esforço sendo voltado nesse sentido se os filhos desses agricultores não estivessem migrando do interior para as áreas urbanas, deixando a produção agrícola para trás. É o chamado êxodo rural. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), nos últimos 30 anos, a população rural do Rio Grande do Sul caiu 37%. Nos últimos 12 anos, diz a Emater, a saída do campo se intensificou.

A consequência disso, diz o professor Nereu Streck, PhD em agronomia pela Universidade de Nebraska, no Estados Unidos, é o desemprego no meio rural e a alta nos preços do custo dos alimentos.

- É alta dos preços do custo, pois se diminuirmos a produção das culturas, ou não diversificarmos, elas terão de vir de outros lugares. Não dá para viver só de arroz. E consumimos soja, na maior parte das vezes, indiretamente. Ainda, há a alta dos combustíveis. Mais o desemprego. É uma bola de neve - explica Streck.

Ele ainda conta que o primeiro impacto é o que está sendo sentido agora: a capacidade da pequena propriedade reduz em geral com menos pessoas, o que faz com que menos recursos sejam gerados para a sustentabilidade. Com menos dinheiro no bolso, mais dificuldade. E o ambiente do campo se torna menos interessante para o jovem, que vai buscar fora uma vida melhor.

CAMINHO PARA SOLUÇÃO

O primeiro passo em direção à solução, de forma prática, foi tomado no verão passado, quando a equipe Simanihot, do Centro de Ciências Rurais (CCR) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), procurou a Escola Estadual de Ensino Fundamental Nossa Senhora Aparecida, no interior de Júlio de Castilhos, na localidade de João dos Melos, ao lado do conhecido Jardim das Esculturas. O enfoque era trabalhar a agricultura familiar junto aos filhos de agricultores familiares.

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O professor José Alencar Zanon, diretor da instituição que tem 47 alunos matriculados, de 4 a 14 anos, nos ensinos infantil e fundamental de quatro comunidades da região, conta que a visita foi muito bem-vinda, mas ele sabia, por experiência, que seria difícil reverter a situação - ainda que isso não fosse impossível.

- Vemos de perto o problema que é o Êxodo Rural e o impacto na sucessão familiar. O jovem no campo já nasce no trabalho. Sabe que é difícil. Trabalho de 10 a 12 horas diárias. É natural que queira outra vida, ainda mais quando o agricultor chega ao final do ano feliz por conseguido um 0 a 0: não está devendo, mas também não sobrou muito. Não é uma situação boa para ninguém - explica.

O professor Zanon enfatiza que o aluno do campo é diferente. A escola é a segunda casa deles. Então, no seu entendimento, se conseguirem, na escola, fazer com que os alunos tomem gosto pela terra, e produzam alimentos a partir de suas propriedades, vendo o seu trabalho dar resultado, a população em geral vai ser beneficiada. Mas é um investimento grande de esforço e tempo para resultados de médio e longo prazo.

Por essa razão, a equipe Simanihot, que trabalha com o cultivo da mandioca principalmente em pequenas propriedades, começou a fazer visitas regulares aos alunos. A cada duas semanas, iam até lá para as aulas de manejo, de forma a mostrar a melhor forma de cultivo e que ela dá resultado.

Dados da Empresa Brasileira da Pesquisa Agropecuária (Embrapa) apontam que a mandioca é uma das mais interessantes para pequenas propriedades e agricultura familiar, pois pode ser usada na sua totalidade, podendo ser cultiva o ano inteiro, gerando economia e renda. Até a Organização das Nações Unidades (ONU) reconhece isso. Além disso, Santa Maria é uma das maiores produtoras do Estado.

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A instituição conta com uma área experimental na escola para o cultivo da mandioca, onde os próprios alunos, com a orientação da equipe da UFSM, conduzem os experimentos. E o trabalho do último ano parece estar dando resultado.

- Fizemos pesquisas regulares com os alunos para saber o que está bom e o que precisa melhorar. Para nossa surpresa, a vinda da equipe da UFSM é o que eles mais gostam, sendo que achávamos que a internet, que instalamos recentemente na escola, seria a primeira do ranking - conta, animado, Zanon.

O gosto pela terra, aliado ao resultado concreto do trabalho, parece levar os alunos a considerar a vida no campo como um verdadeiro projeto de toda a vida.

RESULTADO

Do último ano para cá, a comunicação deixou de ser tão difícil na escola: agora, há internet, bem como transporte viável, com acessibilidade menos restrita.

Além da equipe Simanihot, agora, neste ano, a equipe Phenoglad, também da UFSM e que investe na produção de gladíolos, flores conhecidas como Palma de Santa Rita, está junto da escola.

É com essas flores que uma festa da comunidade será decorada em novembro. Duzentas hastes serão postas na igreja e no salão de festas.

Ainda, a produção deve aumentar, pois a intenção é que a produção local sirva também de presente no Dia das Mães, em maio de 2019.

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FUTURO

Tanto a UFSM, como Emater e a direção da escola acreditam que a questão não é só permanecer no campo. A educação é importante. Por essa razão, é necessário que os alunos busquem conhecimento, que abram seu leque de possibilidades, ainda que seja fora, mas que para eles seja interessante voltar, pois acreditam que é possível levar uma boa vida no interior.

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