gastronomia e viagem

Astrid & Gastón


Tive a oportunidade de comprovar o desenvolvimento da gastronomia peruana em final de setembro em Lima. Após um vôo espetacular, direto de Porto Alegre, chegamos no Aereoporto Internacional Jorge Chavéz em Callao (uma cidade nos arredores de Lima). Como era domingo, peguei um ônibus executivo e logo estava no bairro de Miraflores, onde ficava meu hotel e a maioria das atrações gastronômicas da cidade. 

Lima hoje é uma cidade de 11 milhões de habitantes na beira do Oceano Pacífico, onde quase nunca chove, com um trânsito caótico, um ar pesado e um céu acinzentado, onde o sol quase nunca aparece. Os carros trafegam tão próximos uns dos outros que é um susto atrás do outro cada vez que se necessita ir de um lugar a outro utilizando carro (o transporte coletivo é super ineficiente). Como toda capital, Lima tem essa veia cosmopolita: museus, bairros históricos, bairros de compras. Caso precise de algo, é só se informar com a população local e encontrar o que se está procurando. Nesse texto irei falar sobre um restaurante específico e sobre os personagens que dão nome a ele: o Astrid & Gastón.

Fotos: Arquivo pessoal

O Astrid & Gastón está classificado como 39º pela revista britânica Restaurant dentre os 50 melhores restaurantes do mundo. Em Lima, ainda tem dois restaurantes melhores colocados nessa lista: o Central, em 6º e o Maido, em 7º. Porém, não consegui reserva em nenhum deles. Além disso, o Astrid & Gastón conta com 3 estrelas no Guia Michelin, outra honraria no mundo gastronômico.

Gastón Acurio, um dos proprietários, nasceu em 1967, filho de um famoso político peruano. Ele começou a estudar direito na Universidade Católica do Peru e, em 1987, mudou-se para Madrid para continuar seus estudos. Porém, após uma visita ao restaurante de Juan Mari Arzak (um dos grandes chefs espanhóis contemporâneos e discípulo de Paul Bocuse), ele acabou descobrindo sua verdadeira vocação. Em 1989, se matriculou na Escola de Hotelaria de Madrid e, logo após, em 1991, mudou-se para Paris, onde se formou no Le Cordon Bleu, uma das melhores escolas de culinária do mundo. Lá, conheceu sua esposa, a cozinheira alemã Astrid Gustche. Em 1993, o casal se mudou para o Peru e, no ano seguinte, abriram seu próprio restaurante, o Astrid e Gastón, inicialmente baseado na cozinha francesa. No entanto, logo decidiram recuperar e inovar a cozinha peruana.

O início se deu em uma pequena casa no bairro de Miraflores. Em 2014, eles se mudam para a Casa Moreyra, antiga sede da Fazenda San Izidro, com mais de 300 anos de idade. A Casa Moreyra sempre foi muito mais que uma residência, pois cumpria a função de sede de um importante empreendimento rural que, juntamente com outros ao redor de Lima, forneciam os alimentos que abasteciam a capital. Com o tempo e o crescimento urbano, estas casas acabaram sendo absorvidas pela cidade se tornando palacetes urbanos. A história desta casa remonta aos tempos dos povos andinos que construíram um canal de irrigação chamado Huatica, hoje Avenida Camino Real. O canal passava por estas terras desde os anos 1000 da era cristã. A construção da casa se deu na segunda metade do século XVII e ela teve que ser reconstruída após o terremoto de 1746. O exterior e o interior da casa são um espetáculo a parte.


 Agora vamos ao que interessa que é a experiência gastronômica. O restaurante funciona com um menu a la carte com diversas e boas opções de frutos do mar e da terra, todos com alguma influência peruana ou oriental (sempre presente na culinária peruana). Se preferir, é possível solicitar o menu degustação que pode ser ou não harmonizado com com vinhos (ou um pouco mais!). Escolhi o menu degustação harmonizado com vinhos que estava denominado de "lima love - Más amor por favor", comemorando a primavera de 2018. O menu era composto de 14 pratos que iam desde pequenos tira gostos, passando por frutos do mar super frescos até carnes bem típicas dos Andes, como o Cuy, um tipo de preá.

Não descreverei prato por prato, nem vinho por vinho, pois não conseguiria chegar nem perto de toda a imensidão de sabores, aromas, texturas e sensações que meus sentidos experimentaram durante as mais de três horas que passei sendo atendido por uma brigada de profissionais bem treinados e disponíveis para explicar, em detalhes, tudo que estava sendo servido. Estes profissionais ainda contavam algumas histórias sobre como determinados ingredientes tinham sido adaptados para este ou aquele prato. Além disso a brigada da cozinha era impecável, quando ao final fui agradecer, descobri que tinha até um catarinense trabalhando entre eles, um orgulho nosso. Para não deixá-los sem nenhuma informação que permita-lhes imaginar esta experiência, vou tentar descrever o prato e a harmonização que mais me surpreenderam.


O prato se chamava: De essa cocina limeña de todas las sangres, todos los rincones, todos los sabores (Asado de tira estofado, y su fiel compañero, el arroz chaufa). Se formos traduzir seria uma costela assada com arroz chaufa mas, na verdade, recebemos um pedaço de costela cozido através do método chamado sous vide que usa um termocirculador para cozinhar as carnes lentamente, a vácuo e a baixa temperatura preservando seus sucos e seus sabores. A carne se desmanchava e o molho estava muito saboroso, nem um pouco gorduroso. O arroz Chaufa, nada mais é do que um arroz daqueles que encontramos em restaurantes chineses (do tipo chop-suey) com ingredientes peruanos e muito consumido por lá.


Porém, o que impressionou foi a harmonização. O vinho escolhido foi um Gonsalez Byass Matusalem Cream 30 años Vinum Optimum Rare Signatum D.O. Jerez, Jerez de la Frontera - Espanha. Um Jerez de solera, Oloroso, elaborado com a uva Pedro Ximenez e, normalmente, usado para hamonizar com pratos doces, mas que harmonizou espetacularmente com essa carne. Ele tinha uma doçura marcante, caramelo, baunilha e ameixas secas que envolvia a carne e criava um segundo molho, realmente um desafio aos sentidos e às convenções, uma delícia.

O restante foi composto pelas combinações tradicionais com frutos do mar e Sauvignon Blanc do Chile; os pratos mais ácidos com uma Gramona Imperial Gran Reserva (Cava Espanhola); coelho com Pinot Noir argentino; pato com um Bourgogne da França, viiras com vinho laranja Italiano, cuy com Malbec argentino. Finalizamos com um Rum Peruano, café e mini trufas. Espero que tenham a oportunidade de visitar Lima e aproveitar essa e tantas outras casas espetaculares que a cidade oferece. Só o grupo de Gastón Acurio tem o La Mar cebichería, o Tanta peruvian bistro, o Pasquale Hermanos e a Panchita parrilla.

Quem não puder ir tão longe temos a nossa amostra aqui em Santa Maria, o Tuyo. Ao falar de restaurantes em Santa Maria, não posso deixar de registrar o nosso pesar pela perda do Marco Frank, que por tantos anos nos recebeu no restaurante Augusto com simpatia e alegria.

Desejo que seu caminho seja repleto de luz e, em seu descanso, não faltem as delícias enogastronômicas.
Nosso abraço a todos os familiares.

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