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VÍDEO: a exaustão e o apelo de quem salva vidas há mais de 260 dias

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data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Renan Mattos (Diário)

Nove meses depois dos primeiros efeitos da pandemia, os casos de contaminação e a lotação das UTIs voltam a crescer de uma forma alarmante em Santa Maria. Com a ocupação dos leitos de terapia intensiva de Santa Maria, tanto aqueles específicos para o tratamento do coronavírus quanto os reservados para demais doenças, beirando os 90% de ocupação, o sistema de saúde chega a um limite. Dentro dos hospitais, médicos, enfermeiros e toda a equipe que convive com a Covid-19 diariamente fazem um apelo: não é hora de se descuidar. 


- Temos que entender que o sistema de saúde tem um limite. Existe uma quantidade "x" de profissionais, eu posso querer mais, mas não existe. Se leva, pelo menos, seis anos para formar um médico generalista. Só que para um médico intensivista, são pelo menos dez anos de formação. Quantos de nós ainda vamos ter uma década pela frente? Quem poderia esperar uma década para um médico intensivista estar pronto para atender na UTI? - afirma o médico e diretor técnico do Hospital Regional, Mery Martins Neto, 52 anos. 

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O Regional conta com 20 leitos de UTI e estava, há 10 dias consecutivos, com todos ocupados por pacientes com a confirmação ou suspeita da Covid-19. A expectativa é para a abertura de mais 10 leitos de UTI nos próximos dias. Ao todo, são mais de 409 profissionais de todas as áreas - 62 deles médicos, que atuam no hospital. 

Além da demanda por novos profissionais, também é preciso considerar aqueles que se afastam do trabalho quando são contaminados com o vírus ou, ainda, por conta da exaustão física e/ou mental. Só no Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), dos cerca de 2 mil profissionais, 359 funcionários de todas áreas (não somente aqueles ligados ao atendimento de pacientes Covid) contraíram a Covid-19 e tiveram que ficar afastados por, pelo menos, 15 dias. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Renan Mattos (Diário)
Mery Martins Neto atua como médico intensivista e diretor técnico do Hospital Regional de Santa Maria

- A gente trabalha sob condições de muito estresse por conta de ser uma doença, agora não tão desconhecida, mas ainda nova. O grande temor das equipes e dos profissionais de saúde é contaminar seus familiares. Depois de tantos meses, a gente começou a ter um cansaço. As nossas férias tiveram que ser prorrogadas, porque não se tinha mão de obra para todo esse serviço - conta a coordenadora da UTI Covid do Hospital Universitário de Santa Maria (Husm), Luciana Borges Segala, 50 anos. 

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Essa mesma dificuldade também é observada pelo pneumologista e coordenador médico da ala Alcides Brum, do Hospital de Caridade, Julio Cesar Sarturi, 53 anos. Ele havia largado a terapia intensiva por opção há 15 anos, mas durante a pandemia retomou o trabalho. Ao todo, a ala conta com 186 profissionais, como médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e higienização.  

- É difícil a reposição de profissionais que estão adoecendo, que estão cansando. Na montagem da nossa segunda UTI, com mais 10 leitos, foi difícil conseguir profissionais qualificados com experiência em terapia intensiva - completa o médico. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Arquivo pessoal
Luciana Borges Segala é a responsável técnica e coordenadora da UTI Covid do Husm, além de ser supervisora da residência de medicina intensiva da instituição

ISOLAMENTO DIFICULA HUMANIZAÇÃO
Durante a pandemia, os profissionais de saúde têm sido ainda, o mais próximo de uma família para pacientes completamente isolados. De acordo com Luciana, que também é supervisora da residência de medicina intensiva do Husm, é preciso encontrar alternativas para humanizar o atendimento e acolher tanto quem está dentro de uma UTI quanto os familiares que aguardam angustiados por uma notícia por telefone. 

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- Os pacientes que acordam de um coma, de uma situação grave, se veem sozinhos dentro de uma UTI. Nós, que trabalhamos tanto para que a família esteja sempre presente com o paciente, não podemos mais proporcionar um encontro porque isso traz riscos. Para entregar as notícias aos familiares, precisa ser tudo por telefone, é muito impessoal. Em alguns casos, o último contato é quando a família entregou aquele paciente na UTI e depois só o recebe de volta lacrado, dentro de um caixão. Isso nos comove bastante, nos traz uma carga emocional muito grande - conta a médica. 

Essa situação, para o médico do Hospital Regional, é um dos maiores desafios:

- Cada paciente é um desafio. Em cada paciente a gente é testado. Em cada familiar a gente é necessário, tem o desafio de apoiá-lo. Tem sido um período de muito trabalho, porque muitas situações precisam se resolver rapidamente, exige uma atenção, um cuidado contínuo tanto com o paciente quanto com seu familiar, exige inovação e dedicação. É difícil e cansativo, mas quando tudo dá certo é extremamente recompensador - comenta Neto. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Gabriel Haesbaert (Diário)
Augusta Stocheru Deprá é enfermeira no Alcides Brum e atua na linha de frente ao combate à Covid-19 desde o início da pandemia

MEDO AINDA EXISTE
Hoje, apesar de se ter conhecimento de que o coronavírus é transmitido pelo contato com pessoas infectadas, o medo de se contaminar ainda existe por parte dos profissionais. Não só por não saber como o vírus pode agir no organismo, mas principalmente pela preocupação de transmitir aos familiares. 

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- Quando voltamos para casa, sempre fica o pensamento de 'será que eu me contaminei, será que vou contaminar alguém que vive comigo?' - ressalta Luciana. 

Entretanto, para a enfermeira do Alcides Brum, Augusta Stocheru Deprá, 41 anos, o temor maior de se contaminar é da porta para fora do hospital: 

- Num primeiro momento foi mais tenso, até para a gente saber como seria trabalhar numa ala Covid. Mas hoje eu me sinto mais segura dentro do hospital do que fora, porque nosso ambiente de trabalho temos uma estrutura muito bem organizada. Fora, eu percebo que as pessoas se cuidam menos e isso me chateia muito, porque as pessoas não tem noção do reflexo que pode ser. A gente enfrenta 'n' situações, talvez, se as pessoas acompanhassem um pouquinho o que os nossos olhos veem, as pessoas pensariam diferente, na maneira de ter empatia e não pensar que se está imune - relata a enfermeira. 

style="width: 100%;" data-filename="retriever">Foto: Gabriel Haesbaert (Diário)
Julio Cesar Sarturi é medico pneumologista e intensivista, além de ser coordenador médico da ala Alcides Brum

FALTA DE CUIDADOS E AGLOMERAÇÕES 
Entre todos os profissionais que a reportagem conversou, há um consenso: as aglomerações, o uso incorreto da máscara e a falta de cuidados de higiene está impactando na alta de contaminação. O temor que é os números aumentem ainda mais após as festividades de final de ano e por isso pede-se tanto que para que a população não "desista". 

- Nós parece um movimento de internação maior do que foi nosso pico, aparentemente, em junho e julho. Obviamente as pessoas cansaram, estão saindo mais, em aglomerações, o clima propiciou. Tivemos várias situações para esse aumento do número de casos. A gente não pode e não vai desistir nunca. O cansaço se resolve com descanso, mas o grande problema é que a população precisa saber que isso está impactando no nosso trabalho, na estrutura da saúde, visivelmente. As pessoas precisam ter consciência de tomar os cuidados necessários que já aprendemos desde o início da pandemia - ressalta Sarturi.

'NÃO É HORA DE BAIXAR A MÁSCARA'
Para tentar conscientizar a população sobre os perigos da Covid-19 que ainda existem, a Federação das Santas Casas e Hospitais beneficentes, religiosos e filantrópicos do Rio Grande do Sul lançou a campanha 'Não é hora de baixar a máscara'. Em uma pesquisa feita com cerca de 70 instituições hospitalares sem fins lucrativos do Estado representadas pela entidade, 32% relatam dificuldade na contratação de médicos e enfermeiros e 68% têm problemas para contratar técnicos para atuar nas instituições. 

Operando no limite da capacidade, o órgão pede: "Não queremos diminuir seus sofrimentos. Estamos todos sofrendo. Isso é só um alerta. Faça sua parte. Respeite o isolamento. Use máscara. A pandemia ainda não acabou. Não deixe que ela acabe conosco". 

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