violência

'Trotes' agressivos são recorrentes entre colegas de quartel, relatam ex-militares

da redação

O caso de agressão a um soldado dentro de um alojamento do quartel de Santa Maria, praticado por sete colegas de farda, trouxe à tona uma prática velada, mas conhecida da maioria das pessoas que já passou pelo serviço militar: o pacotão, nome popular de uma espécie de trote violento aplicado entre colegas.

Após a publicação da reportagem da agressão, dezenas de pessoas se manifestaram na fanpage do jornal no Facebook afirmando que a prática é comum. Além disso, o Diário conversou com um ex-militar e a mãe de um ex-soldado, que confirmaram a prática.

"COLOCARAM UMA BOMBA EMBAIXO DA CAMA DO MEU FILHO"
Mãe de cinco filhos homens, uma senhora relatou ao Diário que viveu a dor de ter um filho que precisou de tratamento psicológico para superar a sequela de uma lesão na cabeça causada por um pacotão. O ferimento é consequência de um "pacote" que aconteceu há cerca de 10 anos, quando ele ingressou no Parque Regional de Manutenção/ 3, no alojamento: 

_ Colocaram uma bomba embaixo da cama do meu filho. Quando explodiu, todos outros saíram correndo, e ele ficou mal. Isso foi numa madrugada de sexta para sábado. Levaram o meu filho ao HGU (Hospital de Guarnição), e ele passou o final de semana inteiro lá sem nos avisar. Na segunda-feira, deixaram ele na porta de casa. Ele não sabia explicar o que estava acontecendo e logo desmaiou em meus braços. Chamei o irmão dele, e o levamos até o HGU, mas nem queriam atender porque já tinham dado baixa (como se ele não fosse mais do quartel). Depois disso, ele tinha desmaios frequentes. Então, fomos ao quartel. Depois de muito brigar, conseguimos que ele fosse atendido no HGU, onde ficou um mês.
O meu filho, na época, ficou fora de si. Ele esqueceu de tudo, não reconhecia ninguém da família, exceto eu. Depois de dar alta do hospital, voltou ao quartel, mas começou a rasgar os documentos, e aí ele passou a ficar em casa para se tratar. Foi um ano de muitas consultas, em Porto Alegre, no psicólogo, no neurologista. A gente tentou, depois, que ele se aposentasse pelo quartel, mas não deu certo. Nesse um ano de tratamento, ele tomou remédios. Meu outro filho pagava parcelado, era mais de R$ 200, de R$ 300 por mês em medicamentos. Sou grata porque meu filho, apesar de tudo, está bem e seguiu sua vida, mas eles levaram o meu filho naquele dia, do quartel para o hospital, praticamente morto - conta a mãe de um ex-militar. 

"ELES CHEGARAM A AMARRAR ELE EM UMA ESPÉCIE DE PAU DE ARARA"
Um santa-mariense que serviu no 29º Batalhão de Infantaria Blindada (29º BIB) nos anos 90, relatou presenciar o "pacotão" em diversas ocasiões:  

_ Normalmente, o pessoal que já engajado costuma observar os EV (recrutas) quando chegam. Sempre tem aqueles que se enturmam mais e aqueles que acabam interagindo menos. São esses, mais quietos, que costumam levar o pacote. E não tem como dizer que é nos primeiros ou nos últimos dias, pode ser em qualquer ocasião, eles apenas combinam entre eles. Comigo não aconteceu porque, quando percebi que seria o alvo, passei a carregar uma faca no bolso do casaco, já que era inverno. O dia que eles se aproximaram para fazer o pacote em mim, eu tirei a faca da bolso e os ameacei. Um deles chegou a me denunciar ao alto comando já que eu não poderia ter a faca, e aí quando eu expliquei o motivo, o cara que me denunciou acabou pegando uns dias de prisão.
Uma vez, chegou um aspirante e muitos não gostavam dele, aí foi pesado. Eles chegaram a amarrar ele numa espécie de pau de arara e saíram carregando e quem estava ali viu. O pessoal aproveita o fim de tarde, quando a maioria das pessoas deixa o quartel e só fica quem mora no alojamento, ou aos finais de semana, esses horários de menor movimento. Eu tinha um colega que levou dois pacotes. Depois do segundo, ele desertou e nunca mais quis voltar para o quartel. Pode até ser uma brincadeira, mas ninguém gosta de ser imobilizado, às vezes ser amarrado, levar mordidas, puxões de cabelo e puxões de orelha, não é mesmo? Só que ninguém fala porque daí os colegas vão te marcar. E quando todos tiverem atividade de campo, eles vão te dar um pacote mais agressivo, no meio do mato, que é pior" relembra o homem que serviu em 1994. 

O QUE DIZ O EXÉRCITO 
Por telefone, a assessoria de comunicação social da 3ª Divisão do Exército (3ª DE) falou sobre o caso e sobre os relatos de prática de pacotão no quartel. De acordo com a assessoria de comunicação, todos os anos, quando os novos recrutas chegam ao Exército, são orientados que qualquer tipo de agressão, física ou moral, é uma transgressão grave conforme Regimento Disciplinar do Exército.

Ainda conforme o setor de comunicação, os casos só poderão ser apurados quando o comando toma conhecimento de que eles existem e que não se trata de uma prática comum. O caso do soldado mostrado pelo Diário hoje seria o único relatado ao longo do último ano no serviço militar obrigatório na região da 3ª DE. 

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