Tradicional festa de universitários na Praça Saturnino de Brito ainda divide opiniões

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Tradicional festa de universitários na Praça Saturnino de Brito ainda divide opiniões
Foto: Marcelo Oliveira (Diário)/A realidade da Praça no dia seguinte às comemorações 

A cada começo de semestre, a Praça Saturnino de Brito, popularmente conhecida como Praça do Brahma, na região central de Santa Maria, reúne milhares de jovens para celebrar o recomeço das aulas nas instituições de Ensino Superior, especialmente na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Desde 2017, a prefeitura e as forças de segurança da cidade lançaram a “Calourada Segura”, tornando o espaço mais seguro para quem frequenta. O encontro dos estudantes nesta época do ano já é tradicional no município, e ocorre há anos, mesmo que não se tenha precisão de quando ele se tornou “oficial”. Mesmo depois de tanto tempo, a festa ainda divide opiniões.

Há quem compreenda que se trata de uma festa sazonal, que ocorre em cinco dias e a cada seis meses; e quem se sinta desconfortável, com a alegação de que a festa poderia ocorrer em outro espaço.

A aposentada Telonires Alves, 58 anos, sente-se incomodada com o barulho e a sujeira causada pela calourada. Ela mora na região há 12 anos e conta que o barulho dificulta o sono e até mesmo os afazeres comuns, como assistir televisão, pois precisa aumentar o volume para contrapor o som da rua:

– Com essa festa dos bixos ninguém dorme. É zoeira, barulho e gritaria. Um verdadeiro inferno e entra madrugada adentro – reclama a aposentada.

Já quem mora há mais tempo na região acabou elaborando um jeitinho de conseguir relaxar antes do final da festa. O professor aposentado da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Ilzemaro Schneider vive próximo à praça há mais de 20 anos, e revela o segredo para ter um sono mais tranquilo enquanto a festa continua:

– Dá pra aguentar, a gente fecha bem as janelas e liga o ar condicionado para fazer um barulhinho. Daí dá pra dormir tranquilo – conta o professor.

Mãe de calouros, a programadora visual Magali Rodrigues, 54 anos, visita a praça todas as manhãs à passeio com o cachorrinho de estimação. Ela vê a festa como algo suportável, uma vez que ocorre apenas alguns dias do ano:

– Eu acho que é uma festa válida, é da juventude, e por isso está dentro do que se espera de um jovem. Eu gosto – relata a programadora.

O QUE SENTEM OS COMERCIANTES

Maria Isabel Dutra, 57 anos, é proprietária do Brechó Garagem, que fica na rua Duque de Caxias. O estabelecimento teve os vidros quebrados na primeira noite da Calourada. Ela revela que em todos os anos de festa teve os vidros quebrados e os muros da loja sujos, isto porque a loja fica localizada bem ao meio da quadra (entre as ruas Dr. Bozzano e Coronel Niederauer), que é o principal ponto em que os jovens se acumulam durante a noite.

– Deixo bem claro que adoro ver a festa e acho bem saudável. A gente viu que tinha muito policiamento e guarda, mas quando essas coisas acontecem ninguém faz nada. Então a gente gostaria que cuidassem também do patrimônio. Outra coisa é o mau cheiro, embora eles limpem a rua, o cheiro ruim fica.

Foto: Marcelo Oliveira (Diário)Os muros do estabelecimento do Brechó Garagem, sujos pela festa.

Além da Calourada, a Praça Saturnino de Brito também recebe outras atividades, como a feira Armazém Coopercedro, que ocorre todas as manhãs. Os produtores que expõem chegam cedo para organizar seus produtos e também possuem as opiniões divididas quanto a realização da festa. 

Claudio Talaporta, 54 anos, chega antes mesmo da equipe de limpeza da prefeitura, às 4h, para instalar a banca. Apesar de estar lá antes do início da limpeza, ele não se incomoda, mas ouve relatos de moradores que o que mais atrapalha, de fato, é o barulho.

Para Elisiane Papalia, 39 anos, que trabalha desde 2015 como feirante na praça, poderia haver outro lugar para realização do evento, retirando-o do centro da cidade. Ela relata que quando chega pela manhã o local já está limpo, mas sente a dor dos clientes que moram por perto: 

– Eles reclamam da baderna, por isso eu acho que teria que ter um outro lugar para eles fazerem isso, ou que fosse respeitada a Lei do Silêncio, às 22h. Fazer festa é bom, mas tem que respeitar o direito das outras pessoas também – relata a feirante.

Quem também precisa se adaptar à realização da festa são os taxistas do ponto localizado na praça, que mudam o ponto de embarque e desembarque para uma quadra a cima. Alessandro dos Santos, 42 anos, trabalha em regime de plantão e comenta sobre o acesso ao ponto:

– A gente tem que fazer um monte de volta, o que fura um monte de quilômetro e gasolina. Mas, eu particularmente entendo. Também já fui jovem, mas falta educação deles em nos deixar acessar aqui a rua e os nossos pontos. 

TROCA DE LUGAR

Segundo a prefeitura, a troca de lugar da execução da festa dos calouros já foi debatida há alguns anos, em conjunto com as forças de segurança da cidade, porém, sem sucesso. Atualmente, com a evolução das práticas de trote e o controle que as instituições públicas conseguiram ter quanto à segurança do evento, é visto como “desinteligente” ir contra esta prática já tradicional da cidade que leva o adjetivo de universitária:

– Nós acreditamos que diante da força da comunidade, cultural e tradicional, aquele lugar tem sido uma referência por décadas, e nós irmos contra isso é desinteligente. E é inteligente o ganho que nós tivemos e o sucesso dos últimos anos da Calourada Segura – disse Alexandre Lima, chefe do gabinete do prefeito de Santa Maria em entrevista à CDN.

LIMPEZA E SEGURANÇA

A Calourada Segura aposta em alguns eixos, como na segurança de jovens e moradores da região e no bem-estar da comunidade no pós-festa. Durante as noites, uma força-tarefa é montada, com a participação de órgãos de segurança da cidade, como Brigada Militar, Polícia Civil, Guarda Municipal e Superintendência de Fiscalização, além de estarem à disposição ambulâncias. Outros equipamentos de segurança, como uma plataforma de videomonitoramento da Secretaria de Segurança Pública do Estado, também está instalada na Rua Duque de Caxias para fazer o monitoramento. Câmeras do Centro de Integração de Operações de Segurança Pública (Ciosp) também estão voltadas à festa. Na praça, foram instalados banheiros químicos e tonéis para depósito de resíduos.

Nos dois primeiros dias da Calourada, foram recolhidas cerca de duas toneladas de resíduos em vias públicas. A limpeza fica a cargo da Secretaria de Infraestrutura e Serviços Públicos. O serviço começa ainda na madrugada e, nos dois primeiros dias, foi concluído antes das 7h30min. 

BARES FECHAM A MEIA-NOITE

No dia 8 de abril, foi publicado um decreto municipal, com validade entre os dias 11 e 15 de abril, que obriga o fechamento a meia-noite de estabelecimentos que vendam bebidas alcoólicas no perímetro entre as Ruas Serafim Valandro, Silva Jardim, Avenidas Borges de Medeiros e Presidente Vargas e a Rua do Rosário.

Conforme Alexandre Lima, o texto foi publicado na tentativa de controlar o horário de término da Calourada Segura ao limitar a compra de bebida nos arredores da praça, e, consequentemente, fazer com que a festa seja dispersada e encerrada. Nos primeiros dias, o trânsito foi liberado entre 2h e 3h, conforme o público deixava o local. Comerciantes da região, no entanto, fazem contestações.

Dos dois bares que estão nas ruas em frente à praça, apenas um reclama do decreto. O proprietário adaptou o bar para venda apenas pela janela durante o período da festa, atuando no formato de distribuidora de bebidas. Ele preferiu não se identificar e conta que a fiscalização é de fato efetiva, e controla os fechamentos sem que passem nenhum minuto além do permitido. Nesse horário, ele fecha, mas permanece no local fazendo a limpeza do bar até a madrugada, e afirma que a duração da festa se estende algumas horas após o estabelecido:

– Eu acho que [o decreto] é ridículo, porque a gurizada fica aí até às 3h. Então não tem diferença a gente fechar a meia-noite. Na verdade está apenas nos prejudicando, fomos o setor mais atingido pela pandemia e agora que voltou a festa, a gente poderia tirar uns trocos, mas nem isso.

O outro estabelecimento fica de frente para a multidão, na Rua Duque de Caxias, e é comandado pela família de Paulo Machado há 15 anos. Por ser um negócio familiar, eles acabam encerrando as atividades às 22h, e, por este motivo, não se sentem prejudicados pelo decreto. Segundo Paulo, o foco principal das vendas são os alimentos, como cachorros-quentes e panchos. Dessa forma, eles não se estendem à noite.

Nas redes sociais, o Bar Gárgula, localizado na Rua Serafim Valandro, pronunciou-se contrário ao decreto. Para um dos proprietários, Cássio Lemos, a medida prejudica principalmente por se estender até a sexta-feira, feriado de Páscoa. Ele explica que o público principal do bar não são pessoas nas ruas, mas justamente aquelas que consomem dentro do estabelecimento. A segunda semana do mês costuma ser a que eles mais lucram, e a limitação do horário para fechar acaba prejudicando. 

–  Isso impacta bastante, porque a gente conseguiu se manter aberto nesses dois anos, e ainda estamos em recuperação. Nessa semana de feriadão a gente não vai poder trabalhar porque precisamos fechar a meia-noite.

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