tensão mundial

Os principais pontos para entender o ataque russo na Ucrânia e o contexto dos conflitos

Felipe Backes, Gabriela Perufo e Pâmela Rubin Matge

A rádio CDN ouviu, na manhã desta quinta-feira, dois especialistas que comentaram o ataque Russo à Ucrânia, que começou nesta quinta-feira após anúncio em rede nacional russa pelo presidente Vladimir Putin. A entrevista ao vivo foi concedida aos repórteres Felipe Backes e Pâmela Rubin Matge, no programa F5. Desde então, o espaço aéreo civil foi fechado na Ucrânia, houve registros de bombardeios e movimentação militares. A Ucrânia, em contra-ataque, também tem tentado anular os ataques russos e já há registro de mortes entre militares e civis. 

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Igor Castellano da Silva, professor de Segurança Internacional e Defesa do curso e Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria e Júlio Cossio Rodriguez, professor e diretor adjunto da Secretaria de Apoio Inernacional da UFSM comentam os acontecimentos que vêm preocupando cidadãos do mundo inteiro. A reportagem do Diário também resume, em tópicos, o que vem acontecendo desde a madrugada desta quinta-feira no leste europeu.  

  • Ucrânia fez parte da antiga União Soviética, extinta em 1991.
  • Movimento separatista existe desde 2014 em dois territórios ucranianos: Donetsk e Lugansk, na bacia de Donbass. Separatistas são pró-Rússia e apoiados pelo governo do presidente russo Vladimir Putin
  • Rússia é contra a proposta de entrada da Ucrânia na Organização do Tratado Atlântico Norte (Otan), entidade que congrega 30 países, incluindo Estados Unidos e nações europeias. Para a Rússia, chegada da Otan em um território tão próximo é uma ameaça à segurança nacional.
  • A partir de novembro de 2021, Rússia começa a mobilizar militares nas regiões de fronteira e em Belarus, país que também é vizinho da Ucrânia e aliado da Rússia.
  • Movimento das tropas russas gera temor de invasão na Ucrânia. Países como Estados Unidos exigem explicações da Rússia. Movimentos diplomáticos buscam evitar a invasão.
  • Em fevereiro, invasão torna-se iminente. Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, e Putin conversam por telefone. Estados Unidos ameaça fortes sanções.
  • Em 21 de fevereiro, Putin anuncia reconhecimento de independência dos território de Donetsk e Lugansk, o que eleva a tensão ao nível máximo.
  • Às 23h45min desta quarta-feira (horário de Brasília) Putin anunciou em cadeia nacional uma ação militar especial em território ucraniano.
  • Logo após o anúncio, foram relatadas explosões e bombardeios em diversas cidades ucranianas, incluindo a capital Kiev.
  • Ucrânia decretou lei marcial e fechou o espaço aéreo. Combates entre tropas russas e ucranianas acontecem em diversos pontos do país. Invasão acontece por terra, ar e mar em diversas frentes.
  • Governo russo afirma ter destruído 70 alvos. Ucrânia revida, e destrói aeronaves russas 
  • Há registro de mortos em diferentes pontos da Ucrânia; governo local diz que matou soldados e derrubou aviões russos

CONTEXTO DO ATAQUE 
Muito antes dos ataques militares, Rússia e Ucrânia, países vizinhos, já vivem em tensão. Desde 2014, há um movimento separatista de dois territórios da Ucrânia e que recentemente foram reconhecidos pela Rússia. Igor explica que desde o final da Guerra Fria, o mundo tinha uma expectativa de construir, por meio de grandes potências, como os Estados Unidos, um sistema internacional baseado em instituições multilaterais, a exemplo da Organização das Nações Unidas (ONU), por exemplo. A ideia é que as soluções de conflitos fossem tomadas de forma pacífica com essas organizações. 

- A gente vê, desde a década de 90, esse sistema começando a se fragmentar, por diversas ações, tanto por parte dos Estados Unidos como de potenciais governos rivais ou ex-rivais, como é o caso da Rússia e da China. Esse conflito entre Rússia e Ucrânia mostra a impossibilidade de criar uma solução multilateral por meio de instituições que temos hoje no sistema internacional. Até mesmo os Estados Unidos, infelizmente, vem jogando contra suas próprias instituições, que eles mesmo financiaram, como o Conselho de Segurança da ONU, e a gente vê uma recusa, ainda do governo Trump, de discutir a questão internacional nessas instituições. Em outros momentos, os Estados Unidos estava do lado que, hoje, a Rússia está. No final dos anos 90, eles interviram na antiga Iugoslávia e fazem o papel que a Rússia está fazendo hoje, fizeram o mesmo com a Síria. Vale lembrar que nas relações internacionais não há lado bom ou ruim, os países tomam decisões movidas por interesses específicos e que infelizmente promovem a segurança internacional. 

Igor explica que, no caso da Rússia, o interesse está relacionado há uma rivalidade com a Ucrânia. Além de reconhecer os territórios separatistas, o fato de a Ucrânia ter uma aliança com os Estados Unidos e uma proposta para integrar a Organização do Tratado Atlântico Norte (Otan) e estabelecer em seu território um sistema de mísseis nucleares é vista como ameaça por parte do governo russo. 

- Obviamente a guerra não é uma solução, e esse militarismo dentro da Rússia infelizmente levou ao conflito que vemos hoje - comenta Igor. 

POSSÍVEIS CENÁRIOS 
Mesmo que a Ucrânia ainda não faça parte da Otan, o professor ressalta que provavelmente contará com apoio militar e ajuda indireta de países aliados. As sanções econômicas impostas à Rússia já demonstram tais alianças, mesmo que não mostrem tanto efeito. 

-  O que seria mais razoável, no momento atual, e o que se vê nos últimos 30 anos no sistema internacional no contexto pós Guerra Fria, é que os aliados tenham essa ajuda indireta, tanto que já foi anunciado programa de sanções econômicas à Rússia, mesmo que elas acabem não surtindo tanto efeito. O que a Otan deve fazer é encher os países vizinhos e que integram a organização, como é o caso da Lituânia e Letônia, de armamento para que a Rússia não empreenda uma expansão ainda maior na região. A Ucrânia vai ter uma debandada, como já vimos nas guerras separatistas de 2014, e pode ter uma mudança de regime orientada pela Rússia. Como a Ucrânia não tem mais como recuperar esses territórios, terá de fazer uma espécie de escudo protetor para que a Rússia não expanda ainda mais. Esse é o cenário previsível. Ainda poderíamos esperar uma intervenção mais robusta dos países ocidentais tentando proteger a Ucrânia, mas esse é mais difícil de acontecer.  Ocidentais tentando proteger a Ucrânia, mas isso é mais difícil de acontecer - explica Igor.  

Júlio explica que é difícil prever os próximos passos, mas acha pouco provável que a situação tome proporções para uma suposta Terceira Guerra Mundial, como se vê o temor na internet. 

- As armas nuclearas estabilizam relações estratégicas, principalmente entre Rússia, Estados Unidos e China. Agora, não quer dizer que o envolvimento dos Estados Unidos não possa acontecer, como houve na Guerra Fria, Vietnã, Afeganistão, Guerra da Coreia, em que o envolvimento indireto era nítido entre rivais como a União Soviética e Estados Unidos. Diretamente um conflito entre eles, isso não vai acontecer. A longo prazo, vai depender do tipo de reação que a Ucrânia vai conseguir fazer sobre as forças russas. É preciso ficar claro que superioridade militar não garante sucesso no conflito, principalmente quando há a impossibilidade de armas de destruição em massa, isso não garante que a Rússia vai ganhar o conflito e tudo vai ocorrer bem para Rússia, o Vietnã é um exemplo disso contra os Estados Unidos. 

JÁ EXISTE UMA GUERRA?
De acordo com Júlio, o cenário de guerra já foi iniciado porque já houve imposição militar "com tropas no chão". Ele, que é especialista na relação entre Estados Unidos e Rússia, fala da possibilidade de intervenção militar norte-americana, que não parece se concretizar de forma direta: 

- Eu não acredito no envolvimento militar direto dos Estados Unidos num curto espaço de tempo. Esses dois países são potências nucleares e não se atacariam mutuamente, acho que não há essa possibilidade. Sobre a posição dos Estados Unidos, tem que ficar claro que há um passado de relações muito importante, com a Rússia, que envolve a Guerra Fria e, mais recentemente, vinculado ao fim de uma série de compromissos que eles tinham assumido tanto da expansão da Otan quanto da questão estratégica, que é a saída unilateral dos Estados Unidos do Tratado de Mísseis Antibalísticos, do Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermediário e do Tratado Céu Aberto (Open Sky). Essas tensões estavam crescendo em função da saída desses tratados. A Rússia, mesmo não respeitando parte das obrigações dos tratados, considerou isso uma série de riscos à sua posição estratégia no Leste Europeu, principalmente relativo à Ucrânia, um ponto muito importante para os russos, que não aceitariaa a entrada da Otan na Ucrânia. 

Segundo Júlio, quando os Estados Unidos e parte da política russa alteram o cenário de neutralidade em relação à Ucrânia, os conflitos ficaram cada vez mais possíveis e se confirmaram em 2014, com a ocupação da Crimeia, e agora com a posição do Putin.


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