Artigo

OPINIÃO: Reconstruindo fragmentos

Carmen Andrade

Prontos quatro dos 10 capítulos que constituiriam o livro, dei um tempo para hibernar as ideias e buscar fotos. Antes de deixar a sala, organizei os manuscritos cuidadosamente empilhados por ordem cronológica dos fatos que apareceriam na história, escondi o pendrive, acomodei o notebook, fechei o armário e deixei meu tesouro em banho-maria.

Passado o tempo de hibernação, fui reaver minha preciosidade. O armário havia sido aberto, o computador e o pendrive desaparecidos, uns documentos migrados para outros espaços, e outros a senhora encarregada da limpeza fez-me o favor de colocar no lixo pensando que fossem rascunhos antigos. Aquilo que havia custado meses de trabalho agora era lixo!

OPINIÃO: Hospital Regional, mudez e apatia

Fiquei atônita com a perda e não consegui fazer mais nada por alguns dias. Então, na cidade de Santa Maria, também chegou o vendaval. Da minha janela, vi destroços de muitas proporções. Remoí a perda pessoal e coletiva. Aí, numa tarde, sentada na sacada, corvejando minhas perdas, observei um homem que restaurava o telhado do Corintians, e outro trabalhando nos destroços do Colégio Centenário. Pacientemente, um no céu, outro, na terra, cada um a seu modo, esforçavam-se na restauração, na reconstrução, na recomposição do que havia sido perdido. Eram tão hábeis e serenos nos seus afazeres que parecia trabalharem ao ritmo de uma melodia.

Que tontos, pensei, como podem ser tão tranquilos e alegres quando a vida é tão fútil? Depois, repentinamente, tive outro pensamento. Pobre tonta, disse a mim mesma, você aqui sentada junto à janela, queixando-se e lamentando, enquanto aqueles homens reconstroem dois prédios que duraram gerações.

OPINIÃO: Saúde do homem

Levantei-me da cadeira, comecei a trabalhar no segundo rascunho. Passei a olhar fotos que não selecionara na primeira edição, a relacionar pessoas para depoimento, a rascunhar novo roteiro, e tive a certeza de que esta versão será melhor do que a primeira.

Caros leitores, naquele momento pensei que a destruição de alguns de nossos sonhos, nossas obras, nossos relacionamentos, nossos vínculos, nossos trabalhos não precisa ser o fim do mundo. Pode ser o início de algo melhor!

OPINIÃO: Baú de lembranças

Este livro, não sei como acabará, mas este fato, tenho a certeza que se transformará numa inspiração, no sentido de recomeçar sempre depois de ter visto ser destruída alguma parte da vida. É improvável, entretanto, que o consertista do telhado ou o pedreiro fiquem sabendo que inspiraram e que tiveram participação na recriação da minha obra literária.

Isso me faz questionar sobre quantas vezes catamos cacos para reiniciar o caminho. Me fez pensar nas vezes que desistimos de recolher as migalhas para ter um pouco de paz na vida, e me deu a certeza de que a vida vale a pena se formos grandes para vivê-la. E você, o que acha disso? 


Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Anterior

Reforma trabalhista: saiba o que muda e quais profissões serão afetadas

Próximo

Padre do Santuário da Basílica fala sobre a fé em Medianeira

Geral