Na próxima semana, dois dias marcarão no calendário a intensidade da vida e a plenitude da morte. Muitas pessoas têm reserva de pronunciar a palavra morte, talvez porque se estude pouco este tema, ou porque muito do que a envolve permanece revestido de mistério. O certo é que o enigma da morte se esconde no âmago da vida, quem desvelar seu interior, certamente, encontrará a vida e a morte, pois uma não existe sem a outra. O medo de uma é o medo da outra, a alegria por uma é a alegria pela outra, e tanto o nascer quanto o morrer são indicadores de libertação.
A concepção abre o espetáculo da vida, é nossa primeira dança, dali em diante, o óbito pode se dar a qualquer instante. No entanto, no mundo industrializado, o que mais vemos é sua chegada, mais incidente, da vida adulta em diante, por isso, ela preocupa tanto os mais velhos.
A morte tem um significado social, porque diante dela mudam as relações e os papéis familiares, pois, quando morre um idoso, todos sobem um degrau, quando morre um adulto, deslocam-se duas gerações. O da geração sanduíche se foi, e, ao morrer, um jovem ou uma criança os adultos responsáveis perdem muito do seu papel.
À medida em que a vida passa, mudamos nossa visão do tempo, deixamos de pensar de quando nascemos até hoje para ver de hoje até a morte. Ao lembrarmos da idade que temos, mais do que revisitar o mundo vivido, calculamos a possibilidade de tempo que teremos pela frente. Quando eu tinha 10 anos, alguém com 30 me parecia ter muita idade. Quando fiz 40, o futuro ainda se esticava, percebia que haveria tempo para executar muitos planos. Hoje, com 65, penso: terei tempo para concluir tantas coisas que ainda quero fazer? E você já se pegou interrogando-se assim?
Numa pesquisa que participei, em Barcelona, com um grupo que estudava “ Vida, Morte e Tempo”, encontramos que, quem pensa na vida só em termos do tempo que tem pela frente, teme menos a morte do que aqueles que se preocupam só com o passado evitando pensar sobre sua própria morte. Concluímos, ainda, que as pessoas que têm fé e vida religiosa costumavam temer menos a morte e preparar-se com mais tranquilidade para ela.
Outras pesquisas com o pessoal da Universidade de Milão nos mostraram que as pessoas doentes, que não aceitavam o diagnóstico e eram desesperançadas com o tratamento, apresentavam expectativa de vida mais reduzida. Os que lutavam mais, que eram mais dóceis e tinham menos raiva, viviam mais tempo.
Como se vê, a vida é um espetáculo. Quem tem plateia (familiares, amigos, colegas ou grupo de apoio), tem a probabilidade de viver mais e melhor, com a certeza de que, na primeira dança (concepção), iniciou o grande show que protagonizamos, chamado “Nossa Vida”, e vamos dançando até a apoteose. Você já tinha visto a dupla vida e morte por este ângulo?