Na última semana, participei da XII Semana Internacional de Direito e Criminalística, promovida pela Faculdade de Direito do Instituto Tecnológico de Antióquia, em Medellín, na Colômbia. Na pauta do encontro, que contou com a participação de acadêmicos, pesquisadores, peritos criminais, juízes e demais profissionais do campo da segurança pública e da justiça criminal de diversas regiões da Colômbia, do México, do Brasil, com a representação da Faculdade de Direito de Santa Maria (Fadisma), do Peru e da Espanha, o flagelo da corrupção.
Entre os pontos de convergência das diversas e qualificadas exposições a constatação de que as práticas de corrupção afetam, em maior ou menor grau, todos os países do mundo. Varia, no entanto, a forma como o Estado, a academia e a sociedade civil processam e encaminham esse tipo de problemática, sobretudo na América Latina, no bojo da consolidação do quarta pilar da justiça de transição, a saber, as reformas institucionais da segurança e da justiça.
Sustentamos, na oportunidade, que o Brasil vive um momento delicado no seu árduo e conflitivo processo de afirmação de um Estado Democrático de Direito substantivo, na medida em que, quiçá, em nenhum outro momento de sua história política, o país esteve de tal modo mergulhado no desafio da transparência, da integridade e do controle público de suas instituições, por um lado, ante os riscos iminentes da criminalização da política, da justiça e da democracia, por outro, com evidente impacto na descrença da população acerca da legitimidade das instituições políticas e jurídicas nacionais.
O Informe 2017 do Latinobarômetro destaca a liderança negativa brasileira entre os 18 países pesquisados na Região. Nesse sentido, apenas 1% dos(as) brasileiros(as) dizem viver numa ‘democracia plena’; somente 3% acreditam que o governo trabalha pelo bem da maioria da população e, finalmente, a maioria atribui nota 4,4 à própria democracia, valor inferior à média regional, que é de 5,5. E o mais grave: menos da metade dos(as) cidadãos(ãs), ou 43%, apoia a democracia, 10 pontos abaixo da média dos demais países latino-americanos (53%).
Ora, a corrupção constitui uma variável diretamente imbricada com esse reduzido percentual de apoio à democracia, sem olvidar os demais aspectos eventualmente incidentes, tais como as questões de ordem social, econômica e política. Inobstante, parece-nos que estamos diante de um aparente paradoxo: o “movimento” cívico pró-democracia, que esteve na base dos reclamos de criminalização dos corruptos e da corrupção no país (e do próprio impedimento, sem base jurídico-constitucional, da Ex-Presidenta Dilma Rousseff), afasta-se da crença na democracia como melhor forma de governo e o crescimento de candidaturas como a de Bolsonaro também vai nessa direção.
Outra pesquisa lançada este ano, pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública – FBSP (Índice de Propensão ao Apoio a Posições Autoritárias), demonstrou a emergência de tendências antidemocráticas na sociedade brasileira com a defesa de bandeiras como a autotutela, ou o justiçamento privado, que asseguraria a liberdade de um determinado grupo social matar, ou eliminar outras pessoas, se se julgar ameaçado.
Os custos econômicos da corrupção orbitam na ordem de 2,3% do PIB, conforme projeção da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). A operação “Lava Jato”, apesar da seletividade sempre presente do sistema penal, já identificou 38 bilhões de reais desviados por práticas de corrupção, o que daria para adquirir 200 mil casas populares, ou 196 mil viaturas policiais, ou ainda, 3,6 bilhões de merendas escolares. E há ainda os efeitos na manutenção da violência endêmica e da criminalidade violenta, que ceifou, em 2016, mais de 61 mil pessoas, no Brasil, de acordo com o 11º Anuário do FBSP.
A superação, ou, ao menos, a mitigação desse flagelo, passa, não há dúvida, por uma mudança de cultura, que pode ser potencializada pela incorporação de práticas de compliance, integridade e transparência no relacionamento entre os setores públicos e privados, nos marcos de uma ambiência democrática de fato.