Homem divulga fotos íntimas de 32 mulheres de Santa Maria em site pornográfico sem consentimento

Exposição sem consentimento. Essa é a situação em que, pelo menos, 32 mulheres de Santa Maria, estão enfrentando desde 8 de dezembro de 2022. Neste dia, elas descobriram que tiveram suas fotos íntimas divulgadas sem autorização em um site pornográfico. Diante da grande quantidade de mulheres envolvidas, elas criaram um grupo no WhatsApp, conseguiram identificar o homem que havia feito as publicações e procuraram ajuda jurídica.

Algumas vítimas eram ex-namoradas, outras amigas e muitas delas não tinham nenhuma relação com o suspeito. O número de envolvidas é maior, cerca de 40 mulheres, mas muitas delas não quiseram prosseguir com o processo judicial por vergonha ou constrangimento diante da situação.

As fotos eram de mulheres nuas, em ensaios íntimos ou de biquíni. A maioria das imagens, o suspeito tinha conseguido por meio de prints (capturas de tela) das redes sociais – em especial Instagram e Twitter –, das vítimas. Também havia fotos divulgadas que foram tiradas pelo suspeito sem o conhecimento das vítimas. Tiveram mulheres que encaminharam as imagens diretamente e exclusivamente para o suspeito enquanto mantiveram relacionamento. Porém, em nenhum momento, elas autorizaram a publicação ou divulgação das fotos.

No site, o homem criou 44 pastas para armazenar as fotos. Todas possuíam identificação das vítimas, exceto uma pasta que continha fotografias de várias mulheres diferentes. Algumas imagens eram antigas, outras recentes. Isso causa preocupação, pois não se sabe quando os conteúdos começaram a ser postados, já que existem fotos de 2017 até 2022.

– Elas estão muito abaladas e se perguntam: quanto tempo a minha foto estava em um site pornográfico sem eu saber? Tudo isso mexeu muito com as meninas em relação à exposição. Teve uma menina que viu a foto, não conseguiu mais trabalhar, pediu demissão e está em depressão – comenta Renata Quartiero, advogada das vítimas.

Os relatos das mulheres ainda apontam que o homem falava que tinha vício em pornografia. Uma delas, que namorou o suspeito, permitiu que ele gravasse vídeos e tirasse fotografias dos momentos íntimos na tentativa de ajudar o acusado a parar de consumir conteúdos pornográficos. Contudo, em nenhum momento, a mulher permitiu que os vídeos e fotos fossem veiculados e ela, inclusive, comunicava ao então namorado o medo que tinha caso isso fosse vazado. Outra vítima também denunciou que sofreu violência sexual enquanto namorava o homem.

Rede de apoio

Desde o momento em que a primeira vítima descobriu a exposição, uma rede de contatos foi sendo criada por meio de um grupo no Whatsapp. Por lá, as meninas puderam conversar e identificar juntas quem era o homem que havia feito isso.

O suspeito acabou descobrindo a movimentação das mulheres, que já estavam tirando prints do site com suas fotos para comprovar o caso e juntar provas. Diante disso, ele apagou muitos arquivos, assim como deletou redes sociais. A solução foi recorrer ao cache do Google, uma cópia de páginas de sites armazenadas nos servidores do Google. Assim, bastava pesquisar o nome da vítima, do site, do perfil do homem que elas conseguiam encontrar os materiais.

Logo após o dia 8 de dezembro, as vítimas entraram em contato com a advogada Renata Quartiero para buscar auxílio jurídico. A partir disso, foi marcada uma reunião coletiva para conversar sobre o que as meninas passaram e entender o que poderia ser feito.

– Muitas não conseguem falar ainda. Agora, que temos a rede, elas estão cada dia mais se fortalecendo com esses espaços de denúncia e de exposição na mídia. É um momento de parar essa pessoa porque pode ser que tenham mais mulheres envolvidas e a gente tem que ter essa coragem de poder expor a nossa versão, mas realmente, não é fácil. Elas estão se ajudando, muitas procuraram ajuda psicológica – relata a advogada.

No dia 2 de janeiro, uma denúncia, notícia crime, foi entregue à Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), que abriu inquérito para investigar o caso. Uma busca e apreensão de objetos eletrônicos do suspeito foi realizada. Agora, a advogada e as vítimas aguardam a resposta da delegada que conduz o inquérito, Elizabete Shimomura. A expectativa é que o caso tenha celeridade, o suspeito seja responsabilizado e os conteúdos retirados da internet o mais rápido possível.

Outro aspecto da denúncia, levado até a Deam, foi, durante a busca pelas fotos íntimas no site pornográfico, a descoberta pelas vítimas de fóruns online de Santa Maria que homens compartilham fotografias de mulheres da cidade.

A reportagem entrou em contato com a delegada Elizabete Shimomura, mas não conseguiu retorno até o momento.

“Não sei se eu posso confiar nas pessoas, se eu posso postar uma foto minha e se isso vai ser bem interpretado ou se vai virar um crime”, relata vítima

Uma das vítimas, que conversou com o Diário, teve conhecimento da divulgação de uma foto sua por meio de uma amiga, no dia 8 de dezembro. Quando entrou no site, a jovem encontrou sua fotografia publicada, sem consentimento, na pasta sem identificação, que continha várias meninas.

A foto em questão havia sido postada em 2019 na conta privada do Twitter da vítima. A jovem conhecia o suspeito, pois ele era amigo do seu namorado. O homem frequentava a casa do namorado da vítima, assim como saía para bares junto com os dois.

– Está sendo difícil porque era uma pessoa do convívio, que a gente confiava, que achava que era nossa amiga. Então, eu me sinto muito insegura. Não sei se eu posso confiar nas pessoas, se eu posso postar uma foto minha e se isso vai ser bem interpretado ou se vai virar um crime. Não é uma situação fácil, isso mexe com o psicológico, sentimos muita raiva, a nossa vontade é que ele seja preso logo – lamenta a vítima.

Apesar de ter excluído as redes sociais, segundo a jovem, o homem ainda está usando o aplicativo de relacionamento Tinder:

– Eu entendo que o processo caminha lentamente, mas enquanto isso não acontece é um desespero continuar vendo que ele continua no Tinder, por exemplo. Continua dando match e recebendo fotos de outras meninas. É evidente que ele faz essa curadoria de pegar e guardar as fotos há muitos anos. Se ele está com medo agora, ele pode guardar essas fotos e daqui cinco anos fazer de novo. Então é uma sensação horrível.

O que a lei prevê

De acordo com o artigo 218-C do Código Penal brasileiro é crime divulgar ou publicar cena de sexo, nudez ou pornografia sem o consentimento da vítima. A pena é reclusão de um a cinco anos. A penalidade pode ser aumentada em ⅓ (um terço) a ⅔ (dois terços) se o crime é praticado por uma pessoa que mantém ou tenha mantido relação íntima com a vítima, com o objetivo de vingança ou humilhação.

Outro crime previsto na denúncia é o de stalker, pois o suspeito utilizava as redes sociais das vítimas para conseguir as fotos. O artigo 147-A e B, do Código Penal, descreve este crime como “perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica”, com pena de reclusão de seis meses a dois anos e multa.

Um dos casos, da mulher que sofreu estupro, também foi enquadrado à Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que “configura violência doméstica e familiar contra qualquer ação ou omissão que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Nesta situação específica a violência é entendida, “em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação”.

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